Dr. Sousa Ramos - Barão de Três Barras - 2º Visconde de Jaguari
Dr. Sousa Ramos - Barão de Três Barras - 2º Visconde de Jaguari

Reginaldo Miranda[1]

 

Depois do governo do Visconde da Parnaíba assumiu a presidência da província do Piauí, em 30 de dezembro de 1843, o bacharel José Ildefonso de Sousa Ramos[2]. Seu governo findou-se em 9 de setembro de 1844, demorando apenas 8 meses e 10 dias. Mas quem foi esse governante do Piauí?

José Ildefonso de Sousa Ramos, foi um advogado e político de projeção nacional, nascido em 28 de setembro de 1812, na antiga vila, hoje cidade de Baependi, em Minas Gerais, filho de Tomé Venâncio Ramos e Ana Leonor de Sousa. Era neto paterno de João Ramos do Outeiro e Maria da Conceição; e materno de Manoel de Sousa e Leonor Domingas Moreira.

Depois de cursar os estudos iniciais em sua terra natal seguiu para a cidade de São Paulo, onde cursou preparatórios. Em seguida, matriculou-se numa das primeiras turmas da Academia de Ciências Jurídicas e Sociais de São Paulo, no Largo de São Francisco, onde conquistou a láurea de bacharel no ano de 1834.

Depois de formado retorna à terra natal, onde monta sua banca de advocacia, depois mudando-se para a cidade de Valença, da província do Rio de Janeiro, onde angaria fama de advogado aguerrido e inteligente. Esse conceito adquirido na profissão não escaparia ao monarca, nem aos lidadores do partido conservador, de que era defensor e partidário desde a mocidade. Foi nessas circunstâncias, nomeado para seu primeiro cargo público, a presidência da província do Piauí, que a governou, conforme dissemos há pouco, entre 30 de dezembro de 1843 e 9 de setembro de 1844. Sobre sua nomeação e governo, disse o Jornal do Comércio:

“A província do Piauhy, que durante largos anos tivera por presidente o visconde da Parnahyba, achava-se como que transformada n’um feudo, e querendo o governo imperial acabar com semelhante estado de cousas, confiou o seu governo ao bacharel Souza Ramos. Efetivamente ele a administrou desde 30 de dezembro de 1843 a 9 de setembro de 1844, e com tanto critério e imparcialidade se houve, que os piauienses o elegeram pouco depois para representá-lo na câmara dos deputados na sexta legislatura (1844 – 1847).

‘Souza Ramos mostrou-se digno do mandato de que o tinham investido, fazendo a sua primeira campanha parlamentar com praça na célebre patrulha composta de Ferraz, Gonçalves Martins, Wanderley, Cruz Rios e D. Manoel, que batia-se quotidianamente contra a pujante câmara liberal de então, na qual, entre outros, sobressaiam Antônio Carlos, Limpo de Abreu, Álvares Machado, Rodrigues dos Santos, Souza Franco, Moura Magalhães, Urbano Sabino, Nunes Machado, Marinho, Theophilo Ottoni e Salles Torres Homem”[3].

Enfatizando o mesmo tema lembra um periódico mineiro essa passagem pela vida administrativa do Piauí, relembrando uma de suas últimas falas na tribuna do Senado:

“Ainda há pouco, no senado, ele rememorava uma época gloriosa de sua vida, quando, no começo de sua carreira política, ele presidiu a província do Piauhy, enfeudada até então ao Visconde da Parnahyba, e que, grata ao jovem administrador, o distinguiu brilhantemente enviando-o como seu representante à câmara dos deputados, onde ele foi um dos poucos deputados conservadores na legislatura de 1844 – 1847”[4].

De fato, o jovem bacharel José Ildefonso de Sousa Ramos, conseguiu bem cumprir sua missão fazendo um governo independente, sem perseguições políticas e representando esperança nova para uma geração de jovens cansados da longa administração do Visconde da Parnaíba. Por essa razão, foi, de fato, eleito deputado geral pelo Piauí, apoiado pelos liberais da província, assim derrotando o Conde do Rio Pardo, que o sucedeu na administração da província e concorreu ao mesmo cargo sendo apoiado pelo velho Visconde. Para a eleição de Sousa Ramos, muito contribuiu o empenho de Lívio Lopes em Campo Maior. Juntamente com Sousa Ramos, foi eleito o bacharel Francisco de Sousa Martins, ambos apoiados pelos liberais do Piauí.

Ainda sobre esse período e a maneira como a sociedade piauiense recebeu esse jovem governante alheio à política local, leia-se fragmentos de uma nota publicada, a pedido, no jornal A Época:

“Era em 1844...

‘O Piauhy estorcia-se sob a pressão descomunal do mais atroz despotismo!

‘Os salutares efeitos do Pacto fundamental do império da Santa Cruz ainda não haviam chegado às plagas do Piauhy!

‘Os povos viviam com d’antes imersos nas trevas da antiga colônia...

‘Os cidadãos não conheciam os seus direitos constitucionais, e se os conheciam, temiam reclamá-lo do mandão, que tudo suplantava com o seu terrível poder!

