Baudelaire sobretudo, sobe, eleva-se para chegar ao centro de tudo, hegeliano, eleva-se para materializar-se, numa ascensão ao concreto, mergulho no coração do real da realidade, como no sistema de Hegel que faz a manifestação do saber concreto, que pretende ser a própria realidade que toma consciência de si mesma, quando a realidade torna-se sujeito de si mesma. A “experiência faz a consciência em seu apreender efetivo”. É a dialética que faz a logificação do concreto, a ascensão ao concreto, na ultrapassagem da fase anárquica para a conceituação lógica final. Lógica que não é do pensamento, mas lógica do movimento da realidade. Esta “ascenção” do abstrato ao concreto faz um movimento que atua no conceito da logificação da realidade, progredindo do entendimento à razão, e da razão que observa para a razão que opera e unifica. A poesia é a manifestação dessa logificação, dessa materialidade.
Elevação
Por sobre os pantanais, por sobre os descampados,
Por sobre o éter e o mar, por sobre o bosque e o monte,
E muito além do sol, muito além do horizonte,
Para além dos confins dos longes estrelados,
Meu espírito, vais, todos os céus te movem,
Como um bom nadador cais em delíquio na onda,
Sulcas alegremente a imensidão redonda,
Levado por volúpia indizível e jovem.
Bem longe deves voar destes miasmas tão baços;
Vai te purificar por um ar superior,
E bebe, como um puro e divino licor,
O claro fogo que enche os céus lúcidos e serenos!
Este cujo pensar, como a andorinha, muda
Para o céu da manhã num vôo ascensional,
- Que plana sobre a vida a entender afinal
A linguagem da flor e da matéria muda!
BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal. São Paulo: Círculo do Livro, 1995. Tradução, posfácios e notas de Jamil Almansur Haddad.