Falando  de literatura,   sociedade,   política e de outros temas

            CUNHA E SILVA FILHO(1)    

   

         Gosto de conversar muito com  pessoas que me caem na simpatia. Não chego ao exagero altruísta da grande e maravilhosa poeta brasileira Cecília Meireles (1901-1964), que segredou uma vez, ou melhor na última  entrevista que  concedeu a alguém,  ser ela uma  apaixonada pelo  ser humano. Tão magnânima era sua afeição  às pessoas que chegava a afirmar  que  amava até pessoas que nunca tinha visto na vida! Que desprendimento da autora de Romanceiro da Inconfidência! (1953

          No tempo em que entrei para a universidade a fim de cursar   Letras,  Cecília Meireles foi  um do autores que constavam para  temas de seminário  e de trabalho  escrito de final  de semestre. A mim coube  analisar um poema  dela.  Foi aquele o primeiro contato  mais  profundo   que tive com  a poesia   de Cecília.

         Lembro-me de que fiz uma análise “apaixonada,” segundo  me  comentou,  por escrito, a minha  professora de teoria  literária,  Selma Sanders, na época uma jovem  e  bela  professora,  alta, elegante, de cabelos  louros, olhos claros  e de feições europeias. Era uma das  assistentes do  poeta, jornalista crítico, ensaísta, memorialista,  folclorista e professor de  teoria literária  (Faculdade  Nacional de Filosofia, Universidade do Brasil), Augusto Meyer (1902-1970).

      Meyer revezava com ela. Havia uma segunda assistente  que   lecionava  para uma segunda turma  de Letras  nas modalidades  diversas  oferecidas  pelo cursos de Letras. Essa segunda   assistente de Augusto Meyer era  uma   senhora também  bonita, ainda moça, de cabelos lisos e   escuros,  mais para morena clara.  

       Seu prenome era Albertina,  se não  incorro em erro, em relação ao prenome, que não está mais visível na  primeira folha cortada ao meio com   o passar do  tempo.  

       Era  no primeiro semestre de 1966, i.e.,  faz 57 anos que guardo  partes despedaçadas  da  primeira   página   das folhas  que  nos foram  distribuídas no primeiro dia  de aula de teoria  literária daquele ano. Esses velhuscos   pedaços da primeira página ainda guardo comigo nos arquivos particulares da minha   biblioteca.  O sobrenome se encontra impresso  e ainda  visível: Lupi. Ou seja: Albertina Lupi.

          Na primeira folha, aparecia o roteiro do curso acompanhado   de informações  e, nas folhas   seguintes,  a  continuação   de dados bibliográficos e  as datas dos  seminários  a  serem realizados. Com os dados  do  professor regente e dos nomes das assistentes seguidos  das datas do roteiro a ser seguido no semestre.  

          As demais folhas constavam ainda da bibliografia  básica a   e da bibliografia mais avançada  relacionada a livros  com  ensaios acerca de teoria literária. a segunda assistente ficou  com uma outra turma. Eram duas turmas grandes de várias modalidades  do  curso de Letras:  português-inglês,  o meu,  português-literatura,português-francês,português-latim, português-literatura  etc. 

          Ambas cuidavam  de complementar  as aulas  de teoria literária,  apresentar a bibliografia, aliás,   muito bem selecionada quanto às obras clássicas  e fundamentais para a época, ano de 1966. Essa disciplina, de forma autônoma,  não havia no curso  científico  ou clássico da Teresina do início dos anos 1960  como não há,  até  hoje, no segundo grau, ou ensino médio Ela se embute  nas disciplinas da língua portuguesa com a de  literatura, seus estilos  de época, sua noções de literatura, as funções da linguagem Jakobsoniana, o estudo de metrificação   de escolas literárias,osgênrs narrativos e, finalmente,os exercícios  propostos a partir  de um dado texto literário, ou não.   

         Sendo assim, não tinha  um preparo  teórico maior, mais sólido, quando iniciei o  primeiro semestre   de  teoria literária. No entanto, tinha bastante  leitura   já  feita em Teresina e já tinha cancha de escrever  artigos de cunho  literários, ou não.  

         Selma Anders,  já citada atrás,  ao me devolver o resultado   de um  trabalho  escrito sobre a poesia de Cecília Meireles, me  recomendou, por escrito,  em  nota, ao final do me trabalho, mais  ou menos  nestes nesses termos: “Francisco, o seu  trabalho  revela bastante  sensibilidade, porém lhe falta maior conhecimento teórico   exigido  para uma   breve interpretação  do  poema  que lhe foi  proposto. A sua análise carece de maior  amplitude de caráter e elementos formais ao embasamento  teórico   de sua análise.  A um bom entendedor meia palavra basta. Isso me serviu   de lição e me abriu novas  perspectivas  aos meus estudos literários.

         Por outro o lado, mesmo com esse “gap” inicial, lá em Teresina,  eu,, adolescente,   escrevia para jornais locais. Fazia traduções, escrevia artigos,  fazia resenhas de obras de  autores que me interessavam e analisava livros que me caíam   nas mãos. Me lembro de um conto  que escrevi tendo por  título “A inteligência precoce,”de um artigo com esse título bem sugestivo “O Infinito,” outro referia-se ao    “Dia do Estudante,” outro era um conto  meio fantástico que me inspirou  um relato  de um  amigo de minha geração. Outros mais sobre os movimentos literários,  estilos literários, como  um artigo que saiu em duas partes por ser mais longo e versava sobre o movimento literário simbolista.

         Tenho comigo um recorte somente  da segunda parte   publicado em 1963 em jornal de Teresina, entre  outros artigos. Penso que os alunos que me liam  gostavam  de meus  artigos  e uma jovem até me falou que os lia e que  eles iriam ajudá-la  muito   no exame vestibular. Fiquei esfuziante de alegria.

