A Civilização do Couro segundo Monteiro Lobato e Cândido Fontoura
        Dezembro 23, 1942     

        Meu caro Castelo Branco,

        Recebi seu livro A CIVILIZAÇÃO DO COURO e li-o com o maior encanto e interesse; mas como não sou cultor da literatura, duvidei do meu julgamento e pedi ao meu grande amigo Monteiro Lobato que lesse o seu livro e me desse opinião. E ao recebê-la fiquei muito contente comigo mesmo, porque coincidiu com a minha. Diz Lobato no bilhete que me mandou: “Esse livrinho surpreendeu-me. Peguei-o apenas para apalpar e cheirar (que é o mais que podemos fazer com a maioria dos livros que aparecem) – e quando dei acordo estava no fim. E você tenha paciência: o livrinho vai ficar aqui comigo! Ele não quer voltar. Sente-se bem numa estante onde só tenho coisas com grau 10. Está tão bem equilibrado o livro, tão limpo das clássicas imbecilidades patrióticas, que não tenho medo de confessar minha opinião: Se todos os estados do Brasil tivessem uma monografia sintética da altura dessa, o Brasil, como um todo, seria talvez a zona do mundo mais bem fotografada. E por que esse Castelo Branco não tenta isso – fazer ele mesmo as sínteses parciais (os estados todos) para que tenhamos um retrato total que não existe? E não existe por que a imbecilidade patriótica ou regional falseia traços e tons, esquecida de que o grande, o imenso valor de tudo é a verdade. E quanto ao estilo, estou certo de que o velho Camilo não desadoraria esse outro Castelo Branco. R. P. escreve com a maior perfeição. No livro inteiro, não tropecei num só deslize – e isso é fenômeno...”
        Eis, meu caro amigo, o que reservadamente Monteiro Lobato pensa de seu livro e do novo Castelo Branco. Como mestre que é na arte da expressão do pensamento, ele disse do seu livrinho exatamente o que eu senti, mas não saberia dizer. As responsabilidades pelo nome que carrega estão, pois, perfeitamente atendidas.

        Do sempre seu

         Cândido Fontoura