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[Maria do Rosário Pedreira]

Aqui na terra muitas actrizes e apresentadoras se tornam autoras de romances – mas a verdade é que os seus livros são, ao que se diz, xaroposos e lamechas. Pois no Brasil parece que uma actriz, Fernanda Torres, surpreendeu tudo e todos com o seu primeiro romance aos cinquenta anos. Fim é o título da obra a várias vozes sobre cinco amigos já idosos à horinha da morte (não, não morrem todos ao mesmo tempo, mas o primeiro texto relativo a cada personagem é sempre um relato na primeira pessoa dos últimos momentos cá deste lado) e o que, na vida de cada um, teve, afinal, cruzamentos e implicações na vida dos outros. A crítica brasileira embandeirou em arco com a estreia de Fernanda Torres – e esses encómios reproduzidos na badana, bem como a editora que levou o livro à estampa, a famosa Companhia das Letras, que agora também já publica em Portugal, atraíram-me para a leitura. Não fiquei tão convencida como gostaria, mas, pronto, atribuo a minha renitência ao êxtase à dificuldade em perceber algum do léxico usado, o que impede a fruição imediata; achei, porém, bem interessante como esses textos de abertura que mencionam os nomes da personagem e as respectivas datas de nascimento e morte são, de certa forma, herdeiros do teatro, pois podiam ser divertidos (e às vezes trágicos) monólogos recitados em palco – ou não fosse Fernanda Torres, acima de tudo, uma actriz. Vale a pena, em todo o caso, assistir a uma estreia nada fútil, para variar, num romance que é sobre a vida a escapar-se, a vida a ser vivida até ao rebentar das costuras (droga, sexo, etc.) e também o valor da amizade, mesmo quando esta é traída porque não há duas pessoas iguais e algumas estão-se nas tintas para a lealdade. Experimentem – e depois digam-me o que acharam.