       Era uma época de muita leitura, principalmente de   romances em traduções. Lia poesia. Escrevia sobre  Coelho Neto, Cruz e Sousa, Humberto de Campos e outros autores. Escrevia e não deixava de ler tudo das obras didáticas do Walter Wey, excelente autordidático tanto  para literatura brasileira quanto para literatura  português parao curso colegial. Lia outro  e outros autores didáticos de língua e literatura brasileira e portuguesa, os quais me chegavam  ao conhecimento graças às editoras que  os  enviava para meu  pai.

         Fazia tentativas de escrever ficção, fazer um poema, escrever  um artigo em inglês, embora com  alguns erros sintáticos,  sobre a tradução de uma obra em inglês  de um  ilustre engenheiro  piauiense, O governo  do estado do Piaui fez um contrato com a professora  encarregada  de fazer a tradução para o  português. Seu nome era Cacilda, Ela fez at radução e não ganhou um tostão furado.

        Levei o meu artigo em inglês sobre a tradução da professora Cacilda, mas a redação do jornal  me dissera que não o podia publicar em inglês.. Só o aceitariam se eu o publicasse em português. Voltando   ao  quesito  de minha  formação  intelectual, e, na minha adolescência em Teresina, costumava ouvir atentamente histórias  contadas por amigos da minha idade e, a partir dos relatos ouvidos,  criava  um  conto  ou  coisa que  a mim  parecesse  ser um conto.

         Me parece que a professora  nunca viu a cor do dinheiro.  Ela lecionava, se não estou enganado,  na Escola Normal Antonino  Freire,   Até então, as questões políticas não me atraíam. A mudança temática  só ocorreria  tempos depois.

  Ainda não me achava atualizado  com   as leituras   e novas  concepções vieram  da divulgação das lições de Afrânio Coutinho trazidas de sua permanência   nos EUA,  onde  trabalhava  no Reader’s Diagest e ao memo  tempo  fazia cursos  importantes com o nomes  mas em evidência nos estudos literários, linguístcos e filosóficos, como  Roma Jakobson,  Jacques Maritain,  René Wellek e Austin Warren, entre  outros, O seu objetivo  principal   era implantar  um novo tipo de estudos literários renovador  no que tange à análise  da obra  literária sacudindo velhos e arraigados  modos subjetivos  de  lidar com  o  fenômeno literário  de viés   impressionista ou expressionista que dominava a crítica no  país. Por isso aqui encontrou  vozes dissonantes ao projeto  del.,  Até mesmo   teve que enfrentar   um dos mais  respeitados críticos ensaistas   Álvaro Lins(1912-1970) que domina  a  chamada   crítica de rodapé de importantes  jornais  do país. Com ele Afrânio Coutinho encetou  um longa e “feia”   polêmica assim  me confirmou  um outro  grande crítico  brasileiro, o Eduardo Portella, já falecido,  aliás,  muito  amigo  de Afrânio e   pertencente a uma   geração mais nova.

     No  Brasil, Afrânio  lutaria  para renovar os estudos  literários, sobretudo nas universidades e mesmo  no ensino médio, renovação proveniente das contribuições valiosas  da   chamada Nova Crítica, de origem  anglo-americana, que  a  obra de Afrânio Coutinho (1911-2000) traria  para  o centro do debate  da    intelectualidade  brasileira.Viria com  uma “visão armada” dos conceitos  e novas  abordagens de analisar  literatura, em  que os elementos s intrínsecos, imanentes à obra eram  priorizados nas análises    constituíam  os pilares formadores   da obra  literária,  onde a linguagem  e seus  efeitos retóricos  levariam o crítico   a um julgamento  estético, não mais  considerando os elementos  externos, como a biografia do autor,  sua cultura, a sua visão social, sua  religião  como uma  abordagem  conducente a uma intepretação   do fenômeno literário. Libertar-se desse subjetivismo  biográfico seria  o papel  a ser desempenhado pela Nova Crítica. Combater esse vezo  biografico  na comprensão da obra literária seria  o objetivo maior da crítica  renovadora.  . A  obra  seria  importante  do  ponto de vista estético  quando  se desprendesse dessa falta  de objetividade;   direcionada a observar o commportsmento  da língua-objeto,longe do   cediço     biografismo  que,  por vezes,  invade os estudos  literários do país. a linguagem , os componentes  retóricos como a metáfora,  os símbolos,  as imagem, o ritmo frasal,   os artifícios  retóricos, o estilo da escrita, i.e.,   o estilo  em lidar com a linguagem  é que seria preponderante  nos novos  estudos literários. A análise de um obra  ficaria  subordinada   a um conjunto de fatores intrínsecos   que levaria  a conclusões  válidas  na  aferição  do nível  estético logrado  ou falhado  de uma obra.  Ou seja, a obra, na forma de um gênero escolhido  pelo autor, um romance,  um  conto, uma novela,    um poema ,   seriam vistos  como  um  produto  acabado e  esteticamente convincente  quanto à sua elaboração  

       Mais tarde, já no curso de Letras me ia enfronhando com os elementos de  teoria literária. Para dar um exemplo, os conceitos  aprendidos com obras de Afrânio Coutinho, máxime o de  “periodização   literária,”  foram,  para a  época,  um novidade  nos rumos  que já haviam  tomado  e substituído   os conceitos  mais  antigos.

