Ching e Kong
Em: 19/04/2012, às 14H09
[Bráulio Tavares]
(Liou Seng-Sen e Liou Tang-Sen, 1903)
Irmãos siameses, unidos por uma faixa abdominal. Quando tinham seis meses de idade deram entrada no Centro Cirúrgico do Hospital Central de Beijin para serem separados (a ciência da época já dominava essa técnica). Os médicos não conseguiram, porque os gêmeos resistiram a doses elefantinas de anestésico, permaneceram acordados, e pulavam tanto que os médicos acharam mais prudente adiar a cirurgia. Quando completaram um ano, foi feita nova tentativa, mas uma médica começou a chorar quando viu os dois (mais uma vez despertíssimos, depois de litros de Nembutal) abraçarem-se um ao outro, fazendo que “não” com a cabeça. Os pais (que planejavam doar um e ficar com outro) tiveram que se resignar, mas a essa altura uma estação de TV já estava comprando a briga e criou um reality show baseado na dupla.
Uma bateria de testes revelou aos cientistas algo que os pais já tinham percebido, ou seja, que os meninos eram anormalmente inteligentes, sendo que Ching era metódico, paciente, com aptidão para as matemáticas, e Kong era um capeta indomesticável (tinha sido ele o escolhido para doação). Quando começaram a andar, era Kong quem arrastava o irmão para as travessuras e pequenas surtidas de vandalismo doméstico, e era Ching que depois relatava tudo aos pais, mesmo sofrendo beliscões e cusparadas. Tornaram-se adolescentes por entre bebedeiras e meditações zen. Só namoravam garotas grandalhonas, uma de cada vez (achavam obsceno sair com duas). Câmaras os acompanhavam à distância (Kong não gostava delas e especializou-se em alvejá-las com bodoques, e depois com armas de ar comprimido). Não frequentaram escolas; uma multinacional custeou seus estudos. Eram imprevisíveis: nas aulas de literatura Ching dedicava-se aos Surrealismo e à poesia beat, e Kong logo tornou-se um expert em Emily Dickinson.
Aos 31 anos apaixonaram-se pela Dra. Musatra, uma bióloga da Nova Guiné que criou uma ONG apenas para estudá-los. A doutora percebeu que com o passar dos anos a faixa abdominal que os unia estava se tornando mais curta, o que ameaçava a vida dos dois. Numa manobra audaciosa ela os raptou do Hospital Central de Beijin, onde viviam até então. Passaram-se dois anos de buscas e investigações até que a Dra. Musatra foi localizada, sob nome falso, num centro médico de Durban. Ali, ela apresentou seu marido Chong, e provas irrefutáveis (com copioso material audiovisual) de que nos dois últimos anos os dois irmãos tinham se fundido um ao outro, transformando-se numa única pessoa. A comunidade científica rejeitou as provas irrefutáveis, pôs o casal em prisão domiciliar e procura até hoje os irmãos desaparecidos