Sugestões para o livro eletrônico
Por Bráulio Tavares Em: 18/08/2010, às 18H48
Bráulio Tavares
Há duas atitudes extremas que não me interessam. Uma é achar que o livro eletrônico vai acabar com o livro de papel (não vai) ou com a prática da literatura (menos ainda). A outra é achar que ele é um milagre, e que vai habituar as pessoas a ler oferecendo-lhes coisas que se afastam cada vez mais do texto, livros que contêm mais desenho animado do que texto. Como objetos são uma gracinha. Mas eu, que sou um produtor de textos, quero suportes físicos que ajudem e valorizem o texto, não que o empurrem para segundo plano. Não por interesse pessoal ou vontade de ficar rico – já estou na metade do 2o. tempo e não acredito em prorrogação; mas por amor à arte. À arte do texto.
Uma sugestão: já que o livro eletrônico tem espaço à beça, poderíamos promover edições de obras em que o leitor adquirisse não somente a tradução brasileira de uma obra clássica, mas também o texto original, e quem sabe em outras línguas (espanhol, inglês, francês), tudo incluído no pacote. No caso de clássicos em domínio público, ficaria baratíssimo.
Minha edição de “O Jogo da Amarelinha” de Julio Cortázar é da Cátedra (Madrid), na coleção “Letras Hispânicas”. O livro tem uma introdução com 70 páginas, uma bibliografia de 12 páginas de e sobre o autor, um mapa de Paris, fotos das ruas citadas. É um livrinho de bolso, não muito caro (me custou cerca de 50 reais), com menos de 800 páginas. Se dá pra fazer isso no papel, por que não nos pixels? Ao invés de uma bibliografia meramente citando títulos, que tal o e-book trazer, como faixas bônus, o texto de algumas das dezenas de críticas já feitas sobre o livro? O trabalho seria apenas o de licenciar os textos originais e incluí-los nos direitos autorais, separando uns 2 ou 3% para isto.
Um e-book pode me dar a possibilidade de comparar, sem me erguer da cadeira, um trecho da tradução com o original, e com as soluções encontradas por outros tradutores. Como “O Jogo da Amarelinha” é um romance passado em Paris, eu poderia ter não somente o mapa específico do livro, salientando os trajetos dos personagens, mas acesso ao mapa Google com imagens de satélite da rua em seu aspecto atual (o livro é ambientado nos anos 1950).
Notas de pé de página, que incomodam alguns leitores, podem vir sob a forma de balões que surgem na tela quando clicamos num trecho assinalado. No caso de “Rayuela”, que tem uma proposta vanguardista de leitura (por capítulos salteados), seria possível reordenar os capítulos de acordo com alguma das ordens de leituras propostas e lê-los assim de uma só enfiada, o que no livro de papel exigiria ficar indo e voltando. Um livro sem capítulos como “Grande Sertão: Veredas” poderia ser desmembrado em unidades ou episódios, num gráfico em forma de árvore, e seriam acessados diretamente para consulta rápida, sem que fosse quebrada a sua forma original. Há muitas maneiras de usar a eletrônica para valorizar o uso do texto e a fruição do texto.