Cidade de Amarante, fundada em terras da antiga fazenda Graciosa.
Cidade de Amarante, fundada em terras da antiga fazenda Graciosa.

Reginaldo Miranda[1]

Foi um importante colonizador do baixo-Canindé, onde adquiriu terras, implantou fazendas e comercializou boiadas. É o iniciante da geração dos Costa Veloso, que representou saliente papel na vida política, social e econômica da cidade de Oeiras e das vilas de Valença, Jerumenha e São Gonçalo, esta última hoje representada pelos municípios de Regeneração e Amarante.

Nasceu João da Costa Veloso, à volta de 1690, na aldeia de Corvos, situada na freguesia de Santa Maria de Bagunte, termo de Barcelos, do arcebispado de Braga, filho de Roque Veloso e Apolônia da Costa. Era seu genitor natural da freguesia de Garfe, pertencendo sua família à mesma casa de Pedro da Silva e de seu filho Damião da Silva, que ali continuaram morando, saindo, porém, ele ainda moço para ser feitor na Quinta de Cavaleiros, junto a Bagunte, onde cuidava das rendas da dita Quinta. Mais tarde casou-se com Apolônia da Costa, natural do lugar de Friães, na vizinha freguesia de São Martinho de Outeiro, contígua à de Bagunte, em cuja jurisdição fixou residência na aldeia de Corvos, local onde nasceram os filhos Lourenço, Damião[2], João e mais oito, totalizando onze.

João da Costa Veloso fez seus estudos iniciais na terra natal, os continuando na cidade de Lisboa, para onde mudou-se ainda na adolescência. Mais tarde, mudou-se para a cidade da Bahia. Naquele tempo era sonho de todo jovem reinol vir para as terras do Brasil, fazer a vida na Colônia. E nosso biografado não fugiu à regra, sendo um típico colonizador lusitano, daqueles que vêm solteiro e aqui casam com filhas ou netas de seus conterrâneos, recebendo dote e iniciando-se no criatório bovino e cavalar. Dessa passagem por Lisboa e estada na Bahia, temos o registro de alguns conterrâneos. Inquirido em 14 de abril de 1762, na freguesia de Santa Maria de Bagunte, disse o morador local Manoel Thomé, de 68 anos de idade:

“que João da Costa Veloso, pai que se diz do justificante, é natural desta freguesia do lugar de Corvos e o conheceu muito bem nesta freguesia, donde foi para as partes do Brasil e com ele falou na cidade da Bahia, onde ele testemunha esteve”[3].

Na mesma data e local disse a testemunha José Francisco, de 70 anos de idade:

“que João da Costa Veloso, pai do justificante bem se diz ser, é natural desta freguesia do  lugar de Corvos, e sendo de menor idade se ausentou para as partes do Brasil ainda que não está certo no seu conhecimento, contudo como nesta freguesia lhe ficaram dez irmãos como é Lourenço da Costa e Damião da Costa e outros lhe falaram no predito João da Costa Veloso, filho legítimo de Roque Veloso e de sua mulher Apolônia da Costa, natural este do lugar de Corvos desta freguesia e ele da freguesia de Gerfe, junto à Senhora do Porto, donde veio para a Quinta de Cavaleiros sendo feitor e tinha cuidado das rendas da dita Quinta; e veio a casar nesta freguesia com a dita sua mulher, sendo moradores no dito lugar de Corvos, a que ele testemunha conheceu e falou com eles várias vezes e por filho legítimo dos mesmos é o predito e havido como também os ditos seus irmãos e declarou que segundo sua lembrança a dita Apolônia da Costa era natural da freguesia de São Martinho do Outeiro, próxima desta Begunte”[4].    

Depois de ouvir diversas testemunhas, conclui o padre Diogo Gomes Ferreira que

“João da Costa Veloso era natural da mesma freguesia de Bagunte, do lugar de Corvos, que sendo moço se ausentou para a cidade de Lisboa e depois para o Brasil”[5].

Pois bem, João da Costa Veloso veio para a cidade da Bahia em companhia de um irmão que era religioso do hábito de São Bento. Mais tarde, ficando ali esse irmão veio ele para o Piauí, onde casou-se com Maria da Silva Reimoa, natural da freguesia de Nossa Senhora da Vitória, da vila da Mocha, no sertão do Piauí, filha do sargento-mor de cavalaria auxiliar Miguel de Araújo Reimão, natural da freguesia de Santa Maria de Sardoura, no bispado de Lamego e de sua esposa Antônia da Silva Pinto[6], natural da freguesia de Santo Amaro da Pitanga, no Recôncavo da cidade da Bahia. Note-se que o processo de colonização segue um padrão, vindo do reino apenas os rapazes para casar-se com as filhas dos conterrâneos, que nasciam na colônia. O mesmo também fizera o sogro anos antes ao casar-se com uma baiana, também descendente de portugueses e assim repetindo-se o mesmo processo por sucessivas gerações. A nubente possuía um irmão padre secular do hábito de São Pedro, Manoel de Araújo Reimão, assistente em Minas Gerais.

