Igreja matriz de N. Sra. da Conceição.
Igreja matriz de N. Sra. da Conceição.

                                                                                                            * Reginaldo Miranda

A aprazível cidade de Barras, no norte do Piauí, antiga Barras de Marataoan, também foi em suas origens chamada popularmente de Capela das Barras.

Deita suas origens no princípio da colonização, tendo iniciado em uma fazenda denominada Buritizinho, ao que anotam alguns cronistas, de propriedade do fazendeiro e coronel de ordenanças baiano Miguel Carvalho de Aguiar. Na primeira metade do século XVIII, teria este iniciado a construção da capela sob o orago de Nossa Senhora da Conceição, porém, falecendo sem concluí-la. No que se refere ao nome da fazenda, em nossas pesquisas sempre encontramos referência à fazenda das Barras, com mais de quatro léguas de terras, e nunca Buritizinho, tendo recebido aquela denominação em razão de sua localização privilegiada, entre seis barras de rios e riachos, inclusive o Marataoan.

Aliás, sobre esse último curso d’água, muito importante na economia do lugar, a primeira informação aparece na Descrição do sertão do Piauí, relatório do padre Miguel de Carvalho, redigido em 1697, com a grafia de Maratamhain. Para nós a origem etimológica dessa palavra nada tem a ver com o prefixo da palavra Maranhão, que significa rio grande, rio largo, que entra no mar. Foi o caso do Amazonas, que recebeu esse nome inicialmente, dado pelos espanhóis. Também, a capitania do Maranhão, cuja enseada de São Luís na baía de São Marcos, onde deságua o Itapecuru, é bastante larga. E o Maratamhain ou Marataohan, hoje Marataoan, é muito pequeno. Acreditamos que a etimologia vem do tupi maratawã, que deu origem à palavra maratauá, árvore cuja madeira é própria para construção. Então, é provável que naquele tempo existisse em seu vale muita madeira de lei, própria para construção, daí se originando o nome do rio. O nome não tem a ver com o rio e sim com a mata ciliar, pois em tupi tudo que se relaciona ao rio tem "i", daí Piauí significar rio dos piaus. Seria, pois, Marataoan, rio que corre entre matas verdejantes, de madeiras nobres.

Pois bem, com o falecimento do pioneiro proprietário, foi a extensa fazenda arrematada em praça no juízo dos ausentes, pelo colonizador português Manoel da Cunha Carvalho, que tomou para si a responsabilidade pela conclusão da capela, concluindo-a em 1759, com a ajuda de alguns fiéis e de missionários católicos, sendo frei Manoel da Penha, para uns, padre Malagrida, para outros. Posteriormente, Manoel da Cunha Carvalho destacou da referida fazenda, cerca de três léguas de terras e as vendeu para Manoel Antunes da Fonseca, tendo este repassado pouco mais de uma légua de comprimento por quase outra de largura a Antônio da Costa Oliveira. No entanto, Manoel da Cunha Carvalho reservou para si “pouco mais de hua legoa de terra, na dita fazenda das Barras, aonde está hua Capella de Nossa Senhora da Conceipção”, conforme consta em um documento redigido pelo desembargador Francisco Marcelino de Gouveia, em 16 de novembro de 1762. Por este documento pode-se concluir que até a data indicada, o local onde hoje se situa a cidade de Barras somente pertenceu aos criadores Miguel Carvalho de Aguiar e Manoel da Cunha Carvalho, este último casado com Isabel da Cunha e Silva Castelo Branco, filha do português Manuel Carvalho de Almeida e de sua esposa Clara da Cunha e Silva Castelo Branco.

Em torno da capela iniciou-se o povoamento do lugar, de forma que em 1809, já era um núcleo populacional bastante promissor, com meia dúzia de casas na parte meridional. Em 1815, formaram-se as primeiras ruas, sendo o distrito de Barras criado por decreto de 20 de outubro de 1823; a emancipação política, desmembrando-o do termo de Campo Maior, deu-se pela lei provincial nº 127, de 24 de setembro de 1841, oficialmente instalado em 19 de abril do ano seguinte, que criou a vila e município de Barras. Foi a vila elevada à categoria de cidade com a denominação de Barras do Marataoan, pelo decreto n.º 1, de 28 de dezembro de 1889. Porém, cumpre esclarecer que esta não é a data de sua emancipação política e sim a da anterior elevação à categoria de vila.

Para deleite dos historiadores, transcrevo na íntegra a fonte de minhas informações, o relatório do desembargador Francisco Marcelino de Gouveia, depositado no Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa:

“O mesmo Antonio da Costa de Oliveira, possue mais hua porção de  terra, que teria pouco mais de legoa de comprimento, e quasi outro tanto de largura, que hera pertencente à fazenda da Barra, a qual lhe vendeo Manoel Antunes da Fonseca, senhor da dita fazenda”.

“Manoel Antunes da Fonseca, possui a fazenda da Barra, com quasi duas legoas, por ter vendido a mais terra com que a comprou, a Antonio da Costa de Oliveira, como fica dito, a qual comprou a Manoel da Cunha Carvalho, rezervando este, que a tinha rematado em prasa no Juiso dos ausentes desta comarca para sy, pouco mais de legoa de terra, como logo se dirá”.

“Manoel da Cunha Carvalho, possue, pouco mais de hua legoa de terra, na dita fazenda das Barras, aonde está hua capella de Nossa Senhora da Conceipção, o que tudo era pertencente à mesma fazenda das Barras, e do mesmo possuidor já declarado”.

Ficam essas notas como contribuição à história desta bela cidade do norte do Piauí.

(Publicado originalmente no Diário do Povo, 6.11.2016).

Foto da antiga igreja de Barras, demolida em 1963.

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*REGINALDO MIRANDA, autor de diversos livros e artigos, é membro efetivo da Academia Piauiense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí e do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-PI. Atual presidente da Associação de Advogados Previdenciaristas do Piauí Contato: [email protected]