[Maria do Rosário Pedreira]

Todos os autores adoram ver os seus livros traduzidos noutras línguas e a circularem pelo mundo. A internacionalização chega a ser, de resto, chave para o sucesso no país em que os autores foram originalmente publicados, mais ainda se estivermos a falar de Portugal, onde, sei lá porquê, tendemos a dar sempre mais importância ao que se diz lá fora. Não sei se os romancistas portugueses acompanham a par e passo as traduções dos seus livros – imagino que não o possam fazer com certas línguas como o sérvio ou o japonês – mas tenho ideia de que o façam, pelo menos, com as línguas que conhecem; contudo, estou convencida de que nunca as acham tão «estrangeiras» como os poetas quando lêem as traduções dos seus poemas. Quando escrevo uma letra para um fado, por exemplo, faço-a com uma determinada música na cabeça, que não é obviamente a que ouvirei depois; e, mesmo que o resultado final (letra + música) seja francamente melhor do que o que estava na minha cabeça, há sempre uma espécie de desconforto inicial por causa dessa disparidade. Assim também, sempre que verifico traduções de poemas meus, a impressão é estranha, porque, ainda que tudo bata certo em termos do sentido, que não haja realmente nada a criticar, basta um verso mais comprido do que o original para fazer do poema outro poema completamente diferente. Porque a música também muda de língua para língua.