Em virtude do consórcio com a filha desse abastado fazendeiro, João da Costa Veloso recebeu em dote vultoso rebanho de gado vacum e cavalar situado na fazenda Graciosa, na foz do rio Canindé, medindo duas léguas e meia de comprimento e de largura com formato irregular, medindo em partes uma légua e em outras menos de meia. Contudo, porque o sogro enfrentou processo de execução em face de ter sido fiador de Luís Cardoso Balegão, teve o genro de arrematá-la no juízo dos ausentes da comarca de Oeiras, a cujo termo pertencia, assim como todo o território piauiense. Em 3 de julho de 1748, vai adquiri-la por sesmaria, alegando que sucedera ao sogro na posse do imóvel, somando esta posse mansa e pacífica mais de 25 anos. Essa fazenda foi povoada por Miguel de Araújo Reimão, dela pagando renda, assim como o genro e sucessor a Domingos Afonso Sertão e a seus sucessores da Companhia de Jesus, até o tempo em que houve embaraços e foram expedidas ordens para cessar todos os tais pagamentos. Na segunda metade do século seguinte seria fundada em seu território a cidade de Amarante.

Ingressando na vida pública ocupou por eleição popular diversos cargos na vila da Mocha, hoje cidade de Oeiras. Em nossas pesquisas o surpreendemos no exercício do mandato de vereador e juiz ordinário no triênio 1736-1738.

João da Costa Veloso foi um típico fazendeiro do sertão do Piauí, criando gado vacum e cavalar, que os vendia anualmente nas feiras da Bahia, Pernambuco e Maranhão. E ingressou no regimento de cavalaria auxiliar, alcançando a patente de capitão. Residiu sempre em sua fazenda Graciosa, onde veio a falecer em data que não sabemos precisar.  Já não existia em 15 de novembro de 1762, quando foi elaborada uma relação de todos os possuidores de terras do Piauí. Naquele importante documento há a informação de que a referida fazenda ficara para “Assenço da Costa Veloso e sete irmãos do mesmo”, “a qual lhe pertenceu por falecimento de seu pai João da Costa Veloso”. Assim, por esta informação ficamos sabendo que eram oito os seus filhos, sendo um “professo na Companhia de Jesus, na Bahia”. Cidadão abastado, deixou uma família que projetou-se na vida pública piauiense, podendo-se destacar os seguintes filhos:

Assenço da Costa Veloso, o primogênito, diretor dos índios do aldeamento de São Gonçalo, vereador de Oeiras, membro de uma junta de governo do Piauí, residente na fazenda Graciosa, casado com Floriana Maria de Barros.

Perpétua da Costa e Silva, residente na fazenda Juazeiro, ribeira do Canindé, em 29 de agosto de 1776, casou-se com o fazendeiro Francisco Vieira de Carvalho[7], filho Hilário Vieira de Carvalho, o velho, e de Maria do Rego Monteiro[8].

Maria da Silva Reimoa, a moça, casada com Manoel da Costa Muniz, residentes na fazenda Lagoa do Meio.

Antônio da Costa Veloso, residente na fazenda Graciosa, foi batizado em 3 de dezembro de 1733, na igreja matriz da vila da Mocha.

Padre Francisco da Costa Veloso[9], nascido em 1722, presbítero do hábito de São Pedro, ordenado em São Luís do Maranhão (1764), foi vigário da freguesia de Santo Antônio da vila de Jerumenha, no vale do Gurgueia, onde veio a falecer. Era também abastado fazendeiro, aparecendo na relação de exportadores de gado da freguesia de Jerumenha para o Maranhão, elaborada em 26 de setembro de 1800, como exportador de 240 reses naquele exercício financeiro.

Dionísio da Costa Veloso, residente na fazenda Paulista, vereador e juiz ordinário de Oeiras, foi casado com Águeda Rodrigues de Santana, filha de Valério Coelho Rodrigues e Domiciana Vieira de Carvalho.

José da Costa Veloso, nascido em 1732, residente nas fazendas Jacaré e Chapada, hoje termo de Regeneração, naquele tempo de Oeiras, onde era criador, foi testemunha ouvida no auto de corpo de delito da morte dos índios guegués, em 2.8.1780.

Capitão João da Costa Veloso, o moço, nascido em 1740, homem branco, casado, natural do termo da cidade de Oeiras, vivia de seus bens, foi testemunha em devassa de 16.10.1800 e sumário de 7.5.1801.

Com essas notas resgatamos alguns aspectos da vida do capitão João da Costa Veloso, abastado fazendeiro e pioneiro na colonização do Piauí, em cuja sociedade deixou numerosa e ilustrada descendência.

 

 

 

 

 


[1] REGINALDO MIRANDA, advogado e escritor, membro titular da Academia Piauiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí. E-mail: reginaldomirandaadv@gmail. com

[2] Casado no lugar de Azurara, Bispado do Porto, Damião teve dois filhos clérigos, padres João Lopes e Manoel da Costa.

[3] Autos de justificação de fraternidade e genere de Francisco da Costa Veloso. Câmara Eclesiástica de São Luís do Maranhão, 24.8.1764.

[4] Autos de justificação de fraternidade e genere de Francisco da Costa Veloso. Câmara Eclesiástica de São Luís do Maranhão, 24.8.1764.

[5] Autos de justificação de fraternidade e genere de Francisco da Costa Veloso. Câmara Eclesiástica de São Luís do Maranhão, 24.8. 1764.

[6] Filha Antônio Fernandes de Sousa e Thereza de Jesus, também pioneiros na colonização do Piauí.

[7] Primeiro casamento deste. Depois de viúvo, casou-se em 8.8.1779, com Ignácia Maria de Jesus, filha de Antônio Alves Brandão e Floriana Maria de Jesus.

[8] O pai do nubente e os pais da nubente já eram falecidos, sobrevivendo apenas a mãe daquele. O registro de casamento comprova a filiação.

[9] Os autos de justificação e genere dele foram  importante fonte de pesquisa para a elaboração dessas notas, elucidando dúvidas genealógicas.

ção do Piauí.