Cunha e Silva Filho


                          No geral, todos os males crônicos que afligem a população do Rio de Janeiro, malgrado reconheça que alguns igualmente se vêem em outras capitais brasileiras, poderiam deixar de sê-lo se a autoridade pública e setor privado se dessem as mãos e procurassem meios de diminuir o seu impacto catastrófico para a sociedade, principalmente para as camadas menos favorecidas da população que se utilizam desse transporte de massa.
                        Veja o leitor a tragédia que aconteceu hoje de tarde na Avenida Brasil, onde um ônibus, em velocidade acima do permitido, choca-se com o gradil do viaduto que vem da Ilha do Governador e tomba de ponta cabeça de uma altura de, pelo menos oito metros. Resultado: oito mortos e uns onze feridos, estes conduzidos por resgate de helicóptero ou mesmo de carro, caso de um taxista que, vendo o sofrimento de pessoas feridas, levou as que pôde para um hospital mais próximo. As tragédias, que ninguém deseja que ocorram, unem os brasileiros, o que é uma virtude entre nós.
                       A causa desse acidente, segundo o depoimento dado à imprensa televisiva por um sobrevivente de nome Daniel Silva, que está em observação num dos hospitais do Rio, apenas tendo sofrido um pancada na cabeça e alguns ferimentos leves, foi uma discussão entre um passageiro e o motorista, O passageiro, indignado com a velocidade do ônibus, advertira duramente o motorista de que ele estava correndo muito e poderia provocar um acidente. O motorista, de forma malcriada, soltando palavrões, lhe respondera que se o passageiro quisesse “conforto,” que fosse pegar um táxi. Foi nesta rápida e áspera discussão, levada quase às vias de fato entre os dois, que, de repente, o veículo se desgovernara e, como afirmei, despencara do viaduto. 
                    Outra versão, todavia,  conta que o passageiro  indignado, um jovem  universitário,  havia primeiro  tocado o sinal de parada do ônibus sem que o motorista  o atendesse, daí ter-se iniciado uma bate-boca que chegou à agressão por parte do  passsageiro. O motivo do  acidente mostra-se, pois,  conflitante quanto ao que  de fato   se deu   no veiculo. De qualquer forma,  para mim  a causa  primeira  seria a alta velocidade, que explica toda  essa tragédia.                     

                  Quem anda muito de ônibus no Rio sabe que uma tragédia dessa magnitude era de se esperar. Eu próprio, que ando também de ônibus, já me vi na mesma situação em que se encontravam os passageiros dessa tragédia. Muitas vezes já chamei a atenção de motoristas imprevidentes, irresponsáveis, violentos e mal preparados para a função que exercem. Por outro lado, ao chamar a atenção de um motorista desta espécie, quase sempre não encontro ninguém no veículo que manifeste solidariedade a mim. Ao contrário, alguns até mostram-se hostis. Em suma, estamos sozinhos nesta queixa contra maus profissionais de volante e o cúmulo disso tudo é que há passageiros que só gostam de motoristas que correm muito como desvairados. Por aí se vê que a situação é delicada e difícil.
                    Deixando de lado este aspecto digamos, de “desunião’ dentro de coletivos, há uma reivindicação que poderia ser levada a sério a fim de mobilizar os usuários de ônibus independente do que seja a sua reação ou a sua opinião sobre o assunto. Através dos meios de informação de que dispomos, poder-se-ia lançar uma campanha de esclarecimento aos usuários de coletivos no sentido de que pressionem as linhas de ônibus a modificarem a forma de seleção de motoristas urbanos, exigindo maior qualificação, competência e comportamento educado e respeitoso para com os passageiros.
                 Não desconhecemos que existam motoristas sérios e responsáveis. Contudo, estes são raros, constituem uma minoria. Ora, o passageiro não pode contar com somente uma minoria de bons motoristas. Precisamos de uma maioria de motoristas de bom nível profissional e pessoas de caráter. E isso só conseguiremos quando as empresas de transportes de massa também pensem no bem-estar do passageiro, na integridade física das pessoas. Também há um componente a ser considerado nesta mudança de perfil de motorista: os salários deles devem ser melhorados afim de que sejam estimulados a trabalhar em condições saudáveis ao seu desempenho, de alta utilidade social.
              Talvez, o Rio de Janeiro seja a cidade brasileira em que o desempenho dos motoristas seja o mais deplorável em muitos aspectos: 1) Não respeitam o aceno que os passageiros fazem para entrar no veículo em pontos obrigatórios de parada; 2) Não têm consideração com as pessoas idosas que embarcam com os seus cartões de gratuidade; 3) Dirigem em alta velocidade, fazem desnecessárias freadas bruscas podendo causar acidentes dentro do próprio veículo; 3) Dão partida imediata e apressada ao veículo ainda quando o passageiro está subindo os degraus da porta de entrada, valendo o mesmo nas saídas do passageiro.4) Não respondem ao passageiro que lhes dá um “bom dia”, “boa tarde” ou “boa noite.” Ora, o motorista devia estar consciente de que o seu emprego depende dos passageiros que usam o coletivo. 
            Há ainda outros aspectos do problema e estes são da alçada da Secretaria de Transportes do Estado do Rio de Janeiro. A ela compete fiscalizar continuamente e com rigor a qualidade de transporte de ônibus circulando na cidade. Condições do estado do veículo, idade do ônibus, manutenção da frota, pneus, freios, obrigatoriedade de tacógrafos (espécie de “caixa-preta” do veículo), de GPS, câmeras, e de outros recursos tecnológicos que fornecem preciosos dados sobre o veículo.
          O serviço de reclamações de passageiros à autoridade pública ou privada não pode ser uma letra morta, mas deve ser efetivo, produzir melhorias, punir motoristas que põem a via do passageiro em risco. Ou seja, a fiscalização deve ser para valer e ao passageiro reclamante individual ou, ou se forem muitos, coletivamente, se deve dar satisfação do que se fez em relação às reclamações. Isso poderia ser feito de forma escrita ao reclamante ou reclamantes. 
         Outras instâncias públicas ou privadas que poderiam dar sua contribuição inestimável seriam, por exemplo, a Polícia de Trânsito, o Ministério Público, a OAB, a Secretaria Municipal de Transportes e, por último, o Ministério dos Transportes.
          Espero que as autoridades citadas assumam a  sua responsabilidade de cargos públicos  ou  dêem sua contribuição com vistas a sanar um dos males crônicos que há tempos está pondo em constante risco as vidas das pessoas que dependem, para seu deslocamento diário, de andar de ônibus. A omissão das autoridades responsáveis pelo transporte de ônibus sinalizaria um comportamento de cumplicidade com o estado lamentável em que se encontram os passageiros que precisam usar ônibus na cidade.. Enfim, a intenção deste artigo é cobrar providências urgentes e concretas no serviço de transporte de ônibus do Rio de Janeiro.