          Lembre-se  de que Coutinho tinha publicado um  breve e interessante   livro de teoria literária:  Notas de  teoria literária. Cf.: COUTINHO, Afrânio. Notas de teoria literária. Rio de Janeiro: Civilização  Brasileira, 1976, 96 p.). Coutinho foi quase um precursor em  obras dessa  natureza, se  não fosse pelo fato de  que o erudito  Estêvão Cruz, autor   didático  de  importantes obras de latim e  língua  portuguesa,  já em  1940, havia publicado  um livro  historicamente importante, e pioneiro, Teoria da literatura.(Ver CUZ, Estêvão Teoria da literatura.  2 ed. Porto  Alegre: Globo, 1940. Afrânio Coutinho, ao   editar   o breve  livro de teoria literária já citado acima, deu  provas suficientes de que também  era um autor didático  valioso e claro.  Essa pequena obra é destinada, segundo nos informa o  “Prefácio”,  aos  estudantes do  início do curso de Letras, assim também  aos estudantes do ensino médio e de cursos  pré-vestibulares. Coutinho foi quem, em primeiro lugar,  fez implantar no país a disciplina  teoria literária, inclusive     

        Os problemas sociais, mais tarde,  me atrairiam  porque,  no meu  país, as coisas mudam de ruim  para bom  só depois de muito tempo. Somos um país que retarda qualquer  grande mudança substancial do ponto de vista  educacional, social  e cultural, porquanto  a tendência  de nossos governantes,  nas esferas federal, estadual  e municipal é  manter,  sem  intuitos de  ações duradouras e responsáveis, mas,  ao contrário, a fim de que o  que foi feito precariamente de caso pensado é o que   vale  para  os donos do  poder..  

           Se o fosse, seria apenas para auferirem estabilidade e  controle do poder  político por motivos meramente eleitoreiros,  e não visando, por maquinações da   politicagem,   aos reais  e  complexos problemas nacionais, os  quais   requerem  ações decisiva, eficazes e permanentes dos governantes, a fim de que  fiquem   postergáveis para as calendas gregas..Ora, fazer girar, ou melhor, fazer girar uma máquina   estagnada  e adrede emperrada   resulta em mera   causa pétrea e, assim, o escritor vai tomado  de indignação  e passa a criticar  os erros  e  falas  dos governantes. Eu chamei  a esse  tipo de  assimilação   no que   diz respeito a se familiarizar  com  os elementos  fundamentais  da disciplina teoria literária, de “perda da inocência.” (SILVA FILHO Cunha e. Sobre esse assunto,   resumidamente,  ocupo um  capítulo do meu  livro  Apenas memória”(2016). Ver SILVA FILHO, Cunha e,   Apenas memórias. Rio de Janeiro Editora Quártica, 2016,p. Ver capítulo 12,  p.243-249;

         Sendo ainda mais explícito acerca dessa questão  tão  complexa,  eu diria que,  sem   base  de leitura  e estudos  de teoria literária,  um adolescente  estudioso e  dotado de alguma inclinação à  crítica literária, bem  pode  muito bem  conseguir   resenhar  um livro  e até  ser   vitorioso  na sua exposição. Dito isso, penso que   o julgamento   crítico depende  de  releituras concentradas, exige muita sensibilidade e muita quilometragem  de leituras  variadas não só no campo  propriamente literário, mas em disciplinas diversas ou correlatas como filologia, linguística, língua vernácula, estilística, filosofia, história, sociologia, geografia, estatística,  conhecimento de idiomas, da cultura  greco-latina,  e  -    cumpre   reiterar embora sendo redundante  -,  muita  leitura : ler. ler ler. O fato   é que  um jovem  que  lê muito  e se familiariza  com   leituras diversificadas  combinadas  com   a sua vocação  ou talento, se quiser, talento, bossa,     poderá  se sair bem   na sua incipiente atividade de   análise  da criação  literária.

          O ato crítico   pressupõe uma dimensão  de estofo interior da  personalidade  do crítico e da sua formação   cultural, das lições aprendidas  com  outros críticos,  mas - cumpre assinalar -,  que o mais recomendável  é que,  primeiro seja dado  como fator   determinante a  leitura    nos vários gêneros  literários e não fazer  o reverso,  dar  prioridade primeiro  à teoria.Esse  era o  conselho que me deu, quando  eu era jovem o professor A.Tito Filho numa  rápida conversa  à parte que  tive com ele. Ocorreu  num encontro de intelectuais  e jornalistas do Piauí  de passagem  pelo  Rio de Janeiro a um Congresso de Jornalistas Brasileiros  a ser realizado no ano de 1968, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, inclusive  como  participante  estava meu  saudoso  pai. O prof. A. Tito Filho  foi escolhido, já em Porto Alegre,  segundo   me contou  depois  meu  pai, ,  para ser o  orador do Congresso, além de ser   representante  principal  dos seus colegas e conterrâneos piauienses.

        A minha conversa como o meu  ex-professor de literatura   luso-brasileira  se deu em frente a um  bar na Cinelândia, Centro do Rio de Janeiro, onde se encontravam outros conhecidos jornalistas piauienses, da comitiva  sentados  em cadeiras na calçada de um  bar, ora  conversando, descontraidamente, ora bebericando alguma coisa (provavelmente uma geladinha), ora  ainda comendo  algum  saboroso  tira-gosto,  também. 

