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A invenção da santa

Rogel Samuel

A leitura do excelente livro de Almir Diniz, “O pitoresco e o hilariante na imprensa” (São Paulo, Scortecci, 1997) me trouxe a lembrança de um caso ou lenda que se contava há muito tempo de famoso repórter amazonense que inventou uma santa.
Ele estava precisando de um furo para assegurar o seu lugar no jornal e por isso resolver inventar uma notícia espetacular: foi a um subúrbio de Manaus, encontrou uma velhinha pobre que morava sozinha num casebre, deu-lhe um dinheirinho e lhe disse:
- Minha senhora, a senhora diz que viu uma santa!
- Que santa?
- Uma santa sobre aquela árvore no quintal...
- Mas eu não vi nada!
- Mas diga que viu, diga que viu, para quem aparecer por aqui a senhora tem de dizer que viu, e juro que vou ajudar a senhora.
- Mas...
- Combinado?
- Está bem, está bem, disse a inocente e boa velhinha, que ganhou mais umas moedinhas.
No dia seguinte apareceu a manchete: “Santa misteriosa aparece e cura velhinha”. E a matéria se estendia numa intrigante aparição luminosa de uma dama vestida de branco.
O pior veio depois.
Imediatamente após a notícia começou a aparecer muita gente na casa da velha, com doentes trazidos de longe, aleijados de muleta, cegos, crianças, maridos traídos, meninas em busca de noivos, desempregados em busca de emprego, vendedores ambulantes... enfim um espetáculo alimentado diariamente pelo jornal.
Mas a polícia foi acionada, outros jornais apareceram e a coisa ficou feia e perigosa.
Não adiantou o repórter desmentir dizendo que foi uma brincadeira.
Pois pessoas chegavam ao local e gritavam e desmaiavam, choravam e caíam de joelhos no chão, pois clamavam que estavam vendo, estavam vendo...
E a “santa” começou realmente a ser vista por sobre a árvore e a fazer milagres.
Por pouco o repórter não perdeu o emprego.
Talvez tenha sido por um milagre da santa.