Bateria de poemas de Bruno Ítalo

O AMOR E OUTROS ÓDIOS

 

Meu sangue

decantado

em veias mortas

jorrará em pedras

 

lítica

visão

 

as pedras

enegrecidas

se lançarão em arcos

de volta ao solo árido

 

chafariz

paixão

 

cairão

em terra fértil

sementes vivas

pedras do novo templo

 

flores

serão

 

Bruno Ítalo

 

 

EXSICATA

 

 

Aperto o passo e ainda assim carrego

presa ao sapato

a folha seca e quebradiça

 

arrasto a sola

chuto a porta

dou três pulos...

 

Impávida, resiste

 

De repente, a percebi triste

crepitada ao sol – antes fonte

lançada ao solo – antes forte

tangida pelo vento

que a embalava

 

Veio a mim

buscando novo tronco

nova raiz

orvalho – quem sabe

 

Agora conservo

seu limbo prensado

nos versos de um poema

 

Bruno Ítalo

 

 

 

ALENTO

 

 

Treme o céu de zinco

em lufadas de pensamento

 

o tempo passa lento

cavalgando nuvens

 

espero que se curvem

alma e tegumento

ao belo ornamento

de andaimes e tapumes

 

Da janela do apartamento

                             o tempo

                            passa

                              ale

                               n

          t

          o

 

Bruno Ítalo

 

 

 

PASSO

 

 

Desço a rua

como quem desse a noite

 

olho para trás –

ouço meus passos

passarem por mim

 

piso em memórias

dos últimos dias

 

um cachorro escuro

esguio feito a brisa

vigia a rua

vazia

 

enquanto passo

mais brisa

mais rua

mais vazia...

 

enquanto passo

o animal sem guia

me vigia[1]

 

Bruno Ítalo

 

 

 

MILAGRE

 

 

Sondava o acaso

sutil

do milagre

do impossível e imprevisto...

 

e dentre mil acres

acasos

– doce raro

   aro de sol

um veio me dar azo

 

o mais

límpido raio

com leves mil asas

– naves de luz

pousou

em meu peito ímpio

 

o ocaso cindiu em cacos

ruiu em êxtase

 

se redimiu

 

Bruno Ítalo

 

 

 

GALÁXIAS

 

 

Como me impressiona

o lado negro dos teus olhos...

 

muito me comove o cosmos

na expressão de tua face

luminosa

 

vejo infinitas galáxias

nas espirais dos teus cabelos

caio em buracos negros

quando te sinto respirar

 

e é tudo tão pequeno

tão simples

tão arcano

tão celeste

tão mundano

 

que eu me encontro

suspirando

por tão pouco saber

por tanto mais acreditar

 

 

 

PATA

 

 

Um cão de memória curta

lambendo a pata

quer guardar

o sabor dos passos

 

Já o rabo

            balança

      feliz

 

            não

     toca

            o chão

 

                        fica

            para

trás

 

Bruno Ítalo

 

 

 

DESEJO

 

 

Chuva que dure

horas, anos

                  sem causar danos

 

Mar que agite

ondas gigantes

                         sem naufragantes

 

Amor que faça

vivermos, morrermos

                                   sem querer menos

 

Bruno Ítalo

 

 

 

HAICAIS

 

 

PONTEIRO

Preguiça profunda —

o ponteiro dos segundos

aponta segunda

 

Bruno Ítalo

 

ASTRO

 

No olho do meu filho

raia o rosto refletido ­—

sol da madrugada

 

Bruno Ítalo

 

POUSA

 

Arapuca pouca —

olhos fixos no papel

a palavra pousa

 

Bruno Ítalo

 

VÉU

 

Nu no azul do céu

lento o Sol se ruboriza

anoitece um véu

 

 

SUSPIRO

 

Suspiro lunático —

a lua louca lá no alto

joga pedra em mim

 

Bruno Ítalo

 

 Nascido em Teresina/PI (1985). Servidor público federal. Bacharel em Direito. Poeta e músico. Publica seus poemas regularmente na rede social Instagram (perfil @bispoesias).