A poética da cadência
Por Bráulio Tavares Em: 26/08/2011, às 11H54
[Bráulio Tavares]
(Edward Thomas e Robert Frost)
Um artigo de Matthew Hollis em The Guardiancomenta a amizade literária entre o norte-americano Robert Frost e o galês Edward Thomas, iniciada em 1912, quando Thomas, então um crítico literário influente em Londres, comentou com entusiasmo um livro (North of Boston) daquele poeta desconhecido, recém-chegado dos EUA. Os dois tornaram-se amigos e se corresponderam até a morte de Thomas na I Guerra Mundial, em 1917. Nunca li nada de Thomas (que depois da amizade com Frost tornou-se também poeta), mas esse livro tem dois dos poemas mais conhecidos de Frost: “The Road not Taken”, que fala das opções que temos de fazer constantemente ao longo da vida, e “Mending the wall”, em que dois vizinhos, meio cabreiros, trabalham juntos para refazer um muro de pedras que separa as duas propriedades. Frost é um desses poetas sem muitas firulas, com uma linguagem simples, concentrada, que pode ser apreciada por um leitor estrangeiro (a maioria dos poetas em inglês eu não entendo nem com dicionário no colo).
Um parágrafo de Hollis (que é autor também de uma biografia de Thomas, Now all roads lead to France, 2011) merece atenção por exprimir uma idéia de poesia que nem sempre é bem compreendida. Diz ele: “Para esses dois homens [Frost e Thomas], a máquina que move a poesia não é a rima nem sequer a forma, mas o ritmo, e o órgão pelo qual ela se comunica é o ouvido que escuta, mais do que o olho que lê. Para Thomas e Frost isso acarretava uma fidelidade mais à frase do que à contagem métrica, aos ritmos da fala mais do que às convenções poéticas; uma fidelidade àquilo que Frost chamava de ‘cadência’. Se você já ouviu pessoas conversando por trás de portas fechadas, raciocinava Frost, você já deve ter reparado que é possível entender o sentido geral de uma conversação mesmo quando as palavras propriamente ditas são indistintas. Isto é porque as entonações e as sentenças com que falamos estão carregadas de sentido, formando um ‘significado sonoro’. É sobre esse significado, desencadeado pelo ritmo da voz que fala, que a poesia se comunica de maneira mais profunda. Thomas escreveu certa vez: ‘Um homem não pode escrever melhor do que ele fala quando alguma coisa o emocionou profundamente’”.
Acho que tudo isto deve ser considerado a sério quando falamos que a poesia tem influência oral, da fala, etc. Muita gente pensa que isto indica apenas que a poesia deve ser sempre coloquial, informal, descontraída, parecida com o modo desconexo e descuidado como falamos. Não é bem isso. A poesia deve se aproximar da fala em todos os registros da fala, em todas as maneiras com que somos capazes de imprimir à fala (entre outras coisas) gravidade, tensão, emotividade, arrebatamento. Como se tivéssemos um telefonema de quinze segundos para comunicar algo muito importante a alguém, mas em compensação pudéssemos preparar o que dizer nesses 15 segundos durante o tempo que fosse necessário.