       A. Tito Filho, o prof. Arimathéa, segundo  os estudantes e mesmo  professores  amigos  o tratavam no Liceu Piauiense,  era, sem dúvida,  um bom   leitor  e escritor,  assim como um  ótimo  pesquisador e jornalista prolífero  em termos de publicações em jornais  piauienses

        Lia o que quer que me desse na telha ou surgisse lá em casa de meus pais, sobretudo na última residência em que morei,  por  pouco tempo, com eles. Ou seja,  na Rua  24 de Janeiro, Sul. Entretanto,  o fato de eu não ter  tanto conhecimento mais  profundos  em   teoria literária,  não me impediu de  pensar,  de forma  independente, sem a obrigatoriedade acadêmica das inseparáveis e imponentes muletas  teóricas, de preferência alienígenas mas, apenas com  a intuição  e a vocação  complementada  pelo textos que lia  de ensaios  de literatura brasileira, em autores  como Tristão de Athayde (pseudônimo de Alceu Amoroso Lima,).  Por exemplo,  podia citar, entre  outros,  a Pequena  história de literatura  brasileira que li ainda em Teresina. (Ver CARVALHO, Ronald. Pequena  história  da literatura. brasileira. 12 ed.  rev.  Rio de Janeiro: F.Briguet &  Cia. Editor, 1964.  de Ronald de Carvalho, obra que,  de resto,   foi, a meu juízo,  dura e  injustamente     criticada por  Assis Brasil (1929-202).

          Não concordo com  o julgamento que  lhe  fez daquela   obra de  Ronald de Carvalho (1892-1935)  que, a par de ser poeta e ensaísta,  foi um scholar , um estudioso, competente  e versado em  problemas  brasileiros. Haja vista, a sua produção  literária que deixou publicada, a despeito de ter tido vida  curta,  pois fora atropelado  por um carro  no Centro do Rio  de Janeiro aos 46 anos. Era muito moço ainda.. Como ensaísta, dele temos um obra que  não pode  ser absolutamente subestimada. Trata-se oe livro Estudos brasileiros. Rio de Janeiro: Nova Aguilar  S.A,; Brasília, INL, 1976, 322 p.)  sobre variados  temas  sociais, histórico, questões diplomáticas (guerra Guerra Cisplatina),  sobre fronteiras  na América latina. estudos literários, ou seja, abrangendo uma  gama de relevantes autores  nacionais,  inclusive até   discorre  sobre o Macunaíma (1928). de Mário de Andrade (1893-1945)

            Lia, com  denodo,  vontade e continuamente,  além do  prazer  propiciado pela  leitura   de romances, contos, poesias,   revistas da época, jornais, gibis,   nos quais  eu mesoa  colaborei  durante  um bom tempo, ainda morando  em Teresina. Li ,já o disse linhas atrás,   um número bem  considerável  de  romances  estrangeiros traduzidos, que pululavam  para as minhas mãos  sedentas  de leituras.  Talvez  isso me tenha sido  decisivo  a fim que,  no futuro,  o  doce prazer de ler,, o" prazer do texto” de Roland Barthes (1915-1980),    de  ler  grandes  obras  de variadas  espécies e temas estivesse sedimentando o meu espírito e o meu  intelecto para enfrentar, igualmente,   com  tenacidade,   independência e coragem,  a minha natural   tendência a julgar, analisar   e interpretar obras literárias nos vários. gêneros. Julgamentos de obras que me desafiariam  a argúcia  de critico  precocemente.   A propósito  dessas considerações de  leitor  adolescente, ver  o meu livro As ideias no tempo /Tersina: Senado Federal, 2009,  p. 30-31.  

            A teoria literária  era, praticamente,  uma novidade  para mim ao ingressar  no curso de Letras, assim como    as propostas de trabalhos, metodologias, abordagens  serem  utilizadas e previamente  planejadas.   Esta disciplina  teria que cursar obrigatoriamente, uma vez que    comecei  o curso  pelo antigo   regime de avaliação, com programação  semestral,   diferente  do  regime de créditos  que  seriam  na base de escolhas de tantos créditos  que o discente  desejasse cursar até que completasse   o total  exigido  por lei. Uma outra  novidade: eu,  com essa mudança radical   para o novo sistema de avaliação,  fui obrigado a cursar mais  uma disciplina,   o grego,   cujo conteúdo  de um semestre   teria que  ser  ensinado   ao aluno  com  certo açodamento e, ademais,  cem detrimento  da qualidade  do conteúdo ensinado. Antes do sistema de credito, não havia   que cursar grego   na minha modalidade,  português- inglês, só latim.  Não que  não o desejasse, mas sim  porque   teria que   cursar mais um ou dois  semestres.  Isso  prolongaria     o término da minha graduação.Entretanto, como  demorei  a terminar o meu  curso de Letras,malé, do  fato de qe   a Faculdade de Letras  passara ao regime de créditos e o curso de Letras que funcoonava, segundo já sobre  isso me referi,    na Avenida Antônio Carlos, e ainda com um Anexo, em prédio antigo  pertencente  ao Tribunal Eleitoral, o qual  ficava  onde é, hoje,  um espigão,  do qual  é proprietário de  um ou dois andares, o Petit Trianon,  a Casa de ,Machado de Assis, ouseja,  a Academia Brasileira  de Letras (ABL). 

        Os cursos de Letras agora transformados  em Faculdade de Letras, em prédio independente, pois da Casa d’talia  fora transferido,  provisoriamente, para  a Avenida Chile, numa construção meio  precária  em que acontecera, por pouco tempo, uma Exposição Portuguesa.Eram deficientes e algo improvisadas as novas condições de estudos tanto para o estudantes quanto  para o corpo docente.Era realmente um deus-nos-acuda.: havia galpões  que se tornaram salas de aulas,  de sorte que,  havia  um galpão  gigantesco, situado numa  espécie   de porão  destinado a neles  estudarem  várias modalidade do cursos de Letras, ou seja,  virou uma babel,   onde professores aqui falavam em inglês, ali  espanhol, mais adiante, alemão,   e assim sucessivamente. No primeiro andar, as salas eram  bem melhores do que aquele horrendo galpão, uma autêntica Torre de Babel  do tempo  do Velho Testamento  quando   os homens  que,  em geral,  desejam   ser superiores a Deus,  na construção da  famosa  e malograda  Torre, se viram, de repente,   confusos  sem saber entender a língua  de um e de outro, o que os impediu a continuarem  a desafiar  o poder de   Deus.  Não é  isso   um conto de carochinha não, mas  está  registrado  até num capítulo do livro  dos  livros, a Bíblia Sagrada.Tanto não é conto da carochinha  que o linguista Mario Pei,, em sua interessante   obra  All about language, faz alusão à Torre de Babel e não m,e parece estar  fazendo pouco caso  da história   bíblica. (ver PEI,  Mario, All about language. London: The Bodley Head,, 19956, p.9-10,       

