Paulo Hijo e Claudio Seto recontam fábula japonesa

A fábula O macaco e a água viva é apresentada, em versões um pouco diferentes, respectivamente, por Paulo Moriassu Hijo, um descendente de okinawanos - japoneses do extremo sul do Japão - nascido em Presidente Prudente-SP, e pelo falecido ilustrador Claudio Seto.

 

"(...) Mas foi no final da década de 60, na [lendária] Editora Edrel, que o artista [Claudio Seto] se consolidou como primeiro artista brasileiro a utilizar o estilo mangá nos quadrinhos nacionais, produzindo suas belas e conhecidas HQs com samurais e ninjas. [Um pouco antes, no mesmo texto de M. Ramos, constava que Seto] (...) Recentemente lançou o álbum Lendas do Japão pela Devir Livraria [http://zinebrasil.wordpress.com/2008/07/07/lancamento-lendas-do-japao/] (...)". ("Morre o quadrinista Claudio Seto - O adeus do Samurai de Curitiba", por Michelle Ramos, portal Zine Brasil, http://zinebrasil.wordpress.com/2008/11/15/morre-quadrinista-claudio-seto/)

 

Janara, em 16.11.2008, no blog Ideafixa, escreveu: "Este é um post que serve como despedida e homenagem a esse grande homem e artista chamado Cláudio Seto, que infelizmente nos deixou ontem". (De acordo com informação da mesma leitora e admiradora, a foto é de Raquel Santana, http://www.ideafixa.com/2008/11/16/claudio-seto/.)

   

  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Paulo Hijo

Paulo Hijo, que descende de japoneses okinawanos.

(http://www.gostodeler.com.br/curriculo/144/Paulo_Hijo.html)

 

 

 

 

 

Claudio Seto foi ao Japão quando tinha nove anos para estudar no Templo Myoshinji, um mosteiro budista (Zen) localizado em Quioto (Japão), e "ao voltar ao Brasil, com 17 anos, (...) trabalhou como argumentista e desenhista de história em quadrinhos em São Paulo, editor de revistas em Curitiba, chargista, ilustrador e editor". (http://www.nippobrasil.com.br/2.semanal.lendas/236.shtml) Notícia, ilustrada com gravuras de elevado valor artístico, de autoria de Seto, está, na Web, em: http://zinebrasil.wordpress.com/2008/11/15/morre-quadrinista-claudio-seto/.

 

 

                                                                         Para Chuji Seto Takeguma, o Claudio Seto (1944 - 2008)

12.11.2009 - A comparação entre diferentes versões da mesma fábula é procedimento crítico-literário - e de estudos de semiótica das culturas - que nos ajuda a perceber, simultaneamente, a inteligência e a sensibilidade dos povos, por um lado, e o talento literário dos contadores de estórias, por outro. Se a criação da estória foi possivelmente coletiva, a apresentação de cada versão é particular. Isso quando o contador não decora, palavra por palavra, o que ouviu de seus ancestrais.

Variações em narrativas fixas

A concepção de mito como narrativa fixa está, por exemplo, no livro Argonautas do Pacífico Ocidental, do etnólogo polonês B. Malinowski, que escreveu: "(...) Este pequeno fragmento [do mito kiriwinense (Ilhas Marshall Bennett, na Oceania) de Tokulubwaydoga (Tokulubwaydoga é o nome de um cachorro)] dá uma boa noção do que é a primeira versão, até mesmo de uma narrativa tão fixa como a de um mito. Deve ser suplementada por meio de perguntas relativas aos motivos do comportamento das várias personagens, e às relações entre uma ocorrência e outra (...)" (MALINOWSKI, 1984: 200; as Ilhas Marshall Bennet ficam na Baía de Milne, Papua-Nova Guiné, país que faz fronteira terrestre, na ilha de Nova Guiné [assim batizada pelos portugueses que a "descobriram", em 1511], com a Indonésia. Fontes da localização geográfica:  http://en.wikipedia.org/wiki/Marshall_Bennett_Islands e http://pt.wikipedia.org/wiki/Papua-Nova_Guin%C3%A9).

