[M. T. Piacentini]

--- Qual o real significado da expressão “posto que”? É correto dizer “eis que”? Como exemplo: Ela não vai à escola eis que está doente.Alexandre Godoy, Campinas/SP


POSTO QUE é uma locução conjuntiva de valor concessivo e também, modernamente, de valor explicativo ou causal.


Originalmente, posto que se enquadrava apenas nas conjunções concessivas, as quais dão a ideia de concessão [posto que = pondo-se (a concessão) que...]. Como tal, rege o subjuntivo e tem como “irmãs”: embora, ainda que, se bem que, conquanto, mesmo que.


Posto que seja fácil, sempre tenho dúvidas.  [Ainda que seja fácil]

O trabalho, posto que fosse árduo, acabou no prazo. [embora fosse árduo]

Aceitamos o acordo, posto que não agrade a todos.  [conquanto desagrade a todos]


Entretanto, vejamos outro tipo de frase relativamente comum, em que as orações introduzidas por “posto que” não traduzem a mesma ideia das concessivas acima:


Aceitamos o acordo posto que agrada a todos.

A denúncia foi julgada improcedente, posto que não havia prova da contravenção.


Observe que, diferentemente das concessivas, o verbo está no modo indicativo. Neste caso seu sentido é explicativo/causal:


Aceitamos o acordo, pois / já que / porque agrada a todos.

A denúncia foi julgada improcedente, visto que não havia prova da contravenção.


Se a conjunção não pudesse ser causal, como é que iríamos interpretar o Soneto de Fidelidade, de Vinicius de Moraes? Relembremos seus últimos versos:


E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama


Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.


Não se pode precisar quando e por qual razão o posto que concessivo foi desembocar no posto que causal. Mas pode ter sido por influência castelhana: puesto que é explicativa/causal. Aliás, o mesmo fenômeno evolutivo aconteceu no espanhol, em cuja literatura clássica se encontra “puesto que” com valor concessivo.


B. EIS QUE é uma locução que originalmente tinha o sentido temporal, equivalente a quando e a eis senão quando:


Seguia o monge pelo caminho, meditando com a natureza, eis que um asno lhe interrompe a concentração e o andar.


Aconteceu com essa expressão um fenômeno semelhante a posto que: de temporal, eis que passou a causal, sobretudo nos meios forenses. O seu significado, neste caso, é igual a visto que, já que, uma vez que, porquanto:


Foi-lhe dado o direito de aduzir suas razões, eis que a ampla defesa é essencial à legitimidade do processo.

Mais uma vez ficou claro que há muitos palpiteiros no campo do Direito Desportivo, eis que o texto do art. 93 da LGSD, na redação que lhe foi dada pela Lei nº 9.981/00, é de clareza irretorquível.