          Para diretor da Faculdade de Letras, foi designado  o  professor  Afrânio Coutinho, que teve um batalha  campal,  da qual,  com muito esforço, saiu  vitorioso.Para conseguir realizar as mudanças  necessárias tanto no curriculo  dos  cursos  quanto  na implantação  pela primeira ve,z dos cursos de pós-graduação  stricto sensu (mestrado e doutorado). Mas nem tudo que  reluz é ouro, porquanto  houve contratempos vários  entre  Afrânio Coutinho  e as condições  de uma Faculdade funcionar  nos anos  da ditadura militar. Daí um certo caráter de acontecimentos   imprevisíveis, ou de natureza administrativa  na Faculdade de Letras, assim como  outros  problemas  relacionados a alunos e professores  estrangeiros. Deu certo apesar dos pesares. Eu, como aluno, tive prejuízos quanto ao meu tempo de concluir o   bacharelado   e  alicenciatura. Mas , como diz um provérbio  inglês que,  por vezes, costumo empregar: “Where there is a way, there is a will.." ..  Bem sei que Afrânio Coutinho mostrou-se  insatisfeito  com  essa  transferência para bem  longe,  .

       Em Teresina,  tive  um  excelente  professor  de literatura  luso-brasileira,  o A, Tito Filho (1924-1992), já mencionasdo.  o melhor e mais talentoso   mestre que tive no velho  Liceu Piauiense (depois chamado Colégio Estadual “Zacarias Góes”)..Suas aulas  encantavam  os adolescentes,   seus alunos. Sobre o que  penso  do  A. Tito Filho. (Consultar o meu livro Apenas memórias (op.cit., p.38-40. ), assim como meu  outro livro As ideias no tempo(op. cit,p.74-76.. no qual dedico  um capítulo a uma resenha da excelente  da obra Chico’s bar  é a solução; Teresina: COMEPI. 1981,186 p..,  Essa obra  não  é ´nada menos do que  um  útil dicionário  de anglicismos, resultado  positivo  de uma pesquisa  criteriosa e paciente   não só para a época de sua publicação, mas ainda   proveitoso  a quem  aprecia  estudos  lexicográficos, tão fundamentais a um trabalho  dessa natureza. De resto,    não é a primeira vez que  autor demonstra  inclinação à  pesquisas  filológicas. Antes,  já havia  feito  um trabalho escrupuloso  com  preciosas notas  semântico-linguísticas  a um edição de um romance do escritor piauiense Abdias Neves (1876-1928), de título Um manicaca (1909).      

        No entanto,  o Arimatéa  não tinha forte   embasamento de teoria literária nem tampouco outros da sua geração, porquanto não eram  formados em Letras (as Faculdades de Letras só surgiram  na década de 1930), ainda que fossem  muito  cultos e até eruditos e com  um faro  admirável  para a pesquisa lexicográficas, como era o aso de A,Tito Filho.. Para completar  o seu perfil de intelectual operoso  e dinâmico, não posso esquecer aqui de  mais um dado a  que  faz jus: A.Tito Filho foi, seguramente,   um dos maiores  oradores  do Piauí.

         Meu pai, Cunha e Silva(1905-1990)  o admirava  muito.  O  Arimatéa  era dotado de uma     incomum  habilidade oratória, a qual seria  sua  “facilidade de expressão,”  segundo sintagma  oportunamente usado  pelo meu pai,  e  a sua  voz  bem modulada   e a  sua gestualidade das mãos e do  olhar faziam brilhar ainda mais a sua carismática   personalidade de escol,  de um mestre  nato   e admirado  por mais de uma geração de estudantes que, no  velho Liceu Piauiense,  lhe ouviam   com atenção e se regozijavam  com as suas aulas-conferência, de improviso, abordando assuntos diversos, os  quais   iam da literatura à vida política local e nacional, à  economia, a temas  sociais e  culturais, assuntos controvertidos, como diferença  entre parlamentarismo e presidencialismo, divórcio, educação, vida urbana, historiografia, direito, temas governamentais,  pefis de figuras  ilustres piauienses   etc.Foi um cronista  de mão cheia, como evidencia o seu  livro Teresina, meu amor(1973),  uma livro de crônicas admirável,   o que lhe rendeu um elogio de Paulo Rónai()  numa  página  literária  do   Jornal do Brasil, cujo recorte eu  possuía até algum tempo atrás.  Contudo, se perdeu  com mudanças de residência.  Rónai era um tradutor  internacionalmente premiado, que se dedicou à tarefa hercúlea  de traduzir  toda a Comédia  humana() , obra de Honoré  Balsac (1799-1850).  Rónai  foi um   conhecido poliglota  e notável  ensaísta  húngaro muito entrosado com a literatura brasileira,   professor de latim e  francês do Colégio Pedro II,     

