Hoje apresento a vocês a bela e sensível colaboração de Izabel Liviski, nossa consultora da revista, em textos e fabulosas fotos.
Ana Maria Dietrich escreve às quartas-feiras no ContemporARTES.
NEDERLAND,
RIMA COM FANTASIA.
ESSA,
A MINHA LICENÇA
POÉTICA.
Conhecer a Holanda sempre despertou em mim um grande interesse e curiosidade. As referências eram muitas: amigos holandeses, a influência que no período colonial os holandeses exerceram sobre o Nordeste do Brasil, as realizações fantásticas de Maurício de Nassau sempre me encantaram. As obras de seus pintores famosos como Vermeer, Rembrandt, Van Gogh e Mondrian também marcaram para sempre em minha memória as aulas de História da Arte. Acompanhava com interesse reportagens sobre a evolução de sua engenharia na luta constante com as águas, sua cultura ao mesmo tempo arrojada e de preservação de valores.
Não é à toa que no brasão do país estão inscritas as palavras: "Je maintiendrai", um teimoso "eu perseverarei", característico de um povo de mentalidade liberal mas também ligado à sua história e tradição.
Em Amsterdã, a maior cidade planejada do norte da Europa, a beleza convive tranquilamente com o mundo marginal. Os dois lados dessa dupla personalidade estão imbricados, derivando de uma longa tradição de tolerância religiosa filosófica e política.
Quando cheguei ao Aeroporto de Schipol em Amsterdã em um outubro frio e chuvoso, e assim permaneceu quase todo o tempo de minha estada, no início do outono europeu. Despida de idéias preconcebidas do que fotografar, fui andando ao acaso pelas ruas e fotografando cenas comuns, retalhos do cotidiano. Lembrando Walter Benjamin, como uma flanêur eu caminhava pelas ruas de Amsterdã e Rotterdã...
Sabia no entanto, o que eu não queria: fotos convencionais no estilo de revistas de turismo, paisagens e arquitetura deslumbrantes. Queria registrar o cotidiano das pessoas, aprisionar com minha câmera um pouco da alma da cidade. Concentrei-me nas coisas que minha sensibilidade apontava, e aí surgiu a paixão pelas janelas das casas e escritórios e também das vitrines de lojas e vidraças de bares: amplas, decoradas com generosidade. Andando na chuva com minha recém-comprada sombrinha desenhada com folhas de “cannabis”, olhava para as casas através de suas janelas e tudo parecia aconchegante e intimista.
Tornou-se quase uma obsessão fotografar janelas: graciosas, às vezes com grades, extremamente criativas ou até mesmo quebradas, mas em sua grande maioria muito belas. E por extensão, comecei a fotografar toda superfície que espelhasse ou refletisse objetos e luzes: perseguindo poças de água da chuva, vidros de carros, trechos do canal de Singel e até mesmo bicicletas que lado a lado, pareciam uma imagem multiplicada em milhares. Ao fazer a edição do material fotográfico obtido nessa viagem, é que começo a refletir numa perspectiva sociológica, e a pensar na fotografia como uma expressão visual que tem implícito um alto “risco” de subjetividade já que trafega pelo campo da arte, e é tanto uma expressão do imaginário e da consciência social quanto um recurso da sociologia e da antropologia a fim de compreendê-los.
Ou seja, a fotografia contribui para desvendar aspectos do imaginário social e das mediações sociais, introduzindo alterações nos processos interativos, na pluralidade de sentidos que existem na perspectiva do fotógrafo, daquele que é fotografado, e do espectador da fotografia. Como um componente indissociável do funcionamento de uma sociedade que é intensamente visual e intensamente dependente da imagem, a fotografia pode ser tomada como uma representação social e memória do fragmentário, que é o modo de ser da sociedade contemporânea, na tensão entre o que oculta e o que revela.
O fotógrafo imagina, constrói a sua imagem fotográfica, aquilo que quer dizer através da fotografia através do instante fotográfico, da concentração das diferentes temporalidades em um único momento, o chamado tempo da fotografia. Assim, a documentação visual, especialmente a fotografia não pode ser tomada de forma ilusória como um documento socialmente realista e objetivo como ainda querem alguns, ela é muito mais um meio de compreensão imaginária da sociedade.
Assim como se pode falar em imaginação sociológica, pode-se também falar em imaginação fotográfica que nesse caso envolve todo um modo de produção de imagens, como a composição, a perspectiva, os recursos técnicos para escolher e definir a profundidade de campo, e principalmente aquilo que vai fazer parte e o que vai ser excluído do campo visual, enfim todo um modo de construir a fotografia.
Já se disse também que a fotografia é um documento do estranhamento do fotógrafo em relação àquilo que vê, assim sendo as fotografias de rua, que são o locus do meu ensaio, representam um duplo estranhamento, uma intensificação desse sentimento, já que as ruas são espaços nos quais a convivência entre estranhos é maior do que em qualquer outra parte de uma cidade. Como testemunho do encontro físico entre fotógrafo e fotografado no momento da tomada, e pelo estranhamento do fotógrafo em relação ao que vê.
Atrás das janelas que fotografei muitas vezes havia personagens curiosos: o cão dentro de um carro latindo furioso, as crianças em uma escola de arte, o velho acenando dentro do bar. Neste processo vai surgindo uma interação entre observador e observado, e o tema sociológico do ensaio fotográfico: descobrir quem estava por detrás das janelas, quem era o outro. Os vidros, embora transparentes, se interpunham e impediam uma completa comunicação.
