[José Ribamar Garcia]

              Garotinho, duas vezes. Sua mulher Rosinha, uma vez. Sérgio Cabral, duas vezes. Pezão (com este nome não podia dar outra coisa), afilhado de Cabral, ainda, no cargo. O que mais esperavam os cariocas? Que o estado do Rio de Janeiro e sua capital nas mãos desse quarteto se tornariam um paraíso?  Ou uma Shangri-la, como a imaginada pelo escritor inglês James Hilton, no seu livro “Lost Horizon”? Quanta ingenuidade! Ou cumplicidade? Ou desamor? Às vezes, chego a pensar que o carioca não gosta de sua cidade. Do contrário, não a entregaria a saqueadores. Que depredaram, quebraram e faliram o segundo estado mais rico do País. Quebrados e falidos. Se fossem  empresas privadas teriam fechado as portas e demitido os empregados. Como não os são, os funcionários continuam na ativa, porém, sem receber os vencimentos.

              O povo que escolheu esses sicários, agora, está padecendo. Pagando as consequências. Profundas. Gente morrendo às portas dos hospitais, que não tem vagas, remédios, nem profissionais suficientes para atender a demanda. Escolas públicas fechadas. Repartições e autarquias dizendo não. E o chororô: “Faz um ano e meio que estou na fila pra cirurgia de catarata”. A segurança pública, sucateada. A criminalidade prosperou, a despeito da intervenção federal, sem êxito, por falta de dinheiro para custeá-la. O próprio interventor ainda não viu a cor do seu salário. O crime corre  desenfreado pelas ruas, com o cidadão indefeso, desarmado, morrendo pelas mãos dos assaltantes. Tudo acontecendo, à luz de um sol tímido e morno de inverno.                       

                A cidade perdeu seu decantado humor. E sua alegria, espontaneidade, graça e cordialidade, que encantavam e cativavam o resto do País. Tomada que foi pelo tráfico e pela milícia. Duas organizações que comandam o crime organizado e mantêm uma guerra por disputa das favelas e de outras comunidades. Afora, as batalhas internas, entre os bandidos pela liderança de facções. A qualquer hora do dia, os tiroteios se repetem, com balas se cruzando e atingindo inocentes. E a bandidagem bem armada e blindada, inclusive acobertada por alguns políticos, vai se apossando da cidade. Já se apossou de vários logradouros, transformados em territórios fechados, numa versão carioca das FARCs colombianas. Nestes pontos – ou cabeças de ponte -, nem a Polícia consegue entrar. E o chororô: “Eu tinha um sítio em Guaratiba e os milicianos me tomaram”. Ou: “Os traficantes me expulsaram da casa que eu tinha conseguido do  Minha Casa e  Minha Vida, em Campo Grande”.

                 Fato é que o crime organizado está levando a melhor. Até quando? 

               A população  aterrorizada pelos incessantes assaltos e balas perdidas.  De sair de casa e jamais voltar. Nesse clima de roleta russa, tem se agarrado à São Sebastião, com súplicas e promessas.  O santo, padroeiro da cidade, que leva também o seu nome, e a salvou uma vez. Diz a lenda que, na Batalha de Uruçumirim, ele foi visto lutando ao lado dos portugueses contra os invasores franceses e sua participação foi decisiva na expulsão destes. Mas, isso faz muito tempo. Coisa de quase seis séculos. Será que o bom e valente Santo ainda se lembra? Certamente. Pois, santo, segundo o cristianismo, tem memória atemporal, nunca se esquece. Dúvida, porém, é se ele está disponível e disposto a salvar novamente a cidade. Entregue aos saqueadores por esses mesmos suplicantes.