Cunha e Silva Filho
O país vive o inferno de Dante (1265-1321). Pode-se olhar para os quatro cantos dessa terra e dificilmente se poderia declarar que ali reina a paz. Quase tudo é escuridão. Surge uma paisagem lúgubre lembrando contos terríveis de Edgar Allan Poe (1809-1849) e oudtros autores do gênero e em tempos diferentes caldeirões em ebulição, espetos, caveiras, fantasmas, vampiros, zumbis, vodus, névoas, sombras andantes, ossadas, tumbas, carruagens em disparada sem cocheiros. Epitáfios, nos quais reconhecemos figuras tenebrosas que, no futuro, viverão em eterno sofrimento. Gritos estridentes, capas escuras, gravatas, carros de luxo, homens com armas, aviões federais, prisões provisórias, flashes, notícias escabrosas na televisão, trocas de informações e de insultos nas redes socais, sobretudo Facebook, perdas de antigos, amigos por mera ideologia oposta a uma outra, prisões preventivas, prisões mesmo.
Homens de preto vigiando as noites infindas, ao lado ou atrás de homens querendo esconder os rostos de vergonha provocadas por inúmeras malversações. Lulismo, dilmismo, temerismo, o diabo solto da devassidão da politicalha. O Inferno dantesco ressurreto. Mistura de verdade, mentira e pós-verdade, contrainformações, recurso judiciais. Réus, réus réus! A política Brasiliae em adiantado estado de putrefação. O Planalto fede. O Legislativo fede. Congresso, idem. Até o Judiciário é salpicado de suspeitas. O pais – imenso lençol esfarrapado de crimes financeiros e assemelhados.
De todos os lados se ouvem gemidos. Num canto aqui e ali, caixas entupidas de dinheiro. São milhões surrupiados do povo analfabeto e pobre. Cisões entre pobre e miseráveis. A classe mérdea - este termo não é meu -, é do contista João Antônio (1937-1996), também cindida, meio a meio, half and half. A classe média alta, continua pensando nos velhos e novos tempos, mas o dólar ainda é forte e exuberante no Leblon, na Barra, em New York, em Paris, em Londres, mesmo em Brasília, a land dos homens honestos, probos, plantados, desde os antepassados numa linha cronológica e hereditária manchada de rapinagem e sem-vergonhice no país tão bem cantado pelo endiabrado Boca do Inferno.
Roubo, Roubo, Roubo, teu limite é a impunidade. Prisão domiciliar, tornozeleira eletrônica, ah, ah, ah! Me engana que eu gosto. Que diabo foi a Lei inventar essas formas de fingir que alguém está preso, quando está mesmo é em sua casa. Comendo do bem e do melhor? Um estado da Federação é assaltado por um governador crápula. Povo engabelado pela insânia e cupidez do vil metal: o deus de barro que povoa a imaginação do capitalismo mundial, comunismo, socialismo globalizado cheirando a Wall Street e às Stock Exchanges dos wheel dealers de todos os tempos, dos Shylocks sedentos do sangue, ou melhor, dos cifrões bilionários ganhos facilmente mediante falcatruas mancomunadas entre ladrões capitalistas e políticos delinquentes.
Procuro, como um Diógenes (412 a. C.- 323 a. C.), naquela escuridão, algum Al Capone da sempiterna atualidade dos bruzundanguenses, cujo ápice mais acentuado prevaricaçõoes decorreu nos anos de 2005 a 2018. No passado, na Colônia, no Vice-Reinado, nos dois Impérios, na República Velha, na Nova República e na Novíssima República já existiam muitos males político-financeiros, porém não tão poderosos como um tsunami de malversações, desídias, peculatos, perfídias e deslavado cinismo. O ladrão chora e nega que o é, mesmo diante de evidências flagrantes, investigadas e comprovadas. Chorar é preciso diante de um quarto cheio de milhões em poder de um conhecido ex-ministro fortemente ligado a um partido muito conhecido pelos seus malfeitos, inclusive com um vice-presidente que virou presidente da República. No entanto, sempre que tento acender a lanterna, esta se apaga, porque naquele Hades só há lugar para a escuridão e o sofrimento universal-brasílico.
Não há remissão para essa gente que habita esse reino eterno da escuridão. Quem ali permanece, consciente do que fez contra o povo cordial, o povo ordeiro (ah, como eles apostam nesse povo ordeiro!), ficará para sempre presa ao mal que tanto praticaram para a desgraça de um Brasil varonil. Ali não há diálogo, muito menos dialética. Não existe ali diálogo porque essa gente perdeu a capacidade de se expressar na sua própria língua. Não falam em linguagem, em vernáculo, falam em pecúnia, e quanta pecúnia direcionada para tantos às expensas do dinheiro público!
Sob a égide de uma suposta democracia, o país se habituou às arbitrariedades de reformas aprovadas por político que não mais têm o respeito do eleitorado, et pour cause, não têm mais representatividade quanto às promessas descumpridas em eleições ganhas por força do poder econômico, cujo defeito maior foi se transmudar em mercadores de propinas entre corruptos e corruptores ou vice-versa, pois não vejo qual diferença de maior ou menor grau de ética e de honradez entre um e outro. São dois lados em perfeita sintonia e sentido de reciprocidade.
A má governança discricionária temeriana chega a um ponto em que o ministro da fazenda congela os salários dos funcionários federais por dois anos e, em contrapartida, por ação pusilânime e malvada, permite que a maior parte dos produtos da alimentação aos planos de saúde, aumente os seus preços, gerando alto custo de vida dos gêneros de maior necessidades: alimentos, remédios e outros produtos.
Isso é uma ignomínia contra o bolso já vazio dos funcionalismo. No entanto, como somos um povo cordial, bonzinho, ordeiro, individualista e salve-se quem puder, ninguém grita, ninguém clama e nem os sindicatos fazem nada por ninguém, mas apenas arrecadam a nossa contribuição para, no caso dos planos de saúde, em assembleias conchavadas, terminarem por aceitar o que a ANS determina juntamente com as empresas dos planos de saúde. E, assim, ficamos sempre sujeitos ao domínio dos conchavos entre o público e o privado sob a chancela meio constrangida e malandra dos sindicatos. Ah, como somos ordeiros para regalo da política brasileira!