REGINA FREITAS

 

Açude Caldeirão, em Piripiri
Elmar Carvalho e Regina Freitas, na solenidade de posse

Do mar eu trouxe

o vento que dança

em torno de meus cabelos.

Trouxe este meu cheiro

de sal, mariscos e maresia.

Vaqueiro fui e fazendeiro

de estrelas-do-mar que

subiram ao céu para formar

constelações e galáxias.

Nas pontas agudas de meus dedos

cintilam fogos- de-santelmo.

Meus olhos têm o brilho

que roubei das ardentias.

Os relâmpagos das procelas

pousaram nas minhas mãos

e nelas se aninharam.

Do ritmo do mar eu trouxe

os meus gestos e o meu jeito de falar.

Num lance de búzios

joguei minha cartada final

em que fui anjo terminal.

Do mar eu trouxe a cantiga

do vento na voz dos búzios.

Sobre o dorso de alados cavalos –marinhos

pesquei sereias malévolas que me

encantaram e depois fugiram.

No vai e vem das ondas

busquei o meu gesto de

posse e devolução.

Trouxe o meu beijo temperado

no salamargo de suas águas.

Trouxe tesouros sepultos

nas covas do coração.

Com o mar aprendi meu modo

de caravela: meus dedos

são filamentos que machucam

sem querer, que ferem sem ter porquê.

Trouxe caracóis que se (con)fundiram

com os caminhos labirínticos que trilhei.

Louros, nunca os tive,

exceto algas em meus cabelos.

Arrebatado por navios-fantasmas

conheci várias e inefáveis dimensões.

Nadei contra as correntes marinhas,

mas a elas cansado me entreguei;

despojado da púrpura e do cetro

com que havia lutado.

Trouxe do mar as conchas ilusórias

-multiformes e multicores-

com que minha vida enfeitei.

Mas, sobretudo, trouxe a vida

na alegria das chegadas

e na tristeza das despedidas.”

 

Senhor Presidente

Dignas Autoridades

Eminentes Acadêmicos

Senhoras e Senhores

 

O autor destes versos que li, intitulados “Poemarít(i)mos”, os quais transpiram criatividade, sonoridade, emoção, convencimento, é José Elmar de Mélo Carvalho, inquestionavelmente um nome de destaque no cenário artístico-literário piauiense, por isso que nesta noite de gala, a sociedade acorre ao chamamento da Academia de Ciências, Artes e Letras de Piripiri (ACALPI), para a festa de sua posse solene, novo acadêmico que passa a compor o quadro desta Assembléia de cultura.

O ritual da investidura prima pela simplicidade, mas denota a grandeza do seu significado aos olhos de todos quantos enaltecem os valores do espírito.

A história da cultura humana registra nos seus anais a existência dessas agremiações desde antigas eras, com a Filosofia de Platão e, no mundo ocidental, entre os séculos XV e XVIII. Todas voltadas para o culto às ciências, as artes e às letras, na busca constante da divulgação do saber.

Elmar, o acadêmico que hoje penetra, triunfante, os umbrais da ACALPI, pela sua própria vida, pelo seu curriculum muito rico, pelos seus passos nas linhas de sua peculiar poesia e de sua produção em prosa, pela sua inteligência, dinamismo, força de vontade, competência, determinação e otimismo, traz novas energias e entusiasmo para os que aqui labutam, e a disposição de lutar ao nosso lado.

Sinto-me feliz e honrada por estar aqui, hoje, neste momento em nome da Academia de Ciências, Artes e Letras de Piripiri (ACALPI) incumbida de dirigir palavras de saudação recepcionando o novel acadêmico José Elmar Carvalho.

Laços de parentesco e profissionalismo nos unem desde muito tempo, pois descendemos da mesma família piripiriense, pertencemos à mesma carreira de profissionais, porém o vínculo mais forte é o da amizade, da especial admiração que tenho por ele em razão dos seus conhecimentos no mundo da arte da poesia, da prosa, conhecimentos jurídicos e, principalmente e sobretudo por sua fé inabalável em Deus. Elmar, continuamente agradece os dons recebidos, como ele mesmo proclama na apresentação de seu livro Rosa dos Ventos Gerais: “Louvarei sempre o Senhor pelas dádivas recebidas em forma de versos, e graças darei à poesia, que ontem e hoje enche os meus dias”. E concluindo seu discurso de posse na cadeira nº 10 da Academia Piauiense de Letras, anuncia “...quero deixar consignado que a marcha da humanidade é para frente e para cima, infinitamente, eternamente em ascensão para Deus, em contínuo aperfeiçoamento, e que um dia Deus nos receberá em seu regaço, puros e redimidos, como parte integrante de seu corpo místico”. E arremata: “Creio que as quedas e as imperfeições, que as evoluções e os retrocessos, que os avanços e os recuos fazem parte de um plano divino e perfeito, como são divinos e perfeitos os giros alucinantes dos elétrons, as rotas luminosas dos cometas e as órbitas sincronizadas das esferas celestiais. E algum dia compreenderemos esse plano maravilhoso, quando estivermos com Deus e em Deus.”

