Graciliano e Cândido
Em: 11/10/2011, às 20H03
[Bráulio Tavares]
Circula na Internet (deve estar no YouTube) um vídeo de uma palestra de Antonio Cândido sobre o escritor Graciliano Ramos e sua obra. Cândido, que deve ter uns 90 anos, é talvez uma das últimas pessoas vivas que conheceram Graciliano pessoalmente. Ele narra episódios de sua juventude no interior de Minas, quando ele e outros rapazes que gostavam de ler iam para a estação esperar a chegada do trem, onde vinham as caixas de livros para serem recebidas pelo dono da livraria local. E eles, que não eram bobos, compravam os livros ali mesmo no abrir da caixa, antes que chegassem à vitrine. Ele fala da importância das capas modernistas dos livros de Jorge Amado, Graciliano, etc., o quanto aquelas capas com desenhos diferentes produziam neles, jovens, a sensação de um mundo que estava mudando e de uma literatura que era (ironia das ironias!) o anúncio dessa mudança. Hoje, a literatura (não falo da ficção científica) é sempre a última a ficar sabendo.
Uma observação interessante de Cândido diz respeito ao Modernismo, que hoje é muito mais importante do que quando aconteceu. Cândido lembra que os livros modernistas vendiam pouco e eram pouco lidos. Sua influência se expandiu ao longo do século inteiro, mas, na época em que houve a Semana de Arte Moderna, o Brasil leitor a ignorou solenemente. Hoje, a gente fala da Semana como se ela tivesse tido em 1922 a repercussão de um Rock in Rio.
Outra coisa que ele destaca é o fato de que quando falamos em Romance Regionalista nordestino estamos nos referindo aos habituais suspeitos: Jorge Amado, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz, José Américo de Almeida, Graciliano... Cândido lembra que escritores duradouros como estes surgem por entre outros autores, dos quais, a princípio, não se distinguem. Todos são novos, todos são vibrantes e estão dizendo algo nunca dito; e são todos lidos em conjunto. Com o passar dos anos, acontece uma decantação, uma filtragem. E ele diz: “Vou citar para os senhores alguns dos grandes autores dessa primeira fase do regionalismo, e penso que só os professores aqui presentes conhecerão algum”. Tiro e queda: dos nomes citados eu só conhecia Permínio Asfora (que ele pronuncia “Ásfora”), de quem meu pai tinha em casa, nos anos 1950, o romanceFogo Verde. E ele cita os demais, livros e autores que foram grandes quando surgiram e já não o são: Amando Fontes, Lauro Otaviano (Gororoba), Aurélio Pinheiro (Macau), Clóvis Amorim (Alambique), João Cordeiro (Corja), Cordeiro de Andrade (Cassacos)... Tirando Cândido e mais uma meia dúzia de macróbios, quem lembra desses heróis, que foram eclipsados por Graciliano & Cia?