Amy Winehouse
Por Bráulio Tavares Em: 07/08/2011, às 10H23
[Bráulio Tavares]
Janis Joplin preferia viver dez anos a mil km por hora do que mil anos a 10 km. A forma da frase muda, mas o espírito é esse, e tem sido glosado e parafraseado ao longo dos anos. Como todo adolescente daquela época tive uma paixonitezinha por ela, que era lindinha, rosada, charmosa, tinha um sorrisozinho de desmontar qualquer um, e cantava como quem tem três metros de altura e mil anos de idade. Somente quando li a biografia póstuma “Enterrada Viva” me toquei do quanto ela sofria, o quanto se achava gorda e feia, o quanto era autodestrutiva. E a frase dela que me ficou foi: “Ser cantora é passar duas horas fazendo sexo com 30 mil pessoas e depois ir dormir sozinha”.
Amy Winehouse foi a mais recente baixa nesse exército de mulheres que trazem um buraco negro na alma, sugando toda sua energia. A única maneira de não serem destruídas por ele é através da produção de um “surplus” de energia através da voz. Durante os minutos em que Amy Winehouse canta, autodestruição e autocriação se equilibram. Fora do palco, sua vida é uma tragédia de más escolhas, de fragilidade patética e de forças sem direção. Cantava bem, num inglês engrolado do qual continuo sem entender uma só palavra, a não ser aquele mantra de quem se afoga, “no, no, no”. Andei lendo alguns depoimentos sobre ela (jornalistas, fãs, etc.) e vi gente dizendo: “Faltou um cara que lhe desse segurança emocional...” ou algo assim.
O imenso charme das mulheres autodestrutivas! Elas mobilizam o Bom Samaritano que existe em todos nós, e também o Super Herói (“ninguém conseguiu, mas eu conseguirei!”). Vi dias atrás o filme “Destinos Ligados” de Rodrigo Garcia, onde aparecem duas autodestrutivas exemplares, interpretadas por Annette Bening (travada, neurótica, deprimida) e Naomi Watts (ressentida, promíscua, sem afetividade). Dois homens (fortes, estáveis, maduros), se apaixonam por elas. Por que?
São mulheres cujo charme é viverem a um fio de cabelo do suicídio, sabendo disso, e não ligando. O ser humano normal sabe que não aguentaria 24 horas nesse regime, e ela aguenta 365 dias por ano. O homem a vê caminhando na corda bamba, sem rede de proteção, com a tranquilidade dos bêbados. Nesse momento ninguém a supera em encanto e transcendência; ele seria capaz de dar a vida para que ela não caísse. Quando consegue fazer com que ela desça, tome um banho e engula um Engov, ela começa a ficar banal, previsível, igual a qualquer outra. O encanto das autodestrutivas é inseparável da autodestruição. É o seu momento carruagem, e salvá-la é transformá-la numa abóbora que usa avental de plástico e bobes no cabelo.
Claro que a mulher precisa ter algum charme para compensar tanto trabalho. Pode ser beleza física, pode ser carisma, pode ser caráter, pode ser uma voz de quem canta bem, pode ser mil coisas; mas por dentro de todo seu sofrimento suicida tem que haver alguma coisa de precioso que, aos olhos do homem que a observa à distância, valha a pena salvar.