Por isso que me tornei ledora contumaz e incondicional de sua obra, sorvedoura das emoções que transmite através de sua produção literária.

Elmar, por ter suas origens familiares em Piripiri, dado que o torna apto a pertencer a nossa Academia, nasceu em Campo Maior no ano de 1956. Bacharelou-se em Administração de Empresas, exerceu vários cargos públicos, formou-se em Direito, tornou-se Magistrado – Juiz de Direito, servindo atualmente na Comarca de Regeneração.

Como cultor das letras, Elmar enriquece o seu curriculum de imortal compondo os quadros das seguintes academias: Parnaibana de Letras, Academia de Letras do Vale do Longá, da Academia Maçônica de Letras do Estado do Piauí, Academia de Letras da Magistratura, Academia de Letras e Belas Artes de Floriano e Vale do Parnaíba e, Academia Piauiense de Letras.

É verbete e estudado em vários livros, de autores diversos.

Autor de inúmeras obras, principalmente como poeta, Elmar encanta com um estilo único, pessoal, inovador, como destaca-se em numerosos textos, plenos de originalidade no uso da linguagem poética.

Dentre suas obras, ressalta-se: “Cromos de Campo Maior”, “Noturno de Oeiras”, “Rosa dos Ventos Gerais”, esta contemplada com o prêmio Ribeiro Couto – obra reunida, conferido pela União Brasileira de Escritores (Rio de Janeiro), “ Sete Cidades – roteiro de um passeio poético e sentimental”.

Colaborador de vários jornais e revistas do Piauí, como “Presença”,“Almanaque da Parnaíba”, “Jornal O Dia”, “Meio Norte”, “Folha do Litoral”,”Gazeta Campomaiorense”, etc.

Foi agraciado com as seguintes distinções: “Medalha do Mérito Visconde da Parnaíba” (outorgada pelo Instituto Histórico de Oeiras), “Personalidade Cultural” (União Brasileira de Escritores /RJ),”Comenda do Mérito Da Costa e Silva” (União Brasileira dos Escritores/PI), e “Comenda do Mérito Renascença” (Governo do Piauí).

Além de poeta é cronista, contista e crítico literário.

Vale comprovar a propriedade de estilo de Elmar com a leitura do poema: “NOTURNO EM DOR MAIOR

Na noite ca’lad(r)a

um cão ladra

sem resposta

um galo canta

sem o eco doutro galo

um vaga-

lume vaga

sem lume

vaga-

rosa/mente

demente

na noite vaga

uma nave

noctívaga

navega

na vaga

do mar sem movimentos

nos cataventos

sem ventos

e de mira/gens

a noite espreita

nos olhos vidrados

do enforcado”

poema ENIGMA

“ entre o som

o sono

o sonho

a sombra e a sobra

eu me decomponho

em escombros

em farpas e agulhas

escarpas e fagulhas

desfeito enfim

em fogos de artifício

feito estrelas de mim

esfinge autoantropofágica que

não se decifrou e que a si

mesma se devorou”

nos quais destacamos a riqueza de estilo de Elmar na construção de palavras com palavras, sílabas e novas palavras, como vemos nos textos “A Ilha do Sonho e do Encanto”: As árvoresa de variados tamanhos, eram muito vivas, bem verdes e brilhantes, de diferentes formas e folhagens, luxuosas, luxuriosas, luxuriantes, e se embalavam e acenavam e bracejavam, movidas por vontade própria, interagindo com a gente”, e em “Uma Bela Morte”: “...Serenamente, sem um suspiro que não fosse mais leve que a mais leve brisa, qual uma vela cuja chama se extingue harmoniosamente, sem oscilações e vacilações, após cumprida a sua missão de iluminar, consumindo-se em seu próprio mister, sem um esgar, sem um ricto que lhe vincasse a feição composta, morreu, como se apenas meditasse ou dormisse”.

Elmar, a tua trajetória de homem de caráter e de intelectual ,singularidade no estilo, na concepção, na forma, na inspiração, enriquece qualquer silogeu.

Te acolhemos, sem que houvesse um só voto discrepante, e agora te aplaudimos e te abraçamos.

Seja bem vindo!

 

(Discurso de recepção proferido pela acadêmica Regina Freitas, em 17/10/10, em Piripiri-PI, na Câmara Municipal de Piripiri-PI, quando da posse do acadêmico Elmar Carvalho na Academia de Ciências, Artes e Letras de Piripiri-PI.)