SESSÃO  NOSTALGIA

A ideia de um  Monumento ao poeta piauiense Da Costa e Silva e outra questão (artigo  revisto e melhorado)

                                                               

                                                   À memória de Herculano  Moraes

                                                        

Cunha e Silva Filho

          De dois temas tratarei neste artigo: a construção em Amarante  de um monumento ao mais ilustre  poeta  piauiense, Antonio Francisco da Costa e Silva, ou designando-o pelo nome  que o  consagrou nacionalmente,   Da Costa e Silva (1885-1950). O segundo tema diz respeito à pouca  difusão de  autores piauienses em todas as suas modalidades   de escrita literária.

      Consideremos o primeiro.  Todo país que  se preza procura  preservar a memória  oral e escrita  de suas figuras mais  ilustres.A isso se chama de tradição dos valores da terra natal, seja de um estado,  seja de uma cidade, seja finalmente de um pais. Portugal,  Inglaterra,  França, por exemplo,  são  países  que  cultivam  e reverenciam seus homens mais eminentes, notadamente no  campo  cultural. O Brasil não deveria  ficar à margem   dessa demonstração de  tributo aos que  elevaram  o nome  de seus países   ao  conhecimento  do mundo  inteiro. É uma  forma  de eternizar no imaginário  dos povos,  através da construção de monumentos  ou mausoléus,  artistas,  homens da ciência, da História e das artes.

        No sentido que  imprimo  a essa  posição  favorável  ao culto da memória dos grandes homens  estou  afastando   qualquer  sinal  típico do culto à personalidade    muito ao feitio  de países  que  viveram ou vivem em regimes   autoritários.

         O Rio de Janeiro, por exemplo, é, de alguma maneira,  uma cidade que   presta   vassalagem às imagens,  esculpidas  em mármore,  de  grandes nomes  de nossa vida  cultural e por esse  aspecto a cidade  ganha  foros  de  civilização e se  faz modelo    por ter erigido   monumentos,  hermas   de diversas  personalidades   da vida cultural  brasileira,  não descurando  a de  celebrados  nomes  locais   nas artes,  não só  populares  como  também  do mundo  erudito.   Esse equilíbrio  entre a cultura  popular  e a cultura  erudita torna a cidade ainda mais encantadora  aos visitantes nacionais ou estrangeiros, além  de tornar seus monumentos, estátuas e mausoléus relevantes   dados históricos  sobre a cidade  e o país.

      Outras capitais e cidades brasileiras deveriam seguir modelos  semelhantes, sem exageros, é claro. Só a tradição  autêntica e imparcial   sabe  melhor selecionar quem deva ser digno de figurar  como  monumentos  ou  esculturas  de seus grandes  homens  nos diversos   campos  do conhecimento  humano.

O escritor  Elmar Carvalho, conhecido poeta  piauiense e  detentor de   várias honrarias   locais e nacionais, cronista, contista,  ensaísta e crítico literário,  nascido em Campo Maior,  há muito tempo,  e por diversas vezes,  manifestou a  ideia de,  primeiro,  conseguir  trasladar os restos mortais  do “Poeta   da Saudade,’ que se encontram em cemitério do Rio de Janeiro, Na sepultura costando apenas isso: da Costa e Silva. Nem mesmo sei se há um inscrição informando  a data de nascimento e a de falecimento. Nunca estive no local,   isso me foi  relatado  pela filha do  grande  bardo:   Alice.

 Elmar Carvalho se fundamentava no fato de que, no segundo  terceto do soneto “Amarante,” poema que, na segunda  obra do autor, Zodíaco (1917), compõe o conjunto de 5 sonetos sob o título geral de “Minha Terra,”  alusivo a aspectos de  natureza explicitamente  autobiográfica.  

Nesse segundo terceto, o vate de Sangue (1908) expressou  a vontade de ser  sepultado  no seu  berço  natal, Amarante: “Terra para se amar com o grande amor que eu tenho!?Terra onde tive o berço e de onde espero ainda/Sete palmos de gleba e os dois baços de um lenho!”

Ora,  Elmar, como  poeta  e amante  de Amarante, a par de ser admirador  e  entusiasta leitor  de Da Costa e Silva, razões de sobra tinha  para querer ver  realizado  o desejo  do poeta, desejo  este com o qual  igualmente  comunga   tanto  quanto qualquer outro  piauiense.

Não sendo  concretizado  o desejo  do poeta no que tange aos seus restos mortais,  Elmar agora, em novo  combate,  se empenha em  conseguir, com  o apoio irrestrito de outros intelectuais piauienses,  como   Virgílio Queiroz, Deusval Lacerda,  Evaldo  Madeira, assim  como já recebeu  o sinal verde  do prefeito e o vice-prefeito de Amarante, respectivamente,  Luís Neto e Clemílton Queiroz,  para erguer um Monumento à memória  de Da Costa e Silva(1885-1950).

