Lançamento: A perigosa vida dos passarinhos

 

Um passarinho contou para a jornalista Míriam Leitão que ela poderia transformar em livro para crianças toda a experiência na fazenda Brejo Novo, em Minas Gerais, propriedade da sua família. Ela escutou muito bem o recado -  está há anos nessa profissão ouvindo passarinhos soprando em seu ouvido, e não é à toa que figura entre os dez jornalistas mais premiados do Brasil. Só que desta vez não houve metáfora. Vários passarinhos, das mais diferentes espécies, bateram de verdade à sua porta, cantando mais lindo do que nos outros dias, fazendo um verdadeiro balé. Daí surgiu a inspiração para "A perigosa vida dos passarinhos pequenos" (Rocco, 56 páginas, R$ 34,50), primeira obra infantil da autora, já premiada com o Jabuti de Livro do Ano de Não Ficção em 2012 por "Saga brasileira: a longa luta de um povo por sua moeda" (Record). "A perigosa vida dos passarinhos pequenos", que traz lindas ilustrações do artista plástico Rubens Matuck, será lançado neste domingo, às 16h, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon.

A partir da história de um filhotinho de Coleirinho recém-nascido que cai de seu ninho mal posicionado por não haver árvore melhor no terreno onde ele pudesse ser construído, Míriam fala numa aventura cheia de ação, medos, suspense (tudo no mundo das aves!) sobre a importância de se preservar a vegetação nativa do lugar, no caso, as espécies da Mata Atlântica. A história é narrada do ponto de vista dos mais frágeis (porém valentes), os pássaros pequenos, como o Coleirinho, o Sabiá-laranjeira, a Saíra-Dourada, o Sebinho, o Bem-te-vi, o Beija-flor, que dependem das boas árvores para construírem ninhos seguros. Eles é que decidiram, depois de muitas dificuldades, que a área verde da fazenda deveria ser aumentada e foram reivindicar junto aos donos da propriedade uma solução para os seus problemas. Por que os passarinhos pequenos são os que têm a vida mais dura? Para as aves grandes -  que não são apresentadas como vilãs, mas como inimigos naturais, coisas que fazem parte da vida - os perigos são menores. Além de elas mesmas serem assustadoras são também... devoradoras de ninhos pequenos. Os humanos, estes sim, são quase sempre descritos como os destruidores, ou, no mínimo, quando bem-intencionados, ingênuos, quase ignorantes.

A única salvação para os pássaros pequenos é a união de todas avezinhas que dependem de boas árvores para montarem seus ninhos. Há momentos hilários em que a reunião dos pássaros parece uma assembleia de sindicato. Ironias sutis, como a personalidade destinada a cada pássaro: o Bem-te-vi é o fofoqueiro de plantão (ele nega, diz que está só treinando para ser jornalista); o Trinca-ferro, traumatizado com muitas perdas familiares - isto é, parentes que foram parar na gaiola -, vive recluso. Mas sabe que é dono de uma voz poderosa e não esconde a vaidade. O João-bobo é o conciliador do grupo. Há outro momento maravilhoso no livro, quando os pássaros criadores do "grupo dos sem árvores" invadem a Fazenda Brejo Novo porque souberam que ali naquele lugar ninguém mais derruba árvore. Quase há um confronto entre passarinhos da fazenda versus invasores, mas eles percebem que juntos são mais fortes.


Enfim eles se acertam e decidem fazer um belo concerto para os proprietários da terra. É nessa apresentação que, com suas belas canções, sopram aos pés dos ouvidos dos humanos a necessidade de mais árvores no Brejo Novo. E um passarinho vai lá e dá a ideia para a Míriam: "faz o livro infantil".

Ela fez e, batendo as asas por essa linda história, aprendemos as características de cada passarinho, fruto do trabalho jornalístico da autora. A fazenda já abriga mais de 156 espécies de pássaros e mais de 32 mil mudas nativas da Mata Atlântica já foram plantadas. São demais os perigos desta vida, mas para os pequenos pássaros da Fazenda Brejo Novo nem tanto, porque Míriam Leitão se apaixonou por eles.

Publicado originalmente em O Globo