Humberto de Campos
Por Reginaldo Miranda Em: 03/06/2017, às 13H03
“Não cheguei muito alto nem muito perto, de modo a ombrear com os mais notáveis escritores do meu País, porém, percorri maior caminho do que eles, porque vim de muito baixo e de muito longe”, rememorava o escritor Humberto de Campos Veras, e que foi recentemente lembrado pelo também escritor Murilo Mello Filho, da Academia Brasileira de Letras, em singela homenagem.
Ele entrou pela vida no dia 25 de outubro de 1886, em Miritiba, “uma soturna vila olhando um rio sem vapor nem ponte”, plantada nos confins do Maranhão e que hoje ostenta o nome de Humberto de Campos, em homenagem ao filho ilustre. Ficou órfão de pai aos seis anos de idade. Nesse mesmo tempo deixou a pacata vila de seu nascimento e foi enfrentar “o doido lutar em terra alheia”, primeiro em Parnaíba, no Piauí, onde viveu os anos iniciais de sua adolescência. Depois passando para São Luís do Maranhão, onde trabalhou como auxiliar do comércio. Mais tarde, aos 17 anos de idade, muda-se para Belém do Pará, onde passou a trabalhar como colaborador e redator dos jornais Folha do Norte e, mais tarde, da Província do Pará. Nessa capital amazônica estreia em livro no ano de 1910, publicando uma coletânea de versos intitulada Poeira. Era sua estreia literária, aos 24 anos de idade. Em 1912, “pega um ita no norte” e muda-se para o Rio de Janeiro, passando a trabalhar no jornal O Imparcial, ao lado de ilustres nomes da cultura nacional, como Rui Barbosa, João Ribeiro, José Veríssimo, Goulart de Andrade, Salvador de Mendonça, Júlia Lopes de Almeida, Vicente de Carvalho e tantos outros, sendo uns redatores, outros meros colaboradores. Todavia, foi uma oportunidade para sedimentar sólidas e importantes amizades e para projetar seu nome no centro cultural do País. Em 1923, já era responsável pela coluna de crítica do conceituado Correio da Manhã.
Autodidata, mas sempre ávido de conhecimento, em pouco tempo intensifica sua produção literária, divulgando uma série de contos e crônicas, primeiro com o pseudônimo de Conselheiro XX, depois adotando outros, como Almirante Justino Ribas, Luís Phoca, João Caetano, Giovani Morelli, Batu-Allah, Micromegas e Hélios. A desvantagem financeira não o impediu de projetar-se na cena política e literária nacional. Cronista primoroso, escritor notável, sua ascensão foi meteórica. O reconhecimento foi imediato. Em 30 de outubro de 1919, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Esse sucesso literário não ficou alheio ao povo do Maranhão que num momento de felicidade, em 1920, o elegeu deputado federal, permanecendo no Parlamento até a Revolução de 30, quando foi nomeado inspetor do ensino e diretor da Casa de Rui Barbosa.
Humberto de Campos nos legou duas dezenas de obras, entre as quais: Da seara de Booz (1918), Mealheiro de Agripa (1921), Carvalhos e roseiras (1923), A bacia de Pilatos (1924), Grãos de mostarda (1926), O monstro e outros contos (1932), À sombra das tamareiras (1934), Sombras que sofrem (1934), Um sonho de pobre (1935), Destinos (1935), Lagartas e libélulas (1935), Notas de um diarista (séries 1935 e 1936), Reminiscências (1935), Sepultando os meus mortos (1935), O arco de Esopo (1943), A funda de Davi (1943), Gansos do capitólio (1943) e Fatos e feitos (1949).
Todavia, dentre sua vasta obra, destacamos as Memórias, um depoimento pungente sobre os primeiros dias de sua existência. Sobre elas disse o escritor: “Escrevo a história da minha vida não porque se trate de mim; mas porque ela constitui uma lição de coragem aos tímidos, de audácia aos pobres, de esperança aos desenganados, e, dessa maneira, um roteiro útil à mocidade que a manuseie. Os vícios que a afeiam, os erros que a singularizam e que proclamo com inteira tranquilidade de alma, os rochedos em suma, em que bati, mesmo esses me foram proveitosos, e sê-lo-ão, talvez aos que me lerem. Conhecendo-os, saberão aqueles que vierem depois de mim, que devem evitá-los, fugindo aos perigos que enfrentei, e, conseguintemente, procurando, na viagem, caminhos mais limpos e seguros. Como nas cargas de cavalaria de Napoleão em Waterloo, os cavaleiros que vão na frente, na Vida, devem soterrar o fosso para a passagem vitoriosa dos que vêm atrás”.
Com essas notas desejamos realçar o nome aureolado de Humberto de Campos, um dos mais populares escritores do Brasil. Saiu de cena em 5 de dezembro de 1934, no Rio de Janeiro, aos 48 anos de idade, quando muito ainda poderia contribuir para com o desenvolvimento cultural de seu País. Partiu muito cedo, mas sua obra permanece como testemunho imperecível de sua passagem por esse teatro da vida.
(Meio Norte, 22.3.2013)