A notícia
Por Cunha e Silva Filho Em: 03/05/2011, às 16H12
Cunha e Silva Filho
Não sabia o que exatamente era. Porém, intuía ser uma notícia que definitivamente iria mudar minha vida, me dar sossego, paz. Aquela paz de que qualquer vivente precisa pra viver sem sobressaltos, a salvo das muitas intempéries da existência. Paz que, na realidade, é difícil de conquistar ou de chegar a mim.
Essa notícia espero hoje, amanhã, depois, todo dia, há anos, no passado, ou mesmo num futuro não tão distante, porquanto, então, viria muito tarde, bem sei.. Com isso não poderia desfrutar, vivê-la na plenitude do que ela seguramente me poderia trazer. Essa notícia não deixa de ser egoística. Só a mim diria respeito e apenas a mim me tornaria feliz, felicíssimo, “felizérrimo” consoante dizem algumas mulheres burguesas, ou outros gêneros conhecidos, no calor dos exageros. Viria tal notícia pelos Correios? Via SEDEX? Pelo jornal? Pelo email? Pela TV? Pelas redes sociais conhecidas? Não sei, mas seria , sim, uma notícia que me poria em estado de sublimidade, de euforia.
De qualquer forma, de que se constituiria a notícia de que lhes falo agora com tanta insistência?Tenho certeza de que não seria um bilhete acumulado da loteria, que me deixaria milionário. Seria notícia da saúde completa e sonhada que todos gostariam de gozar, resolvendo de vez com todas as nossas aflições físicas? Pressuponho que não. A saúde vale mais do que ela – essa famigerada notícia de que lhes estou falando. Certeza disso tenho. Mas, pra ser bem franco (frase feita trazida à minha fraca memória por um diálogo de um livro de Harold Howard Binns, um professor britânico que, durante algum tempo, no passado, deu aulas de inglês em São Paulo e também através do serviço de radiofonia paulista). Não sei por que as palavras originais e mais artísticas me faltam ao enunciado justamente agora que deveriam ter essa característica distintiva.
Contudo, mais do que questões de estilo, não me sai da cabeça o pensamento – colocado em suspenso – da notícia que sempre retarda para as calendas gregas..
Às vezes, me vem em múltiplas maneiras a ideia de que ela existe ou existirá. Melhor dizendo, a ideia da notícia será definitiva pra minha bem-aventurança cá no planeta Terra. Óbvio é que não será uma noticiazinha qualquer, mas uma big notícia de deixar o meu queixo caído de alegria e de crença em que um dia há de me chegar apanhando-me desprevenido mas alegrando o espírito desanimado.
Sei o quanto ela me angustia, me confrange a mente, me deprime, me exaspera. Sinto que, no fundo, ele existe como potência, não como ato . Entretanto, não há expectativa alguma de que surja hoje, agora, agorinha. Como ela existe in absentia, isso me consola só um pouco, uma vez que o seu conteúdo soa mais como uma caixa de Pandora. Toda vez que ouço essa palavra penso numa das obras do poeta Da Costa e Silva (1885-1950), a qual, por sinal, tem nome homônimo ao daquela mulher mitológica criada por Vulcano.
Todo dia, sem falta, aguardo a notícia. Ela teima em não vir, talvez porque guarde mais s segredos do que imagino que tenha sobre mim e sobre meus feitos ou malefeitos. A notícia torna-se, assim, obsessão, que carrego no meu imo. Tenho receio de que me deixe paranoico, com mania de vê-la me perseguindo pelo pensamento.
Não sei se foi uma criação minha num instante de explosão de que a notícia me daria a alegria das alegrias, o “abre-te, sésamo”, a realização plena, completa, total de que algo de sumamente feliz e bem-vindo viria me acontecer.
Se a notícia causaria alegria, a expectativa dela me causa dor constante, inexplicável, abstrata, impalpável. “No news, good news”, diz o adágio inglês que me leva a esta reflexão:” Não tenho por que permanecer em estado de angústia, pois a ausência de notícia, segundo aquele adágio, é que tudo vai bem, sem motivos pra sofrer por antecipação.”
A minha notícia é de natureza diferente, não se relaciona a alguém afastado que possa me dar aborrecimentos ou tristezas, nem mesmo a algo que tem a ver com outro ser humano. Não, a minha notícia, já acentuei, só a mim pertence, sobretudo porque ninguém pode partilhar do seu conteúdo, da sua realidade impalpável.
Muitas vezes, ela se aproxima de mim, mas não chega àquele “eu profundo” tão presente nos poetas simbolistas, num Cruz e Sousa (1861-1898), por exemplo. Se ela não chega a me tocar, a invadir o meu corpo e penetrar na minha alma, é porque se transmudou em certo objeto ou valor concreto. Sinto, no entanto, que um dia possa atingir essa fase. Ao atingir esta, não saberei se valeu a pena tanta demora e tanto incômodo e angustiante expectativa.