         Os professores de língua portuguesa do meu  tempo  de ginásio e clássico  eram  pessoas formadas  ou não em alguma  área geralmente direito, medicina,  engenharia,  mas tinham   cultura   ou se tornavam  autodidatas  em algumas disciplinas. Não passaram, todavia,   pelo curso de Letras. Esses cursos   e faculdades  não  existiam  ainda no  país, sobretudo  em  estados pobres  como era o Piauí. Em geral, os professores dessas dsiciplinas  do ensino médio formavam-se mais em direito e, caso tivessem  inclinação aos estudos do vernáculo, filológicos,  linguísticos, ou à literaturas  brasileira e portuguesa, se tornariam  professores,   alguns até ótimos, como foi o  exemplo do A.Tito Filho.  No entanto, em  assuntos  de teoria  literária,  não possuíam   o conhecimento  teórico  mais  profundo e acadêmico, que só seriam conhecidos,  em sua maior amplitude, e locus  próprio, com a criação das chamadas  Faculdades de letras e de filosofia  na década de 1930 do século passado. Para  informaçõs  mais detalhadas. (Ver o meu o meu  livro  Breve  introdução ao curso de Letra: uma  orientação. Rio de Janeiro:  Litteris/Editora Quártica, 120 p.  Cf. p. 16-17.

          Voltando  ao período do  início do curso de Letras, como o  tempo,   sozinho,  como sempre o fiz  por gostar de estudos autodidáticos,  ficava embevecido  com o poeta  Augusto  Meyer,  proferindo  magníficas  aulas-conferência no velho Anfiteatro da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil (depois chamada UFRJ).Com ele, o grande  poeta gaúcho  e ensaísta  primoroso, aprendi  a ter um olhar mais  aguçado,   diferente e mais  abrangente do  fenômeno  literário, sobretudo  de poesia. Foi um privilégio haver assistido às conferências  desse  magistral mestre e scholar Algumas palavras  suas ainda me ressoam  no pensamento, e já vão tantos anos, sobretudo  referentes à  criação literária. Segundo ele,  o fenômeno  literário  se torna, no seu amplo espectro, uma questão  epistemológica,  pois  a reflexão  literária   é sempre  um somatório  de  influências provenientes   de todos os lados, porquanto nada se perde na apreensão  de todo esse  universo  de influências convergentes  que ativam   a nossa capacidade  de  invenção e a construção  de formas  diferentes  no  tocante aos gêneros  literários.   Nada, que é humano e cultural, se perde no conjunto   de assimilação de  um saber  e de uma experiência humana,   dos quais  promana  o fenômeno  literário. Essas  múltiplas  influências, orbitando  em torno da  interioridade  do autor   e em forma de,  por assim dizer,   “irradiações,”  vão-se  internalizando  na mente  do escritor  e,  se perseguida com  determinação e vontade  de  produzir, o levam  a criar   realidades  bem mais  densas e profundas do que  as referencialidades   poderiam   realizar. A literatura,  em  todas as suas manifestações,   é um fenômeno abrangente  de dados  apreendidos  e colhidos  na própria  realidade empírica  e social.  Sendo que  tais dados da experiência  são  frutos   do  a  aludido conjunto  de  influências  múltipla. 

        Após estas relembranças,  passemos a enfocar  o tema  geral  deste  artigo  ou melhor  dizendo, da   fusão da crônica, do memorialismo  e da biografia ou autobiografia. São  três formas literárias   que  se embricam  entre   si,  e cada uma tem o elemento diferenciador. Esse artigo   que vai   já ficando  mais  longo,  teve,  inicialmente o objetivo de ser  uma  pequena crônica   falando  sobre o final de 2013, ora desejando  um Feliz Natal e Ano Novo, ora  “resmungando”(aqui me valeu a inspiração do poeta  e ensaista de artes  plásticas Ferreira  Gullar() que , num dos seus  belos artigos  publicados na Folha de São Paulo,  deu a um deles  o título de “Resmungão” sobre  os males  do país.  Ano que não me parece ter começado bem, sobretudo  pelo calor  insuportável  de mais de quarenta graus e pela  tragédias  das inundações  ocorridas no  estado  do Rio de Janeiro. Desta vez,  a raiva das águas  se virou  para Xerém, um distrito  de Duque de Caxias,  perto  da subida  para  a linda  cidade  de  serrana de Petrópolis.

.Não preciso  repisar o déja vu dessa tragédia  anunciada que,  ano após ano,  flagela impiedosamente  os moradores  fluminenses.Segundo um antigo morador  desse distrito,  nunca houve tanto volume  dágua  descendo  do alto  e  subindo   praticamente  pelo bairro todo, deixando atrás de si só  destruição,  pessoas  desaparecidas, pessoas mortas,  enfim, uma população que perdeu  tudo que tinha: casa,  móveis,  eletrodomésticos,  documentos,  mantimentos. Mais parecia um terremoto  a tromba dágua que se abateu  sobre  Xerém, lugar que conheci nos anos setenta quando  lá lecionei  em colégio  estadual. Sei que deixei muito alunos  que ainda  provavelmente moram  ainda lá  e são hoje   adultos,  pais ou mães de famílias, quem sabe,  até avós.

