NOTA: MEMÓRIAS  LITERÁRIAS

ARTIGO  ANTIGO  E, AGORA,  COMO    HOMENAGEM  PÓSTUMA  A    M.  PAULO NUNES

Defesa de um intelectual piauiense

                                           

                                                              Cunha e Silva Filho

Mais de um vez  me vejo  instado  a  dar minha  opinião contra  a injustiça imerecida e leviana, e desta vez  da injustiça duplamente  maléfica, que é a do apagamento  de fatos  e feitos do engenho  humano, de quem  tem ainda bem iluminada a chama  de acreditar  na possibilidade   de nunca se deixar  datado  em suas  práxis  cultural e dos saberes regionais e universais.   

  Desrespeitar ou  ignorar  a obra e  o nome  com raro  brilho   conquistado  pelo  professor  M. Paulo Nunes, sobretudo   a partir de sua  regresso  de Brasília, depois de uma  longa  permanência ali, para dar continuidade a metas e projetos  de realizar-se como  escritor e educador  tendo  a cultura  piauiense  como  seu  maior   objetivo   primacial de vida no plano  intelectual,  não faz sentido  e só prejudica  a imagem de um estado  que,  em geral, é  carente de maior visibilidade no país.

Não faz bem a  grupos de artistas  piauienses  procurar  indispor-se com  uma figura  que representa  a inteligência do Piauí  em tantos  dados  simbólicos   da cultura   do  estado, pelo que  imensamente   já  realizou  no campo  intelectual e em  realizações concretas na sua acepção mais   genuinamente piauiense. Uma vez,  um  membro da Academia  Brasileira de Letras  me confessou que Paulo Nunes, pelo nível  de cultura e sofisticação   que alcançou,  possa por vezes se sentir  um pouco  deslocado num meio  ainda  em alguns aspectos  provinciano.

Além de ser uma  reação   intempestiva e desabonadora a que foram  levadas  algumas pessoas  que se fazem   identificar  como gente  ligada  ao   mundo artístico local,    esses  supostos   artistas   desrespeitaram     um  eminente   intelectual, num  desacato à função   orientadora   ou mais consultora, conforme  lembra  o  professor  Cineas Santos em defesa  do   Presidente do Conselho  de Cultura  do Piauí.

 Ora,  senhores detratores  do  saber alheio,  todos temos  conhecimento  de que  o  crítico  M. Paulo Nunes  já é uma  pessoa  idosa, mas isso não  deve ser nunca motivo  de um  artista (?!)  escarnecer, como  demonstração da mais  rasteira  ignorância,  da condição de idade   elevada  de M. Paulo Nunes, inclusive  infringindo   um  dos  princípios  fundamentais do   Estatuto do Idoso, que é o de desrespeito ou  injúria  à  imagem dos mais velhos,  quando  países  de cultura  desenvolvida, como  o Japão, tratam  seus  idosos  com  o maior  carinho   e  reverência. Grandes  universidades  nos EUA  e na Europa   fazem questão de  nunca  se desligarem   da   orientação  e dos  préstimos  valiosos  de seus  scholars, ao contrário  de nosso   país  que não tem   apreço  em geral  pelos  mais  avançados em idade. 

No  caso  desse  simplório que  fez  piada de mau gosto com a idade  de M. Paulo Nunes,  como se idade mais  avançada  fosse uma doença,  e ainda  desinformando toscamente    quem o ouvisse  de que o  ensaísta  piauiense  só era  conhecido  por 70%  dos  piauienses,   tenho  o seguinte a  adverti-lo : o mundo  e o tempo  nasceram  para todos.  Se essa   sua obtusidade de nascença   e  falta  de neurônios    tanto  o prejudicam,  lembre-se de que  o  professor M. .Paulo Nunes, além de  ser  um  ilustre   intelectual, admirado  por  muita gente  da  cultura nacional, jamais caberia na falta de   juízo  argumentativo de sua   estreita  cabeça  de “artista” apagado e invisível,  já que os que conhecem  o ensaísta  são os que  leem,  os que amam  os livros,  os que estudam,  os  que  produzem e levam  a cultura   piauiense adiante.