 O autor deste artigo recentemente se pronunciou, em comentário  postado  no Blog do Elmar Carvalho,  favorável a  esse projeto e se alia,  destarte,  a todos os leitores do vate  amarantino, cuja obra  ainda  se presta, dadas as virtualidades múltiplas de sua  linguagem e temática, a  um amplo  campo de investigação  interpretativo, o que vem sendo confirmado  por trabalhos  publicados nos últimos anos  enfocando  aspectos diversos  da sua poética. São ensaios de autores mais jovens que, na poética  dacostiana, veem importância  e perenidade,  utilizando-se  de abordagens atualizadas, sobretudo  advindas  do meio universitário  piauiense.

O segundo tema  deste artigo  tem  o objetivo  de  acentuar  a relevância  dos estudos  de autores  piauienses em todos os gêneros  literários e ao mesmo tempo  pretende chamar  a atenção    dos órgãos púbicos  do Piauí  responsáveis pelos setores da educação e cultura  no sentido de que  façam valer  a obrigatoriedade, resultante  de lei aprovada e regulamentada,  do ensino  de literatura  de autores piauienses na grade curricular  do  ensino  fundamental e médio público e particular, conforme preceitua a Constituição Estadual de 1989, no seu Art. 226, parágrafo único. Por outro lado,   esse limite de nível de obrigatoriedade  bem poderia  se estender ao ensino superior do Piauí se dependesse do interesse e boa  vontade  dos professores de literatura brasileira.

 Serve de exemplo e exemplo a ser imitado o que se faz   no estado do Paraná, no qual se estuda a literatura  paranaense nas universidades.   Tudo dependeria  da visão  mais arejada e sem preconceitos  da parte  dos  docentes   universitários. Bastaria que eles oferecessem  cursos   com ementas   referentes  a estudos  e pesquisas de  autores   e temas  da literatura  piauiense. Nada mais notável  da parte  das autoridades educacionais e universitárias   do    que vontade  própria. Lembre-se de que a literatura brasileira  inclui, no seu  sistema literário,  para usar um conceito caro a Antonio Candido, a produção  ficcional,  poética e de outros  gêneros. Por conseguinte, não há como separar a unidade e a diversidade do pensamento  literário nacional.

Quero ressaltar  que  tal  reivindicação não se pauta por mero  bairrismo ou provincianismo locais, mas  sim  pela necessidade e conveniência de que os estudantes piauienses  tomem  pleno  conhecimento  do bom e  por vezes excelente nível  de qualidade   da sua  literatura.   

Para isso,  contamos  já com  obras de referência  de histórias literárias, de quadros  críticos e ensaísticos,  tanto  na universidade quanto  fora dela, de  editoras  locais  com capacidade técnica de publicar  livros  bem impresso, de uma vida  literária  em efervescência  e  desejosa  de  alcançar  voos mais altos. O terreno foi fecundado, a colheita está sendo  feita. Resta  disseminá-la e fruí-la.

Não é possível que  os professores  do Piauí, tanto no ensino médio quanto no  superior, ainda   hesitem na indicação  de autores  piauienses que merecem ser estudados, analisados e oferecendo imensas  possibilidades  para constituir  ementas  nos cursos de letras das universidade piauienses.

Sonegar  a existência  desses autores e só  dando  peso   aos chamados  autores  que atingiram  um nome nacional da tradição e outros, os mais novos, os novíssimos,  que estão se firmando  nacionalmente, se me afigura   um erro  palmar  de visão  pedagógica  e de ausência de espírito  universal e progressista.

O que não pode  continuar  é essa  forma  de  apagamento  ou sequestro de grande parte   dos autores piauienses  locais, com exceção de um grupo de happy few,   tais como  Assis Brasil, Mario Faustino,  H. Dobal, Torquato Neto, O. G.Rego de Carvalho, e muito  poucos outros  com   alguma visibilidade.

Já afirmei  alhures que a literatura  piauiense não termina naquele  pequeno   grupo. Cabe aos professores do ensino médio e superior,  esquecer  um certo complexo de inferioridade provinciana e abrir as comportas da riqueza de autores piauienses, do passado e da contemporaneidade, mostrando aos jovens leitores  que  esses “ilustres desconhecidos” têm muito a  propiciar  aos professores  e alunos com  uma produção  literária merecedora  de ser urgentemente   adotada, estudada, pesquisada tanto  quanto  os chamados  autores “nacionais e  universais. É óbvio que  já tenham  sido concretizadas  projetos  neste sentido  com autores  piauienses, mas,  no conjunto maior de escritores mortos  e vivos  há muito  ainda a explorar   quer em dissertações quer em teses, quer em  cursos latu sensu, de especialização  ou  atualização.

A literatura piauiense está aí, viva, atuante, com novos autores lançando obras, só  esperando  ser divulgados   e  prestigiados  pelos próprios  piauienses. È tempo de realização de seminários, debates, congressos,  simpósios, mesas-redondas que venham  tirar  do exílio   uma boa quantidade de autores  dignos  de serem valorizados e consagrados pelo  público piauiense,  jovem, adulto,  idoso, estudantes, professores  de todos  os níveis de  ensino, enfim,  leitores, críticos, ensaístas e cidadãos  piauienses amantes  da leitura  e da literatura mafrense.

 No dia-a-dia do piauiense  esses autores são vistos na rua e em outros lugares. Merecem a sua atenção e o seu respeito. Merecem, sobretudo,  serem lidos.