Não há nenhum fundo de verdade na expressão “alguém vive à frente de seu tempo”; também não se pode viver de passado. Vive-se, e é muito bom que isso aconteça, tão somente o momento presente. Pode-se relembrar, saudosa, alegre ou tristemente, instantes vividos ontem; pode-se, claro, até ficar feliz diante de certas lembranças; porém, não se revive o passado. Com o futuro, sequer se pode recordá-lo, haja vista ser ele, meramente, uma probabilidade, uma possibilidade, noção, uma expectativa; diferentemente, do passado que já ocorreu e do presente, que ocorre.
     As pessoas que buscam, verdadeiramente, a felicidade, vivem em tempo real, agora; porque, como afirmam tanto os teóricos ou iluminados, quanto aqueles que viveram esse estado de beatitude, a felicidade é um sentimento intermitente e, por vezes, imiscível, do ponto de vista quantitativo; conquanto ninguém se engane quando está diante de um momento feliz. Contudo, não é incomum, tempos depois de nos ter acontecido algo que, à época, não soubemos precisar se fora tão bom ou melhor do que várias sensações ou experiências com que, simultaneamente, convivemos; tardiamente, reavaliarmos e externarmos, então sim, com certeza, ter sido aquilo um evento bem mais interessante do que as outras experiências.
     O tempo não nos engana, nem nos martiriza, apesar de, não raro, deixar em nós marcas que se assemelham a estigmas, às quais, depois cura, restando, no máximo, cicatrizes pouco importantes. Não são as rugas castigo que o tempo nos impinge por tentarmos vencê-lo; não nos vence o tempo porque não somos adversários num campo de batalha; nada é mais pacífico e resoluto que ele. Não é ato dos mais honestos afirmar que determinado malefício ou benefício veio com o tempo, ou que foi este que facilitou sua chegada. Ele não é o criador do mal ou do bem, não participa de sua logística, tampouco, é responsável por seu transporte.
     Meu tempo é diferente do seu, ainda que vivamos ao mesmo tempo, e não porque eu seja jovem e você não, ou vice-versa, mas por sermos, todos e cada um, universos com arcabouços físicos e existenciais diferenciados e específicos.
     Ninguém viveria por mim, envelheceria por mim, seria feliz por mim, como eu, mesmo que se lhe fosse dado passar pelo que passei, viver o que vivo e da forma como vivo.
     O tempo é uma dimensão muito previsível, que escorre na lentidão ou com a pressa percebida por cada um. Sua imutabilidade reside no fato de que ele não repousa, não cansa nem descansa, segue seu curso, ininterruptamente, a despeito de nossa vontade.
     A juventude, a maturidade e a velhice não são pontos de encontro que marcamos com o tempo - que desenvolve uma trajetória linear - nas curvas de nossa vida, que, por sua vez, corre em círculo, com imutáveis paradas ou fases – nascer, viver, crescer e morrer –, ainda que muitos não consigam percorrê-las todas. Por conta desse viés geométrico, é que em qualquer estação de nossa existência, podemos nos afastar do tempo ou o perder, para sempre, de vista.
     Só uma força, que se confunde com a própria natureza, tem poder capaz de fazer curvas no tempo: o Criador.
     É fato que não temos direito de exigir que o Todo-Poderoso faça isso, mas, certamente, não é pretensão descabida pedir-Lhe que encurve o tempo de modo que este conflua, longa e demoradamente, com as curvas da vida daqueles a quem amamos ou queremos bem. Fique à vontade, Senhor!
                                Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal e colaborador ([email protected])