‘(...)

‘Era o dr. José Ildefonso de Souza Ramos, depois visconde de Jaguary, o precursor da liberdade dos piauhyenses, o executor honesto das boas e modernas instituições do nosso país, o patrono das liberdades públicas, e o terror dos tiranos – que fez desabar o pedestal que sustinha o opressor de tudo quanto é justo, razoável e nobre”[5].

Portanto, o Dr. Souza Ramos deixou seu nome gravado na mente e no coração do povo piauiense, sobretudo porque sucedeu ao longo governo do Visconde da Parnaíba, levando um clima de liberdade aos que até então se achavam oprimidos. E, assim, participou de sua vida pública como presidente da província e deputado à assembleia geral.

Depois desse mandato parlamentar presidiu a província de Minas Gerais, de 4 de novembro de 1848 a 29 de novembro de 1849[6]. Em seguida, presidiu a província de Pernambuco, de 18 de maio de 1850 a 16 de junho de 1851. Sua passagem pela administração dessas províncias foi bastante profícua, levando benesses ao povo e projetando seu nome na cena política, a ponto de reeleger-se para diversos mandatos parlamentares e conduzir pastas ministeriais.

Em 1845, foi eleito sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB).

Foi eleito deputado geral pelo Rio de Janeiro, em duas legislaturas, iniciadas em 1850 e em 1853. Então, ocupou o lugar de vice-presidente da câmara em 1851 e presidente em maio de 1852. Presidia, assim, um importante poder do Império e passava a ocupar lugar de destaque no centro do debate político nacional.

Por Minas Gerais, foi eleito senador tomando assento em 21 de maio de 1853, renovando sucessivamente os mandatos por trinta anos, até quando a morte o alcançou em plena atividade, no centro da vida pública nacional. Presidiu o Senado de 1874 a 1880, afastando-se por motivo de doença.

Três vezes foi ministro de Estado, encarregando-se da pasta dos negócios da justiça no gabinete de 11 de maio de 1852, presidido pelo conselheiro Rodrigues Torres; da pasta dos negócios do império, no gabinete de 2 de março de 1861, presidido pelo Marquês de Caxias; e, por fim, retornou à pasta dos negócios da justiça, no gabinete de 28 de setembro de 1870, presidido pelo Marquês de São Vicente.

Nomeado Conselheiro de Estado Extraordinário, em 1871; e Ordinário, em 1876, fez parte da seção dos negócios da justiça e estrangeiro.

Por ato de 19 de outubro de 1867, foi agraciado com o título nobiliárquico de Barão de Três Barras, em homenagem à sua fazenda e em face dos serviços prestados como presidente da primeira exposição nacional. E desde então ocupou a vice-presidência nas exposições posteriores, nas quais empenhou o melhor de si. Mais tarde, por decreto de 15 de outubro de 1872, foi agraciado com o título de 2º Visconde de Jaguari.

Era cavaleiro da Ordem da Rosa e grã-cruz da de Cristo.

Desde julho de 1878, exercia o cargo de provedor da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, permanecendo reeleito até quando faleceu. Para desincumbir-se dessas funções nessa instituição pia, dedicava-lhe metade de seu tempo.

Era também opulento fazendeiro, cultivando e incentivando a propagação da cultura de café Maragogipe, sendo sua fazenda das Três Barras, pioneira dessa cultura no centro-sul do País. Muito trabalhou nesse sentido quando presidiu o Imperial Instituto Fluminense de Agricultura.

José Ildefonso de Sousa Ramos, Barão de Três Barras e 2º Visconde de Jaguari, foi casado com Henriqueta Carolina de Sousa Ramos. Desse consórcio deixou a filha Ana Henriqueta Ramos, que fora casada com o deputado Olympio Valladão.

Com a saúde abalada retirou-se no domingo para sua aprazível fazenda das Três Barras, no termo da cidade de Valença, no Rio de Janeiro, onde veio a falecer pelas 12 horas da noite do dia seguinte, 23 de julho de 1883, com 70 anos de idade. Seu corpo foi transladado em trem especial desde a vizinha estação de Santa Fé até a corte, onde foi sepultado no Cemitério da Ordem Terceira dos Mínimos de São Francisco de Paula, também conhecido como Cemitério do Catumbi, na cidade do Rio. Foram constantes as notas da imprensa no sentido de prantear a perda de um grande cidadão, caráter sisudo, moderado e independente, administrador distinto, zeloso e probo. Com essas notas prestamos justa homenagem à sua memória.

 

 


[1] REGINALDO MIRANDA, advogado e escritor, membro efetivo da Academia Piauiense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí e do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-PI. Contato: [email protected]

 

[2] Foi nomeado por carta imperial de 1º de setembro de 1843.

[3] Jornal do Comércio, 24.7.1883.

[4] O Baependyano, 29.7.1883.

[5] A Época, 20.10.1883.

[6] O Itamontano, 8.11.1848; Tribuna de Ouro Preto, 4.11.1945.