Volto do supermercado com algumas compras triviais. Mas na sacola trago um Camemberg e uma baguete. E pronto, me sinto na França, mais precisamente em Marlenheim, que quase não é francesa, onde morei por um mês. Milagre da queda do dólar: estamos no mundo globalizado, onde podemos ter essas iguarias na mesa do café. Sim, mais fácil do que as delícias amazonenses, como a pupunha, a tapioca e o cuscuz. Mesmo em Manaus, agora, não é fácil você comer um cuscuz como deve ser: milho cozido, depois ralado. O verdadeiro cuscuz é feito com a massa de milho, pilada, temperada com sal. É cozido no vapor da água e depois umedecido com leite de coco. Com manteiga. Nada de farinha de trigo industrial, não presta para o cuscuz. O milho cozido deve ser ralado, portanto o cuscuz tem fragmentos de grãos de milho. Iguaria muito difícil de conseguir. É mais pegar um avião e ir a Paris comer um cuscuz marroquino, no “Le Roi Du Cuscuz”, no Boulevard de Grenelle, entre os metrôs Motte-Picquet e Duplex, onde fica aquela feira dominical que adoro e vende de tudo, como discos e DVDS por preço irrisório, e onde encontrei um raro CD de Nelson Freire jovem. Um restaurante libanês, que faz aquelas comidas gordurosas e excelentes, cheias de colesterol, com o apetitoso cuscuz que é um prato originado do Maghreb, região do Norte da África. A música é daquelas cantoras árabes que rebolam chorosas, gozosas, lânguidas, gordas e sensuais. A decoração faz parecer que estamos dentro de uma tenda marroquina, bom preço, barato, delícia. Podemos tomar café com cuscuz, com pupunha ou tucumã, sobre o qual escreveu Luiz Bacellar:
do teu minúsculo coquinho
relatam lendas milenares
brotaram sono, amor, carinho,
a lua e outras luminárias;
onças e pássaros noturnos
quando em teu bojo se escondia
dele fugiu com ares soturnos
enquanto o breu se derretia;
tu fostes a caixa de Pandora
das tribos bárbaras de outrora
e a cor das asas da graúna
saiu de ti como um trovão
para que a filha da boiúna
pudesse amar na escuridão.