Entrevista com o contista J. L. Rocha
Em: 30/05/2019, às 17H41
Na sexta-feira, 31, o contista e juiz João Luiz Rocha Nascimento publica Um clarão dentro da noite, sua obra de estreia no gênero. Hoje, 30, o jornal Meio Norte, de Teresina-PI, verteu em reportagem entrevista que fez com o autor. Entretextos publica na integra as palavras do contista. Leia.
1.Como o cinema influencia a produção literária do escritor?
- O cinema é uma forma de expressão artística, assim como a literatura e a música. E ele chegou antes na minha vida. Nos anos sessenta e setenta havia 04 (quatro) cinemas em Teresina: Cine Royal, Cine Rex, Cine Theatro 4 de Setembro e Cine São Raimundo, conhecido como “baganinha”.E eu cresci vendo cinema. Foi amor à primeira vista. Na bilheteria eu costumava aumentar a minha idade para poder comprar o ingresso. Primeiro foram os filmes de faroeste, sobretudos os italianos. Seriados de Tarzan, não perdia um. Depois, à medida que ia crescendo, fui sendo mais seletivo e não perdia uma sessão de cinema de arte aos sábados no Cine Royal. Com o cinema, vieram as revistas em quadrinhos, que falam a mesma linguagem, tanto que hoje se dá um processo inverso: os heróis dos quadrinhos são retratados no cinema. Depois das revistas em quadrinhos, com o amadurecimento, vieram os livros, primeiro os livros de bolso, adquiridos em bancas de revistas, depois os clássicos da literatura e o resto foi somente consequência.
Então é natural que o cinema faça parte do meu imaginário como escritor e está presente nos contos não somente enquanto temática, mas também como forma de linguagem. A maioria dos contos é cheia de intertextualidade. Em alguns contos, a exemplo de “O Anjo Vingador” e “Folha Seca”, a própria forma de linguagem é muito parecida com a do cinema, cheia de fragmentações, diálogos e cortes rápidos.
2.Quais filmes fora importantes na produção dos contos?
- Dentre outros, Casablanca, Taxi Driver, Gilda, Apocalipse Now, No tempo das Diligência, os bang- bang italianos e As aventuras de Tarzan, que passavam nas sessões da tarde antigamente no Cine Rex.
3. Quantos contos tem o livro “Um clarão dentro da noite”?
- É composto de 23 contos, distribuídos da seguinte forma: Um na Abertura, que é o conto que dá título ao livro; dez na Parte I; um no Interlúdio, separando um parte da outra; dez na Parte II; e um no Epílogo, que o leitor ao começo, como que fechando um ciclo.
4. Quais são as agruras do contista no ninho dos poetas?
- A expressão é utilizada no sentido de aflição. Há uma metalinguagem no conto. Trata-se de um metaconto. O conto fala da angústia de um contista que, por acaso, se vê num habitat de poetas, é confundido como poeta e quando se revela contista, praticamente é expulso do lugar e por conta disso resolve escrever um livro de contos, que foi a forma que ele encontrou para se fazer ouvir e protestar com o que ele entendeu ser uma forma de discriminação por não ser poeta. Qual a linguagem de segundo nível no conto? Teresina, assim como qualquer lugar, tem muito mais poeta do que contista. Talvez por conta da falsa ideia de que fazer poesia é mais fácil do que escrever um texto em prosa, um conto ou crônica, novela ou romance. Quando, na verdade, na minha perspectiva pelo menos, fazer poesia é bem mais difícil. É como diz o poeta Paulo Machado no poema “Testamento”, mais ou menos assim: “fazer poemas é fácil como amordaçar um lobo”. Pelo menos a poesia de boa qualidade. Então por conta desse falso senso comum teórico, o conto fica meio que encoberto pela poesia. Pouca gente escreve conto. E quem envereda pela narrativa curta enfrenta mais dificuldade de penetração do que o poeta. Então o conto “No ninho dos poetas” é um libelo contra o esquecimento do conto. É uma espécie de protesto contra o seu encobrimento. A personagem é um contista e ele quer chamar a atenção pra isso. Não tem nada contra a poesia (de boa qualidade), apenas quer ser ouvido também. E a história é contada de uma forma bem humorada. Em síntese, é uma brincadeira que eu faço com os poetas, sem qualquer ofensa. Tenho muitos amigos escritores que só fazem poesia.
5. O senhor está escrevendo outros livros? Outros gêneros?
- No momento estou dedicado somente à publicação e divulgação de “Um clarão dentro da noite”. Mas, tenho outros projetos de publicação: outro livro de contos, no caso microcontos, e de um livro de contos eróticos, ambos para 2020 e para os quais já tenho material suficiente. E estou escrevendo, já há alguns anos, uma novela. Projeto para 2021, juntamente com a publicação de minha tese de doutorado, esta na área do Direito. E pretendo sim, bem mais à frente, publicar um livro de poesia, mas será uma experiência única, por razões óbvias.
6. Por que o conto?
- Por que quando eu comecei a escrever, no final dos anos setenta, vivia-se no Brasil um “boom” da literatura. E a principal forma de expressão do movimento naquela época era o conto, a narrativa curta. Então fui tocado por isso, segui o mesmo caminho.