A ARTE DA FUGA

ROGEL SAMUEL
 
"Vida louca vida, vida breve, já que eu não posso te levar, quero que você me leve" diz Cazuza. A citação é de minha amiga. "Velho e cego, Bach resolveu resumir a "poética" de sua música, e compôs "A Arte da Fuga" (que contém o seu nome: si bemol, lá, dó, si - ou b-a-c-h), que só veio a ser conhecida um século depois. Isso leio em Carpeaux. "Mas A Arte da Fuga ficou incompleta. A última fuga não acaba; continua a rolar, sem fim..." Isso me ocorre depois de ter recebido o seguinte e-mail do meu amigo R. A. E nem é preciso dizer que a comparação é insuportável:

"Caro R., O que é diferente em sua crônica é que ela se vai encadeando a partir de referências, sem fixar-se no tema inicialmente proposto.  Você segue o fluxo labiríntico e associativo do pensamento, um pensamento erudito, sem dúvida.  Agora, com sua alusão a Carpeaux, fica bem claro que se trata de uma opção plenamente consciente, a eleição de um discurso fragmentado, em lugar do retórico.  Porém, um fragmentado que segue uma certa linha, não se tratando, absolutamente, de puro delírio.  É mais como um jogo, uma tessitura que poderia seguir ao infinito, no puro prazer de rememorar e aludir leituras, audições & vivências.  É bom, acho interessante o estilo que você vem desenvolvendo. Abcs." A fuga poeticamente significa: "Vida louca vida, vida breve, já que eu não posso te levar, quero que você me leve" . Em resposta: "Caríssimo, muito obrigado por seus emails e suas palavras generosas demais para o meu pouco talento. Você deve ser um crítico literário perspicaz, pois acertou na "técnica" que costumo usar nas minhas pobres crônicas, é exatamente o que você "viu", vou por associações etc e geralmente quase não sei sobre o quê vou escrever e vou tecendo aquilo num encadeamento, só que no fim tento dar uma unidade ao todo. Depois de escrita, a crônica passa por inúmeras revisões, principalmente elimino todas as palavras que posso eliminar, corto tudo que posso cortar e examino cada  palavra pra ver se vai bem. Dura alguns dias o trabalho, mas gosto, é um prazer. Outra coisa, procuro "segurar" o leitor pela técnica das "mil e uma noites". Tenho tido bons leitores, como você, e o meu trabalho não tem sido em vão, pois agradei a uns poucos porém notáveis leitores. Muito obrigado outra vez, e até a próxima crônica.