Fragmentos cotidianos de um escritor
Por Cunha e Silva Filho Em: 08/12/2014, às 23H44
[Cunha e Silva Filho]
1. Nunca duvidei de que, na vida intelectual, exista uma distância enorme entre a pessoa do escritor e a obra que produz, embolra tenha a certeza de que, pelo menos para mim, torna-se quase impossível poder admirar integralmente um autor quando, por experiência direta ou indireta, percebo que ele não constitui uma unidade harmoniosa entre o caráter e sua obra, quer de escritores menores, quer de médios ou grandes escritores. Julgo até que este ponto de vista meu não se cinge somente aos dias que atravessamos, mas há muito tempo tem sido uma realidade na vida literária brasileira. Que o digam Humberto de Campos, Monteiro Lobato, Brito Broca, Afrânio Coutinho e Álvaro Lins, servindo estes nomes apenas de meros exemplos para ilustrar este tópico de vida literária.
2. Ontem, fiz mais um ano de idade. Um pequeno almoço, para convidados bem escolhidos, me leva a esta reflexão: chega um tempo em que as velinhas não mais nos interessam, nem discurso nem respostas a discurso. O que fica mesmo são as alegrias de convidados separados por mesas, falando de tudo :política, vida alheia, literatura, projetos de vida concluídos, enfim, em cada mesa composta de convidados tudo é festa Constato também que a comida, a bebida, a sobremesa, com álcool ou sem ele, completam integralmente o ritmo da comemoração. O melhor, contudo, para mim, numa simples festinha entre amigos, é o meu hábito de conversar com todos os convidados, mas, ao fazer isso, há uma falta de habilidade minha imperdoável: verifico que converso mais com alguns do que com outros. Por que será que a festa é assim? Outra falha minha: sou sempre o que menos come porque – é explicável - fico o tempo todo dando atenção aos convidados. E o pior é que foi sempre assim quando o assunto é a comemoração do meu aniversário.
3. Estou deveras preocupado: há uma pilha crescente de livros que tenho o dever de ler e, se possível, comentar, seja em resenha, seja num artigo-ensaio mais denso.
4. O meu hobby é o seguinte: colecionar livros didáticos de matérias do meu tempo ginasiano e do curso científico que mais me interessavam. Enquanto não completo a coleção de um autor, não sossego. Este hobby me traz alguns percalços e o espaço físico do meu apartamento é o nó górdio da questão.Como não sou um Mindlin, fica mais problemática a solução dessa questão.
4. Fico chateado quando deixo de comprar jornais (são dois apenas, leitores) que sempre leio cada semana. Mas, pensando bem, se não li aquele exemplar que deveria comprar, isso não é o fim do mundo, uma vez que não costumo ler um jornal inteiro no mesmo dia.
5. Por que, numa Academia (traduza-se: de Letras) que não vou aqui nomear ( não vou dar esse gosto aos intrigantes e fofoqueiros ) há, segundo um informante, quatro grupos divergentes ? Descubro, além disso, que não é só numa Academia que existem redes de intrigas, grupos que querem ver os outros pelas costas. O mal é geral e se alastra insidiosamente em outros setores, públicos ou privados.
6. Fato curioso: Mário Quintana tentou entrar para a Academia Brasileira de Letras por mais de um vez, ao passo que Ferreira Gullar, que não era chegado a essa possibilidade, para o Petit Trianon foi convidado, tendo uma vitória quase cem por cento na contagem de votos. Só um não votou nele. Quem seria?
6. Renan Calheiros, a quem todo mundo conhece de priscas eras colloridas, desrespeitou um pequeno grupo que estava nas galerias do Senado protestando contra a aprovação de um projeto de lei relativo à gastança sem limites da dinheirama do Erário Público. O referido político, sem educação parlamentar à altura do cargo, chamou o pequeno grupo de indignados das galerias de “assalariados” sem nenhuma importância diante das decisões do Congresso Nacional. Reduziu, assim, por metonímia, a pó o eleitorado brasileiro. Esse é o pensamento elitista, cínico e ao mesmo tempo tacanha de politicagem coronelista deste país. Uma vergonha a mais para a imagem já moralmente destroçada de nossos políticos.
7.Com a globalização e a crescente inter-comunicação dos povos, subiu enormemente a produção editorial de livros para aprendizagem de idiomas, sobretudo do inglês.
8. O Piauí, no que tange ao mundo editorial, está dando mostras de crescente vitalidade, produzindo localmente, seus livros, com o surgimento de muitos escritores de vários generos literários ou não, de novas livrarias bem equipadas, com sucessivas noites de autógrafos. O escritor, professor e editor Dílson Lages Monteiro, com outros companheiros, estão concorrendo significativamente para que o Piauí se faça conhecido pelo país afora. Dílson Lages é um operoso e jovem intelectual que faz questão de estar levando a produção dele e de outros autores piauienses ao conhecimento de leitores do resto do país, através de marcante participação em Feiras de Livros, de entrevistas com autores piauienses ou não piauienses. É um escritor antenado, sem quaisquer ranços de provincianismo ao lidar com a produção sua e de outros escritores da seu estado. Além disso, Dílson Lages, como diretor de um já respeitado site de literatura, o Entretextos, abriu, assim, no Piauí, mais uma canal de divulgação de autores piauienses.Seu trabalho, fruto de sua vocação para a vida cultural, merece o respeito dos piauienses e o seu mencionado site constitui um amplo espaço virtual, um verdadeiro fórum aberto a discussões de questões de grande interesse e a reflexões multifacetadas sobre literatura e outros temas culturais gerais graças à qualidade de seus colaboradores. O objetivo primacial do Entretextos, pelo menos para este colunista, visa a disseminar o conhecimento e a propiciar mais visibilidade da produção literária brasileira de forma democrática.