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Miguel Carqueija



Eu sempre acabo retornando para cá, a cidade fantasma, onde se extraviaram todos os meus sonhos. 

E percorrendo as inúmeras e tortuosas vias arruinadas, varridas por sinistros redemoinhos repletos de poeira, vejo as sombras de todas as pessoas e animais que passaram pela minha vida e dela se foram para sempre.

Talvez fosse um bem se eu pudesse um dia varrer de minha mente todas as avantesmas, trasgos e duendes, espectros e monstros que habitam a cidade fantasma.

Não mais enxergar os sobrados em ruína, as ruas esburacadas e imundas mas repletas de sinais e marcas dolorosas de outros tempos, de tabuletas indicativas que eu jamais segui e já não poderia mais fazê-lo.

Não escutar o grasnado agourento dos corvos encarapitados em horrendas gárgulas, desviar-me das serpentes verdes e sibilantes, não mais ouvir o pio lúgubre da coruja das torres; não mais demorar o olhar nas visagens que voam com o vento, esse vento atroz que uiva sem cessar e levanta as folhas mortas que enchem as ruas, caídas de sombrias e seculares árvores pouco acolhedoras.

Queria não mais retornar a essa terra estéril de um passado morto que me atrai como maligna voragem.

Reencontrar a fada peregrina que com seu pó mágico recompõe a vida e a felicidade que um dia se foram como poeira da rua levada pelo vento.


Rio de Janeiro, 7 de dezembro de 2015.

 

 

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