SESSÃO  NOSTALGIA:

 

sábado, 20 de julho de 2013

Crime de lesa-língua?!

 

 

                                               Cunha e Silva Filho

 

 

 

            Não sei se meus leitores  ficaram sabendo  de uma  Lei  Federal,  a de Nº 12.605, de 03 de abril de 2012, que dispõe  sobre a forma gramatical de, nos  diplomas do ensino superior brasileiro, referir-se ao diplomado ou graduado através de desinência  de gênero pela  troca  do morfema –o pelo morfema –a, assim  simplesmente e elaborada ao arrepio  de   fundamentação  linguístIca e de respeito  à índole da língua portuguesa e de sua  formação  histórica, ou melhor dizendo,  do  português brasileiro, sintagma  classificatório  que, a meu ver,  melhor  se adapta  às modalidades  e variantes  léxico-prosódicas  do português lusitano,  matriz  primeira  da língua  portuguesa.

Em questões  de ortografia  e morfologia,  não se alteram  formas  linguísticas  ao bel-prazer  de alguém ou de uma autoridade,  ainda que  essa autoridade seja   o/a  Presidente da República.O fato  me recorda o tempo  da Reforma Ortográfica de 1943,  quando, por razões  de bairrismo,  inseriu-se a letra “h” no vocábulo  “Baía” para  designar  o  Estado nordestino apenas para  se atender  a um sentimento  de um imortal  ilustre  da Academia Brasileira de Letras  na época  em que era dela presidente José Carlos Macedo Soares, signatário do documento “Das Instruções  para a Organização do Vocabulário Ortográfico da Língua Nacional, 12 de agosto de 1943),  natural  daquele  estado.Ora,  isso não tem cabimento nem a mínima   base  científica, porquanto,  para  designar  o natural  da Bahia,  o locativo  “baiano,”  não  se grafa com  um “h” epentético.

Vejam, leitores, o que  com justa  razão, para  reforçar o que  relatei acima,    afirmaram  sobre  esse  fato  o eminente professor  Enéas Martins e Barros e o  distinto  filólogo  e gramático  Modesto  de Abreu a propósito da Reforma Ortográfica  de 1943:

 

(...) “ Na reforma de 1943, até o bairrismo imperou. Por proposta de um acadêmico baiano, a palavra Bahia manteve o h, contra todos os princípios em que se  louvava a citada reforma, para satisfazer um único imortal, como se essas questões secundárias pudessem  influir num assunto de fundo científico (itálicos dos autores. Cf. M. Barros, Enéias e ABREU,  Modesto de. Curso de Português. 7 ed. Primeira série,Curso  Colegial. São Paulo: Editora do Brasil, 1958, p.154).

 

O que  fica  evidente  é sanção    de uma Lei  que  “aprova’  o uso  de um  erro gramatical para designar  os gênero  masculino e feminino em  substantivos  considerados do gênero  comum de dois, cuja   forma  de designar  o masculino   deve ser  pelo   uso  do artigo  ou adjetivo   masculino ou feminino,  conforme o caso, como,   por exemplo,  “motorista,”  “dentista”,  “presidente’ etc.

Entretanto,  ao tomar  posse na Presidência da República a Sra.  Dilma Rousseff   fez questão  de “ inovar’  o português  brasileiro, ao se dar  o tratamento  de “Presidenta,” enfatizando  a flexão feminina em ” -a “ como se fora  correto  esse uso designativo  de sexo para a relevante  função pública. Exemplo de “feminismo”? De parecer  diferente  por ser a primeira mulher  brasileira a assumir  o mais alto  cargo  do país? A mim  pareceu apenas  um mero  capricho  de exibição do poder  da mulher, algo  bizarro, sem   importância alguma. Quanto à sua entourage,  essa  se  superou  no aulicismo,  na  bajulação palaciana  de serem  os primeiros  a empregar  o substantivo  no feminino. Felizmente,  o  jornalismo  não  aderiu  a essa bizarrice  infundada  de  parti-pris de estofo  petista.

Um tipo de Lei  assim é aprovada, não tem repercussão e não me consta  que algum  estudioso  da língua portuguesa  tenha  feito  algum  comentário  sobre  ela. Não  é possível que tenham  ficado  calados os linguistas,  os filólogos e os nossos gramáticos.  Não sei tampouco  que atitudes tiveram os membros  da Academia Brasileira  de Filologia ou outras entidades   ligadas  aos estudos   linguísticos e filológicos, tendo à frente a Academia  Brasileira de Letras.

Conforme  li  num texto  da internet,  será que, de agora em diante,  teremos   gente  que,  aderindo  a essa  excrescência de Lei,  irá  empregar, aproveitando os esquema de abusos contra  o nosso idioma cometidos  por  ignorantes (deputados federais )  dos usos  linguístico-gramaticais,   substantivos, para  designar  os dois gêneros no que diz  respeito a profissões e formas de tratamento   oficiais,  em moldes  bizarros tais como  “o dentisto,  a dentista,    o oftalmologisto, a oftalmologista,  o motoristo, a motorista, ou,  quem sabe, o presidento para combinar com a presidenta, conforme  ironizou um amigo espirituoso e criativo.. Eu não sabia que o português brasileiro era uma terra de ninguém, um vale-tudo, um samba de crioulo doido.

 

Têm a palavra  os gramáticos,  os linguistas e os filólogos. O que não  se  pode  continuar   é  com esse  tratamento  sem base científica e sem  o devido respeito  ao uso   escrito  de nossa  língua,  agora  submetida  a  humores e  caprichos  excêntricos  e fascistas, interferindo atabalhoadamente em campos de estudos  de linguagem  dos quais  não têm  nenhuma  formação sólida. Por acaso, foram consultados  os especialistas no  assunto   ou deles foram  solicitadas  opiniões criteriosas e  abalizadas? Creio que não. Daí o absurdo da Lei.Nº 12.603.

Pergunto-me: que ideia estapafúrdia é essa  de o  Congresso decretar  e a Presidente sancionar  uma lei  dessas?  Ou, como um  amigo  me  confidenciou: o Governo não tem coisas mais  importantes e urgentes a fazer, por exemplo,  - acrescento eu -, atender  aos  gritos  das manifestações nas ruas?