As inundações, no estado do Rio de Janeiro, poderiam ser contidas  ou  reduzidas caso  os governos, governador  e prefeitos, juntos se dispusessem  a equacionar  estratégias  de tal sorte que   os desmoronamentos  não  atingissem   tal magnitude  de provocar  grandes  perdas  humanas  e pertences   das famílias assoladas  pela  fúria das águas, da lama,  e  da subida do nível  das águas   cobrindo  até os tetos das habitações. Os rios viram mares, as margens desaparecem, se alastrando e levando de roldão tudo que encontram  em seu  caminho, à semelhança, guardadas as proporções,   do “estouro da boiada,” um  belíssimo texto de Rui Barbosa(). É um quadro terrível, que lembra também, assim que as águas  baixam,  uma cidade  arruinada por um terremoto. Deveria haver, em cada estado,  uma secretaria contra   os acidentes da Natureza, os quais não são  causados  só por esta,  mas pelas condições  de  terrenos  em que se constroem  habitações  nos bairros e cidades do Rio de Janeiro.Não existem,  por parte do governo  estadual  ou das prefeituras municipais,   uma política séria e responsável  que, além de  ter que fiscalizar  com rigor  o uso do solo  inadequado  para  construção de moradias simples,  tem a obrigação  gerencial  de   se acautelar,   antecipando-se   aos flagelos  das inundações, com sistemas de alarme  que  sejam acionados a tempo de a população  poder  se retirar  da iminência do perigo.

Os governos que temos tido sequer utilizam as verbas federais destinadas a prevenções  de  acidentes  naturais. Usam o mínimo possível dos recursos disponíveis e, ao contrário,  são  céleres  em dar  prioridades  a  outras obras,   como, só para  mencionar  uma,  a reforma do Maracanã, a qual custou fábulas de dinheiro. Dinheiro  esse  que  seria  muito útil  nas reformas e  reequipamentos  de  hospitais,  na melhoria  da segurança  da sociedade e da educação  pública, que está em níveis cada vez mais baixos  no que concerne à qualidade do ensino.

O flagelo das águas em alguns  estados  brasileiros  é tão  perverso quanto o  das secas do Nordeste. São dois males crônicos  do  país. Se perpetuaram e se tornaram uma segunda natureza  para  gáudio e   a insensibilidade ( o oxímoro vale  para esta  crônica pródiga de indignação explícita  ou  implícita)  de nossos  sucessivos governos.Decididamente, não interessa aos nossos  governantes e  políticos encontrarem um remédio eficaz para  enfrentarmos   esses dois ciclos, o  do excesso de água e o da falta  de água.Vários países   do mundo  já reduziram   o problema da seca. Por exemplo, países  que se localizam em  áreas desérticas já se tornaram  férteis,  produzindo  alimentos e desenvolvendo  boa agricultura graças aos modernos recursos  técnico-científicos  de que  dispõem  seus  governos.

      A questão  das inundações desencadeadas por chuvas torrenciais e o “polígamo das secas” não são uma sina, algo da  fatalidade de um país.  Se a chamada e eufemística  “vontade  política”   encena alguns  gestos e pequenas ações  determinadas  pelos governos,  mas de forma  paliativa, o certo e líquido   é que  nada se tem concretizado   de duradouro   e efetivo  na  administração pública.  Não há desejo de que os grandes males  crônicos  sejam   resolvidos ou  se aproximem  de  ações  corretas e com  objetivos de  melhorar a sociedade. Por esse motivo  e outros  é que os desastres, os acts of God,   são  realmente   desgraças  “anunciadas.” Ora, de tanto  irem e virem,  os desastres  da Natureza-Mãe  se tornaram banalizados   como são  hoje banalizadas as  múltiplas  e recorrentes perdas  de  vidas  humanas,  perdas materiais    nesse  universo  “líquido” e  indiferente  à sorte alheia. Oh, humanidade”  diria um personagem  o narrador do romance Moby Dick (1851), de  Herman Melville (1819-1891)) Há ainda a questão de  um outro mal, não menos  nocivo, a corrupção,  o superfaturamento,  a desídia. As mortes  de pobres  não comovem mais os governos.Resolver a questão  social brasileira mobilizando  maciçamente todas as suas    esferas dos governos  federal e estaduais e municipais  não  daria mais votos a profissionais da  política  minúscula nacional.  A grande sacada da inoperância  e má administração são os remendos,  as correções  pontuais, não o ataque a fundo contra  os males  crônicos que remontam a priscas   eras,   do  Brasil  Colônia,   passando pelos dois  Impérios, atravessando a  República Velha e a Nova República   e atingindo  os nossos  tempos  atuais. 

Deslocando-nos  para  a  política  propriamente dita,  a paisagem  por vezes  parece  um   teatro  de comédia ou de ópera-bufa, que, aliás,   nos lembram  tempos  recuados  como  o período em que Martins Pena escrevia sua   hilariantes  peças. teatrais.Na verdade,   o  Brasil literário  refrata  o  Brasil  político-social. Ler autores como  Gregório de Matos,  Manuel Antonio de Almeida,  Machado de Assis (ficção e crônica),   Lima Barreto,  Euclides da Cunha,   Antônio Fraga,  João Antônio e muitos  outros  mais,   em muito  nos  ajuda a entender  o que somos  e o que fomos ou ainda o que seremos, o que só  caberá  aos  poetas,   pois,  alguns deles,  são vates, ou seja,  fazem  prognósticos    para o futuro.

O lexema  “vate” provém do latim e significa “profeta” ( Cf.  MOISÉS, Massaud. Dicionário de termos literários. 6 ed, São Paulo: Cultrix, 1992 ,p.507.  O  dicionarista  de termos literários Martins Gray (Ver GRAY, Martin. Dictionary of  literary terms.Second edition. Terceira   impressão. Longman York  Press:  1994, p.300,    ensina que, em  inglês,  o lexema é “vatic,”  do latim “vates”, como em   português, e se refere a poesia,  gênero  que "...  se inspira  por ação divina” e é  sinônimo de “bardo". Gray ainda  ensina que esse segundo lexema diz respeito  ao  “poeta    profeta ”(aspas minhas) e conclui assim: “... também  é usado   pelos romanos quando    aplicados aos druidas.”

