Por Bráulio Tavares

O escritor Bruce Sterling sugeriu o termo “centopéia” para descrever um tipo de crime (não sei se a palavra tecnicamente se aplica) que sempre existiu na política mas que se intensificou com a cultura digital.  A centopéia é um conjunto de informações verdadeiras e falsas, misturadas e divulgadas de forma a liquidar a carreira de um político.  Todo político tem as fraquezas de qualquer ser humano, agravadas pela embriaguez de poder de quem ocupa um cargo e imagina que continuará ali para sempre.  Oportunidades não faltam, e, como dizia Oscar Wilde, “sou capaz de resistir a tudo, menos a uma tentação”.


A centopéia é geralmente um escândalo sexual habilmente preparado pelos adversários da vítima.  Segundo Cory Doctorow, que divulgou a teoria no blog BoingBoing, “ela dá a impressão de ser espontânea e estar preocupada com valores morais, mas na verdade é planejada e está visando o poder”.  Sterling a chama de centopéia porque ela é segmentada, age às escondidas, e é cheia de veneno.  Os ingredientes principais são:


1) Uma vítima numa posição de poder. 2) Um(a) parceiro(a) sexual da vítima. 3) Informações vazadas sobre a conduta sexual da vítima.  4) Militantes online: blogs, listas de mensagens, websaites de vídeos.  5) Atrizes, cantoras ou modelos com algum tipo de envolvimento no caso, para atrair com seu glamour a atenção da massa.  Diz Sterling: “um político que tenha um caso com uma mulher feia, gorda, de meia-idade e de origem proletária é praticamente à prova de centopéias”.  6) Políticos de oposição que afirmem estar chocados e peçam a imediata punição da vítima.  7) Mídia digital, tablóides, TV a cabo e redes de TV aberta (que serão exploradas exatamente nesta ordem). 8) Uma investigação policial ou o mero boato a respeito de uma.  9) Uma população feroz e devassa, que se enfurece com a mera idéia de que políticos possam ter o mesmo tipo de relações sexuais ilícitas que eles têm. 10) Aspectos que, quando ocorrem, dão sabor mais picante ao caso: uso de drogas, adolescentes molestados, líderes religiosos (líderes de campanhas anti-pornografia são especialmente vulneráveis a centopéias), venda clandestina de vídeos comprometedores, vazamento de emails e chats, computadores confiscados, roubo de celulares com câmara, grampos telefônicos, malas-diretas anônimas com DVDs difamatórios.


Em geral (diz Sterling) uma centopéia bem feita derruba um político em pouco tempo.  Uma centopéia mal sucedida se dilui em mero boato maldoso.  A maioria delas é visivelmente produzida por alguém, com revelações sendo liberadas numa sequência que obedece um plano estratégico.  O BoingBoing cita exemplos de 2008 na Índia, Grécia, Polônia, Indonésia, África do Sul, Grã-Bretanha e EUA.  Mas a centopéia parece se dar bem com o clima moral dos EUA, um país bifronte onde o Moralista e o Depravado moram parede-meia um com o outro, e adivinhem qual dos dois olha pela fechadura para saber o que o outro vive fazendo.