A decadência das novelas
Por Bráulio Tavares Em: 06/05/2011, às 17H16
[Bráulio Tavares]
Eu tenho uma relação ambivalente com as telenovelas. Por um lado, divirto-me muito em criticá-las. Desde a adolescência me acostumei a agir assim porque se pressupunha que um intelectual de verdade deveria ridicularizar as novelas. Depois que me tornei um intelectual de verdade (OK, há controvérsias), descobri que as novelas são em essência algo muito parecido com duas coisas que eu gostava: os folhetins do século 19 e a pulp fiction dos anos 1930. E surgiu daí o outro lado. Continuo a criticar as novelas, hoje, mas não mais porque considere o gênero um fenômeno imbecilizador das massas. Nada disso. Critico-as porque passei a achar que uma telenovela é um gênero cheíssimo de possibilidades criativas, mas que tem sido consistentemente mal aproveitado – por falta de inteligência e de talento, às vezes; outras vezes, por falta de ousadia e de coragem para fazer algo de novo e de diferente.
Sempre que me pedem exemplos de uma novela boa, dou logo três: Roque Santeiro de Dias Gomes e Aguinaldo Silva, Vale tudo de Gilberto Braga e Renascer de Benedito Rui Barbosa. Muito diferentes entre si, cada uma dela possivelmente com alguns problemas de narrativa, de elenco, sei lá; mas cada uma delas mostrou que dentro das óbvias limitações do gênero é possível fazer coisas boas. Para não dizerem que só elogio as antigas, eu diria que A Favorita de João Emanuel Carneiro provavelmente foi tão boa quanto estas. Só não o afirmo pra valer porque não a acompanhei, mas vi numerosos capítulos salteados, e achei originais a idéia e a execução.
Li há pouco uma entrevista de Lauro César Muniz à Revista E, do SESC de São Paulo (abril 2011, número 10). Lauro César é o autor de clássicos da novela como O Casarão, Espelho Mágico, O Salvador da Pátria, e de minisséries como Chiquinha Gonzaga e Aquarela do Brasil. É, portanto, alguém de dentro do mundo das novelas, alguém sem preconceito com o gênero. Não é um intelectual que esnoba a TV, longe disso. Pois vejam o que LCM tem a dizer sobre o estado atual da telenovela.
“[A perda de qualidade da dramaturgia ocorreu] no momento da queda do muro de Berlim, com o fracasso total do socialismo. Quando esses fatos históricos ocorreram, em 1989, a sociedade tinha a ilusão, com o início da globalização, de que não haveria mais conflitos entre os países. Com a abertura política no Brasil, nós, que fazíamos uma dramaturgia política, passamos a ser mal vistos. Estava em voga a crônica da felicidade. A telenovela tornou-se pouco crítica aos costumes sociais. Hoje, encontro uma juventude que nega a história política do país. Estão preocupados apenas com o presente. Não os condeno, pois nasceram sob outra ótica”.
É irônico perceber que as novelas que ridicularizávamos nos anos 1970, feitas durante a ditadura, são imensamente mais politizadas e mais questionadoras do que as de hoje, na época da liberdade. Liberdade pra quê, cara pálida?