         É claro que não podemos  também   deixar de ler  alguns  grandes  autores e teóricos como  Oliveira  Viana, Gilberto Freire,  Caio Prado  Júnior,  Nelson  Werneck Sodré,  Sérgio Buarque de Holanda, Tristão de Athayde, osquais , além de outros,   se debruçaram  a  estudar  o Brasil e seus  problemas com seriedade e  competência.E eu diria com  o poeta John Howard  Payne (1792-1852):“ Time and patience conquer everything.” Payne foi  poeta comediógrafo e viajante americano  e foi o autor da letra da canção “Home, sweet home,”  escrita por ele  numa prisão em Londres. (Cf.: CAMPOS JR.,.J .L English  Portuguese Dictionary.23. ed. São Paulo: Edições  LEP,1954., 1043 p. Finalmente,   me vejo  compelido a falar, mais uma vez,  da escalada de violência nas cidades brasileiras,  com  ônus maior para o eixo Rio-São Paulo. Para quem acompanha  notícias desse tema,  é preciso  falar   também da violência  entre  pessoas  que  não são   traficantes nem marginais.  Trata-se  da violência  derivada   de relacionamento  amoroso,  de traição,  de  ambição  por herança,   de estupros no seio da família, na vizinhança,  nos condomínios de parricídio, de matricídio, violência galopante   nas ruas, quer nas  metrópoles, quer em cidades menores. 

     Violência que mais  depende de uma reeducação  moral  da sociedade, de  desenvolvermos,  desde o período infantil,  os bons e saudáveis  hábitos de convivência,  de respeito,  de solidariedade,  de civilidade, qualidades  do relacionamento  humano  que  está num  ponto    mais  baixo  em termos de  valores  éticos e comportamentais. Violência que seria  muito   reduzida pela carência  de boa educação, o   de orientação escolar,  familiar, de falta  de um educação espiritual, de uma educação  integral condigna e sem  prevenções  ou, como hoje se diz, sem preconceitos  de qualquer natureza. Leiam  o velho e eminente educador e pedagogo português Mário Gonçalves Viana (1900-1977 ).Violência  de  nível social (exclusão   social tanto dos bens materiais quanto   bens  culturais, os quais devem ser  concedidos  a todos os níveis sociais, conforme argumenta  um robusto e  sempre atualizado ensaio  de  Antonio Candido (1918-2017), de título  “O direito à literatura”, do livro Vários escritos. São Paulo: Duas Cidades, 1995, p. 235-263 ou provocada pelo  consumo  de drogas de um membro da família ou de  membros da mesma família Violência  entre  políciais militares e traficantes  ou  milicianos, ou até entre  policiais e  policiais, naquele sentido  do texto  magistral  e teórico   de Antonio Candido,   que  é  ”A dialética da malandragem, ”  principal  fundamentação da minha Tese  de Doutorado em  literatura brasileira,  defendida em  2002 na Faculdade de Letras  ( UFRJ). Enfim,  violência contra idosos (etarismo), contra doentes mentais,  gêneros,  moradores de rua, violência  de    política  bipolarizada (caso brasileiro) entre  a  esquerda e  direita ou extrema-direita, sendo que o esquerdismo  brasileiro  não  é,  na práxis,  tão diferente,   no que tange  às regalias  e privilégios faraônicos  dos  poderosos dos três poderes, o que  não passa de uma contradictio in terminis

          Por tudo isso  e por mais  ainda, deve-se  mobilizar a sociedade no sentido  de  exigir das autoridades  melhor educação,  saúde,  segurança, lazer  e  oportunidades  de  progredir  social e culturalmente (diminuindo as assimetrias  sobretudo  nas modernidades (Eduardo Portella), usando o lexema no  plural e, com isso, comungando com o pensamento   avançado  e civilizado de um dos mais   brilhantes  críticos  literários  brasileiros, a par de ser um   teórico  de literatura original e um   pensador  de alta envergadura intelectualA demagogia dos dois últimos governos não vai  resolver  todas  essas questões cruciais  para  termos uma  pátria  da qual  possamos  nos orgulhar   e na qual  possamos  confiar na esfera da cidadania e da convivência em sociedade.

(1)CUNHA E SILVA FILHO::   Membro efetivo, cadeira nº  30, da  Academia Brasileira de Filologia- ABRAFIL. Pertence à União Brasileira de Escritores (UBE – Seção Piauí)); Atualmente, é colaborador da Revista romena “ORIZONT LITERAR CONTEMPORAN,  sediada em Bucareste. Dir. de Daniel  Dragomeriscu. Escreve  há muitos anos para o  Site Entretexto direção do escritor,  professor, poeta, ficcionista e ensaísta Dilson Lages Monteiro. Assina seu Blog “As ideias no tempo.” Seu Blog, por enquanto, está desativado por motivos   técnicos, mas o leitor pode consultar  os  seus arquivos. Escreve também  para o Site www.academi.edu. com – Francisco  da Cunha e Silva. Escritor, crítico literário, cronista, ensaísta,  tradutor de  poesia estrangeira,  articulista,    ex-professor   Titular de língua inglesa do Colégio Militar do Rio de Janeiro(CMRJ), ex-professor de literatura brasileira  e língua inglesa do curso de Letras,   de língua inglesa  instrumental e de língua portuguesa dos cursos  de Comunicação e Jornalismo  da Universidade  Castelo Branco (UCB). É Pós-Doutor em Literatura Comparada, Doutor e Mestre em Literatura Brasileira    e    Bacharel e Licenciado em Português-inglês pela Universidade Federal do Rio e Janeiro (UFRJ). Foi colaborador, por muito tempo, desde a   adolescente,  de revistas e importantes  jornais de Teresina, Piaui. Foi  colaborador  de jornais e revistas  de Brasília,  São Paulo, Rio de Janeiro e no exterior.