POEMITOS DA PARNAÍBA

POEMITOS DA PARNAÍBA

Texto: Elmar Carvalho

Charges: Gervásio Castro

1.           Alain Delon

 

Situava-se entre o feio e o horrível

mas se dizia BG: bonito e gostoso.

Metido a conquistador de mulheres

conseguia o inverso efeito:

as mulheres – lebres assustadas –

de Alain Delon fugiam.

Se Alain Delon muito fosse

Alain Delonge seria.

 

 

2.           Derocy

 

Derocy, Ofélia da Parnaíba,

não era um orador oral:

era um orador boçal

em seus discursos bestialógicos,

ilógicos, escatológicos. Tirava

do sério o homem sério quando

disparava seus disparates.

3.           Meio-Quilo

 

Se bem pesado não dava

sequer meio-quilo. Pai de

Cotinha, mulher bonita e

namoradeira nos escuros

do velho Cine-Teatro Éden – paraíso

de estripulias estrambóticas e eróticas.

O pequenino Meio-Quilo, de lanterna em

punho, a roubar Cotinha dos braços

do namorado, era um filme

à parte.

4.           Alarico da Cunha

 

Poeta. Espírita. Espírito

da carne e do osso, a roer

o osso duro do ofício de poetar.

Quixótico, exótico: misto de poeta

e de espírita. Via espíritos no

ar. Nunca estava sozinho:

quando a poesia lhe faltava

os espíritos surgiam e

se insurgiam contra a solidão.

Cavalheiro de fino trato:

tirava o chapéu para os 

espíritos que só ele via.

5.           Lobaia

 

Animal trípede da 

família dos primatas.

Animal não monstruoso:

animal mastruoso.

Pé de mesa mais famoso

da Parnaíba, Lobaia

só cavalgava cobaia,

em única experiência,

através da armadilha

das lâmpadas apagadas.

6.           Parassi

 

Vai bola com Parassi.

Parassi pára. Parassi para 

Moacir. Era o velho

Parnaíba de Parassi,

Irmãos & Futebol Clube.

Hoje é apenas Parnaíba Clube.

 

 

7.           Mestre Ageu

 

Mestre Ageu

mago das artes escultóricas,

novo rei Midas do antigo mito

a transformar em estátuas

troncos toscos de madeira

com os toques de suas mãos.

Mestre Ageu

Pigmalião dos mágicos toques

faz mais uma escultura:

ninguém se espantaria

se ela gesticulando

lhe desse “bom dia”. 

Mestre Ageu

de arte tão exata

que lhe força fabricar

o seu cinzel de cortar.

Mestre Ageu

em sua agrura

agora chora ora e deplora

afagando/abraçando/agarrando

a escultura, sua cria/tura:

o compra/dor a veio buscar.

8.           Simplição

 

Não o Dias da Silva,

mas o Long John da Parnaíba,

o terror da mulherada,

pé de cana e pé de mesa,

concorrente de jumento e garanhão.

Só pegava mulher novata,

desconhecedora da fama de seu

alopramento descomunal.

A cama se transformava

no altar do sacrifício da mundana,

segura a pulso como uma potra bravia.

Processado pela noiva descartada

após quarenta anos de noivado.

(A noiva não sabe a sina 

de que terá escapado.)

9.           Xigau

 

Assim como há 

o espírito de porco

o espírito de gato há.

Xigaaaau... Xigaaaaaau...

Não articulava palavras,

apenas miados e miados

e a semiótica linguagem

de seus gestos de gato.

10.           Jibóia

 

Trazia a lembrança viva

de um passado morto e sepulto

dos Bailes Azuis e do

burburinho dos porcos d’água

e das meretrizes do cais.

Reinava na boite Rio-Chic

e desfilava pelo grande salão

cheio de espelhos e de sonhos

e de risadas esparsas

como num reino encantado.

A imagem de Jibóia morta

reproduzia-se pelos quatro

cantos do salão através das

pupilas perplexas dos espelhos.

(As velas do velório

 lágrimas de cera choravam, 

enquanto as mulheres, entre soluços,

rezavam contritas.)