Indo nesta direção, termino fotografando minha própria imagem refletida em uma vitrine de uma casa de jogos: nas máquinas vazias, luzes se multiplicavam, imagens se fundiam formando um caleidoscópio. Simbolicamente compreendo que na busca de conhecer o "outro", acabamos buscando respostas para nossas próprias questões essenciais, subjetivas. E as janelas para a Holanda que fotografei não são somente janelas no sentido material, parte concreta de uma arquitetura. Mas antes, representam perspectivas para um duplo conhecimento, para uma compreensão dessa dualidade tão cara às ciências sociais, o individual e o social.
Martins, José de Souza- Sociologia da Fotografia e da Imagem- Editora Contexto,
2008: S.Paulo.
Martins, José de Souza; Eckert, Cornelia; Novaes, Sylvia Caiuby (orgs.)- O
imaginário e poético nas Ciências Sociais- EDUSC, 2005: Bauru, SP.
Fabris, Annateresa; Kern, Maria Lúcia Bastos (orgs.)- Imagem e Conhecimento- EDUSP, 2006: São Paulo". (http://contemporartes-contemporaneos.blogspot.com/2009/09/holanda-em-fotos-textos-e-poesia.html)
"Terça-feira, 24 de novembro de 2009
Uniban: um erro não justifica o outro
por Simone Pedersen
A repercussão da possível expulsão da aluna por apresentar-se com um vestido curto tem dividido a sociedade. Diversos segmentos levantaram as bandeiras em apoio a ela. Sim, a reação dos alunos foi desproporcional, descabida e animalesca. Espero que sejam punidos de forma exemplar. Ela havia sido informada que se continuasse a vestir-se de forma provocativa seria convidada a deixar a faculdade. O que me intriga, contudo, é o motivo de ela escolher tal roupa, sabendo que subiria três rampas com rapazes em uma idade em que os hormônios saltam pelas orelhas. Um jeans por baixo seria facilmente vestido. Moça simples, talvez devesse aprender com Glória Kalil: para cada situação, há uma roupa adequada.
Policiais australianos e carteiros dinamarqueses trabalham de bermudas em dias quentes. Na Escandinávia, mulheres andam de bicicleta sem a blusa para se bronzear. No trabalho e na escola, ninguém veste-se de forma insinuante. No nosso país, criança usa roupa sexy e imita danças quase pornográficas. As famílias aplaudem! Desconhecem a diferença entre liberdade, e vulgaridade. Eu não gostaria de ser atendida por um médico ou médica sem camisa. Sou contra frequentar templos, igrejas, velórios ou hospitais com roupas sensuais. Talvez eu seja antiquada. Ou será que a apresentação não é importante quando da entrevista para um emprego? Um jeans rasgado em uma agência de propaganda ou um vestido transparente em show de moda não é desrespeito. Na “balada”, uma roupa justa ou decotada é comum. Num campo de futebol, uma mulher vestida com roupas curtas escuta comentários, mas não gera uma horda: é um local de lazer. Não se trata de ser mulher ou homem e sim de bom senso. Vi as fotos do começo do tumulto - que já desapareceram da internet - o vestido estava muito mais curto que nas fotos posteriores. Algo diferente ocorreu ali: alunas com poucas roupas não são novidades no Brasil. Toda ação causa uma reação. Será a ação a escolha da roupa ou a atitude de quem a vestia?
Existem códigos de vestimenta formais ou não. O funcionário sabe que se chegar ao escritório com roupas inapropriadas, será repreendido ou demitido. Para que não haja distrações do que realmente é importante: trabalhar. O mesmo se aplica aos locais de estudar, rezar, velar um ente querido, visitar um enfermo...
Vários grupos discutem que foi sexismo, preconceito ou involução. Nunca será justificável, ainda que a moça estivesse de biquíni. Nenhum cidadão tem o direito de fazer justiça com as próprias mãos, deve-se procurar a autoridade competente. A moral das pessoas não está nas roupas que vestem. O que não significa que alunos devam vestir-se como se a escola fosse um lugar qualquer. Houvesse maior interesse em estudar por parte dos alunos e alunas, nada disso teria acontecido.
Hoje em dia, meninas usam roupas que mostram o que não precisa, mulheres vestem-se como se tivessem 20 anos – e quilos – a menos. O bom senso perdeu-se na história da moda. Boa apresentação não é ostentação. O feminismo virou sinônimo de exibicionismo. Pessoas valorizam demais o físico. Talvez porque as almas foram esquecidas sob tantas máscaras sociais". (http://contemporartes-contemporaneos.blogspot.com/)
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Na entrevista que se pode ler no link a seguir indicado, Adorno explica, em entrevista à revista Der Spielgel, a razão de não ter aderido ao movimento estudantil de 1968 (tradução para o idioma português), "O acréscimo de objetos na vida pública não decorre necessariamente do grito", entrevista inserida no blog de Cesar Kiraly (8.4.2009):
http://cesarkiraly.opsblog.org/2009/04/08/o-acrescimo-de-objetos-na-vida-publica-nao-decorre-necessariamente-do-grito/
Theodor Adorno, no chão, ouve
(http://fomosaocinema.blogspot.com/2007/12/papai-noel-negativo.html)
Leia, de Paul Zumthor, A Holanda no tempo de Rembrandt.