Cunha e Silva Filho

 

                   Na Escola Tradicional e principalmente na Escola Moderna (e por moderna atribuo ao temo a sua acepção mais lata possível), um debate polêmico está sendo travado no que tange ao ensino-aprendizagem com seu núcleo de discussão justamente na forma como se deve ou não ministrar disciplinas nas escolas públicas, ou seja, nos níveis do fundamental (6ª, 7,ª 8ª e 9ª) e sobretudo do ensino médio.

           Obviamente, a questão para este último período se torna mais sensível e exige maior tato pedagógico, porquanto estar-se-á lidando com adolescentes em vias de se tornarem jovens adultos e numa faixa etária na qual as grandes indagações de natureza sociopolítica, histórica filosófica começam a fazer parte da formação ideológica do discente.

                É nesse ponto nevrálgico que a questão da doutrinação ou não se presta ao confronto de diferenças entre alunos e docentes. Da mesma maneira, é nesse ponto em que as visões dos pais dos alunos e a dos professores podem se chocar, estabelecendo pontos de divergências que resultem em prejuízos tanto para o ensino quanto para a formação intelectual do alunado.  A dificuldade de lidar com essa questão é o busílis para uma educação e ensino eficientes ou para seu lamentável fracasso.        

                Outros componentes bastante significativo para o tema é a natureza da disciplina lecionada. É evidente que algumas disciplinas, as humanas, estarão mais expostas e mais comprometidas na discussão candente do ensino-aprendizagem. São elas: história, filosofia (esta, uma das mais delicadas para lecionar dada a sua ampla  abrangência), geografia, língua portuguesa, literatura brasileira e literatura portuguesa.

           Mais uma agravante, viriam, no bojo desse debate, as escolas militares, as religiosas. Daí me referir à necessidade do tato, do bom senso, da maturidade imprescindível do mestre a quem o mínimo que dele se e pode exigir é que seja um espírito equilibrado conduzido por um elevado sentido do valor da educação e do ensino que lhe são postos nas mãos a fim de realizar seu trabalho didático de maneira imparcial tanto quanto possível.

               Todas essas matérias humanas acima citadas podem ser bem desenvolvidas em sala de aula sem que se produzam conflitos indesejáveis tanto para o aluno quanto para o professor regente. De outra parte, um professor não é um indivíduo destituído de suas idiossincrasias, de sua visão social e mesmo ideológica, inclusive partidária. Entretanto, o maior cuidado deve ele ter na condução de suas aulas de molde a não acirrar os ânimos dos alunos e entrar em polêmica de caráter doutrinário ou proselitista, a ponto de transformar suas aulas numa refrega de fla x flu.

             Se existir essa rivalidade ou choque de ideologias, a aprendizagem redundará em tremendo fracasso. O conteúdo da disciplina irá pra o beleléu e a educação pública perderá a sua função e finalidade precípua e inarredável, que é a de preparar pessoas competentes, críticas mas não dogmáticas, formando indivíduos que saibam respeitar o outro e as diferenças de opiniões. Indivíduos que saibam discordar sem radicalismos, sem impor sua unilateralidade a fórceps sobre outrem. Isso não quer dizer que dos dois lados da moeda tudo se aceite ou tudo se negue.

            Nem a direita é santa nem a esquerda é a tábua de salvação. Tampouco em tudo que seja  neoliberal é bom para todos: da mesma sorte que nem tudo que os verdadeiros marxismo ensinou é descartável e errado. Aproveito este ensejo para fazer uma citação de um crítico marxista a quem admiro, Terry Eagleton, ainda que eu não seja marxista: “Estar dentro de uma posição ou fora dela ao mesmo tempo – ocupar um território enquanto movimentando-se ceticamente na sua fronteira – é amiúde onde brotam as ideias mais intensamente criativas.É um lugar precioso para nele estar, ainda que nem sempre seja   o menos doloroso." (EAGLETON, Terry. After theory. Basic Books:New York, 2003, p. 40.)

            O que um mestre genuíno pode bem fazer e competentemente desempenhando seu papel de pedagogo é ministra bem sua matéria, até pode abordar diversos modos de visão dos problemas que a História nos legou e que ainda estão por serem solucionado.  Deve, no entanto,  fazê-lo sem artifícios enganosos de trazer seus alunos para o seu lado, e fazer "brainswash" tendencioso, nocivo e viés ideológico que distorce outras formas  de compreensão e leitura do mundo, mas  com liberdade de expressão, de locomoção e com possibilidade de exercer uma atividade feita com dignidade, ética e autenticidade pessoal forjada no respeito à coletividade e no respeito aos semelhantes.

      Não somos os únicos, os melhores. Somos parte de uma multiplicidade de ideias e pensamentos que estão em mudanças num mundo de alta complexidade tecnológico-científica e de convívio muito mais difícil do que em tempos de menor afluência humana.