[Maria do Rosário Pedreira]

Faço parte daquela parcela de portugueses que trabalha em empresas que fecham umas semanas em Agosto. Parti, por isso, para o Sul no princípio do mês à cata de sol mas, como levei com a chuva à chegada tal porta na cara, nos primeiros dias sobrou-me apenas o consolo da leitura enquanto ouvia uma assanhadíssima trovoada. Comecei por Raduan Nassar, o grande escritor brasileiro nascido em 1935, que pouco escreveu – mas bem – e que, depois de um romance, uma novela e uns contos, resolveu retirar-se da vida intelectual e ir cuidar de uma chácara para desgosto dos seus leitores. Em apenas um par de horas – que a novela é mais uma noveleta – tinha matado a sede com Um Copo de Cólera, uma fantástica peça literária sobre um casal apaixonado e desavindo: ela jornalista, jovem e algo progressista, ele mais avançado nos anos, convencional e bruto – mas o amor tem destas coisas, e o sexo pode ser tão perfeito entre dois seres humanos que a ira, por mais medonha, pelos vistos às vezes não chega para apagar o desejo e as boas recordações. Este é um livro sobre a sedução, a manha, o confronto, a fragilidade do forte e do fraco no meio de uma discussão muito feia descrita de forma muito bela. Traduzido em várias línguas, este livrinho tão pequeno já deu filme, não imagino de que tamanho. Mas a minha alegria ao lê-lo foi imensa.