Cunha e Silva Filho

 


                 Não sei se algum leitor ou leitores que gostem de ler ensaios literários já perceberam que atualmente o que se tem visto nas resenhas publicadas em jornais conhecidos, como o Jornal do Brasil, a Folha de São Paulo e O Globo, embora sejam escritas com seriedade, conhecimento do assunto e revelando boa apreensão das principais idéias do tema das obras lidas e naquela síntese necessária à natureza de uma resenha, é uma certa equalização de estilo literário, uma forma-padrão de organização do pensamento.

                 Tal uniformização estilística me parece digna de comentário, visto que o problema que, em tal situação aí se cria muito tem a ver com a falta de estilo, e esta não me parece boa pra o bom nível do ensaísmo entre nós. Afinal, de contas a resenha está a um passo do ensaio acadêmico. A diferença entre ela e o ensaio de maior fôlego reside no aparelhamento sofisticado da fôrma de gênero literário chamado ensaio.
            Ora, o que se tem como pressuposição é que a escritura ensaística, a meu ver se deve destacar, como traço fundamental,, pela originalidade, pela diferença de estilos de escrita, que faz com que, ao se ler um trabalho acadêmico, ou mesmo uma boa resenha, nele ou nela se perceba logo a marca do autor na formulação de sua estrutura sintático-estlística. Citemos, para ilustrar, ensaístas já mais antigos ou mesmo menos antigos, como Alceu Amoroso Lima, Álvaro Lins, Afrânio Coutinho, Antonio Candido, José Guilherme Merquior, Eduardo Portela, Luís Costa Lima , Fábio Lucas, Roberto Schwarz, Davi Arrigucci Jr., para não alongar a lista.
          Todos os autores acima,  separadamente, se distinguem  por uma forma de linguagem acadêmica que, se omitissem os seus nomes das suas obras, um leitor inteligente e bem lido seria capaz de identificar cada um deles. E por quê? Porque cada um escreve segundo a sua forma de estruturação da linguagem, do seu estilo,  em suma, da sua maneira singular de analisar obras e de as interpretar. É claro que não estou pensando na especificidade da linha ou corrente de seu pensamento crítico. Falo do velho conceito de estilo há tempos proclamado por Buffon (1707-1788) .
         Essa individualidade que encontro em tais ensaístas e crítico é que aqui me interessa como fator determinante de diferenciação de um estilo de escrita para outro. Nem falo de valorização estética na expressão do seu pensamento crítico-teórico. Falo da peculiar forma de uso da linguagem, da inconfundibilidade de forjar o pensamento analítico de cada um. Falo , em suma, do ato de escrever, que deveria, n a sua forma ideal pelo menos, ser um ato identificatória e distintivo entre a linguagem literária de cada ensaísta.
       É essa ausência de particularidade diferenciadora que me preocupa quando leio resenhas ou mesmo ensaios na atualidade. Será que se dá aqui o fenômeno da indiferenciação no modo de escrever da chamada pós-modernidade.? Será que os jovens e muitas vezes talentosos ensaístas de hoje sofrem de uma padronização insossa e   álgida na formulação do sua escrita? Isso não é bom para o ensaísmo nem para os estudos literários.
      Será tal fenômeno algo que ocorre subconscientemente na comunicação ensaística a esta altura do progresso humano e tecnológico? Não estamos nos tornando demasiadamente iguais como produto de uma época que tende a uma forma globalizada de comportamentos e hábitos que já se fazem sentir nesta primeira década do século 21?
     Não estou de modo algum advogando nem a clareza rasa do pensamento crítico nem tampouco a obscuridade, o estilo cifrado, circular, que, por sinal, se poderia encontrar em algum crítico acima citado. O que proporia seria uma saída para uma retomada da originalidade na construção estilístico-formal do crítico, ainda que fosse para encontrar bons modelos na crítica passada, excluindo obviamente o estilo terrivelmente arrevesado e pesado de José Veríssimo. 
    O que não vejo bem para o ensaísmo atual é essa uniformidade de estilo de escrita que, além do mais, não prima por um traço singularizador e que me encanta como leitor de ensaio, que é o estilo de escrita idiossincrático que, na sua objetividade de análise e interpretação das obras, deixe perceber uma espécie de alma na escrita, permeada de humanidade na exposição das ideias, no palpitar sensível  do pensamento que, na sua subtextualidade, faça vibrar, junto ao leitor, uma visão da obra na qual não se ausente o sentimento do escritor que  do seu texto  se desentranha.