O maior exemplo disso é que, nos meios acadêmicos  universitários,  temos  pesquisadores  estudando,  pesquisando e elaborando  trabalhos de pós-graduação com recortes focando  a participação de M. Paulo Nunes  na renovação  das letras  piauienses nos anos 40, ao lado de ºG. Rego de Carvalho,  H. Dobal,  Celso Barros Coelho, Afonso  Ligório, entre outros, conforme   também sobre  esse tópico se debruçaram  jovens  ensaístas    piauienses, como  Halan Silva (  As formas  incompletas – apontamentos para uma biografia. Teresina: Oficina da Palavra,  2005)   João Kennedy Eugênio e Halan Silva (Cantiga de viver – leituras (Teresina: Fundação Quixote, 2007).Da mesma forma, nesta   última  obra,  entre  jovens   ensaístas, M. Paulo Nunes  assina  ensaio    de análise do poeta  piauiense H. Dobal,  

Desta  maneira,  M. Paulo Nunes,  incansavelmente,  e até os  dias atuais,  no jornal  na  revista, no livro  na conferência leva a cultura  piauiense  adiante  fundamentado  numa  experiência  da sabedoria   dos  eruditos,  dos que  leram  o mundo naquilo que ele tem de mais   profundo em várias   frentes   do conhecimento  humano,  de culturas e gerações   diversas,   de visões  polifônicas,   de teorias, das artes  mais  populares às mais  requintadas,  do teatro clássico, popular  de  puras  raízes, da música,  em sus  várias   formas,   da  pintura,   da  arquitetura, das artes cênicas,  do cinema,   do contato com  as grandes  capitais   do mundo,   do convívio amplo com  as  melhores   inteligências  do  país,  na filosofia, na educação,  na política, no direito, história literária,  na crítica,  no ensaio, na sociologia,  na história,  na  literatura  universal,  no  convívio  íntimo   de  tudo o que se produziu  no Piauí  pelos  seus grandes  homens, enfim,  nos  multifacetados    saberes da inteligência  humana. 

No fundo,   as desavenças  no Conselho Estadual de Cultura  não seriam só isso, mas, quem sabe,  cabalar  para   destituir  o  atual Presidente e substituí-lo  - eis o perigo - por alguém  que não  estivesse à altura     das atribuições  de  um órgão  de alta  envergadura   cultural.  Aproveitando-se   da circunstância de que  um pretendente a membro do  Conselho, não teve   seu pleito atendido, o que não poderia  acontecer  dado que  a escolha do Presidente  cabe  ao  poder executivo.

 Ora,  tal fato  gerou  ressentimentos  e melindres da parte da classe  de artistas e é nesse  ponto que do ressentimento  passou-se à   indignação  de quem se  considerava  pouco   representado  como  classe que   reivindicava maior   voz  e vez  nas decisões  de representação de classe  do Conselho  Estadual de Cultura,  mas  em  vão,  porque   desprovida  de  conhecimento  dos valores   culturais, das ciências e dos  estudos,  das leis, das normas e  da memória  histórico-cultural  de uma personalidade  que, ao  longo de sua  atuação   como escritor,  educador no sentido mais   refinado  do termo,    professor emérito da UFPI e com  um   extraordinária  e invejável   folha de serviços   prestados  à  vida  intelectual   piauiense, somente   foi movida  pelo  bem-estar  do órgão que dirige  com dignidade e que já faz parte de sua vida e de seu espírito de escol. A revista  Presença, já no seu número  47,  é a mais  viva  prova  desse  escritor tão representativo de seu  povo e de suas tradições.   

A esta altura em que se encontra com  o seu  tempo  de   fecunda  e vibrante lucidez  de homem  de   letras  apoiado em anos e anos   de trabalho   e dignidade  de ações,  de estudioso,  de  um disciplinado   em tudo  que   faz  com  consciência  plena   do alcance  maior   de sua missão, o professor M. Paulo Nunes  sem  favor  merece,  por  tudo que  fez  pelo  Piauí, no domínio da inteligência  e do seu   desenvolvimento social,     cultural, histórico    e artístico  e o que mais  possa  ser  objeto de sua semeadura  em outras  direções   do seu pensamento   crítico-cultural  da  vida  contemporânea,  a posição  que  atingiu,  na condição   ímpar  de ser  talvez uma das    mais  respeitadas    figuras    piauienses  da atualidade.