Argonauts of the Western Pacific (1922)

Nesse trecho verdadeiramente iluminador de uma obra clássica da fundação da antropologia contemporânea - Argonautas do Pacífico Ocidental - Um relato do empreendimento e da aventura dos nativos nos arquipélagos da Nova Guiné Melanésia [Coleção Os pensadores, São Paulo: Abril Cultural, 1984, 2ª ed., com prefácio de Sir James George Frazer, trad. de A. P. Carr e L. A. C. Mendonça e revisão de E. R. Durham] -, o Dr. Bronislaw K. Malinowski (1884 - 1942) admite que mesmo de narrativas bastante fixas há versões com variações (como se diz, coloquialmente, "sobre um mesmo tema"). Essas variações podem ser pequenas, eventualmente, mas ocorrem.

Fábula japonesa

Não houve, como adiante será visto, versão única na exposição da fábula O macaco e a água-viva, mas versões diferentes da mesma estória, sendo uma delas a do brasileiro, descendente de japoneses, Paulo Hijo, que recontou a fábula de maneira um pouco diferente de Claudio Seto, também brasileiro - e também de ascendência nipônica. De qualquer forma, as duas contações são admiráveis, como a seguir se pode conferir. Flávio Bittencourt ([email protected]

UM)

Recontação de Paulo Hijo

"O macaco e a água-viva - Fábula Japonesa 
 

Shiyozushi no Kami, deus das águas e do mar, reuniu os habitantes do fundo do mar no castelo do dragão, onde vive, e pediu a todos que fizessem o máximo para que encontrassem um remédio que curasse a  doença da sua filha. Como não conheciam nenhum medicamento para o mal da princesa, concluíram que, se o próprio Kami, deus dos mares, não sabia qual remédio curaria a princesa, muito menos saberiam eles; e calaram-se.

O silêncio foi quebrado pelo o polvo quando disse que se lembrava de uma conversa, entre os humanos, sobre doenças quando estivera na superfície. Disse que tinha ouviu deles que o fígado de macaco era um santo remédio porque curava tudo que era doença.

Pediram, então, ao próprio polvo que subisse à superfície e arranjasse um macaco, pois, por possuir oito pernas, ele seria o mais apto. Sabendo que a tarefa não era nada fácil, o polvo, por sua vez, indicou a água-viva, alegando que ela tinha um número bem maior de pernas. A água-viva sentiu-se honrada e aceitou cumprir a missão.

Antes que a água-viva partisse para a missão, descreveram-lhe o macaco como um animal de cara e traseiro vermelhos, muito inteligente e que vivia em árvores, nas ilhas do mar de Seto. Disseram a ela que os macacos daquela região gostavam de comer de tudo, principalmente castanhas e frutas frescas. Ela deveria convencer um deles a conhecer o castelo do fundo do mar sem, no entanto, contar-lhe a verdadeira razão da sua visita. Depois das orientações a água-viva partiu para a superfície.

Tão logo chegou às ilhas do mar de Seto, a água-viva avistou um macaco que descansava preguiçosamente numa árvore. Ela se aproximou e o chamou. Ele olhou para baixo e, admirado, pois era a primeira vez que avistara uma criatura como aquela, perguntou a ela a que reino ela pertencia. Ela respondeu que vivia em um lugar cheio de bosques, onde havia muitas árvores frutíferas, inclusive pés de caqui e de castanhas, de vários tipos.

Percebendo que o macaco se interessara, a água-viva o convidou para visitar o reino encantado do fundo do mar. Ele recusou o convite alegando não saber nadar. Ela o convenceu dizendo que o levaria nas costas. Ele então desceu da árvore e os dois se dirigiram para o alto mar.

O macaco era pesado, o que obrigava a água-viva a nadar vagarosamente. Na metade do caminho, ele reclamou da demora, pois queria chegar logo ao reino das frutas e castanhas. Ela, então, passou a falar sem parar, para distraí-lo. Passou também a elogiar os macacos, o que o deixou muito lisonjeado.

Ao notar que o macaco gostava de elogios, a água-viva disse, para entretê-lo, que ele e seus semelhantes eram considerados preciosos no seu reino. O macaco, curioso, quis saber a razão de animais de sua espécie serem tão apreciados pelos seres do mar. Ela disse que não podia contar a ele, pois era um segredo.  Ele disse que tinha aceitado o seu convite porque confiava nela, e que ela também devia confiar nele.  Ela finalmente disse que os macacos tinham a fama de curar doenças. Mas poupou-se de dar detalhes.

A água-viva nadava distraidamente, e quando o macaco, desconfiado e preocupado, perguntou a ela como ele seria capaz de curar doenças, ela disse que era algo que ele possuía, o seu fígado.  Disse também que a filha do deus do mar estava muito doente e necessitava de um.

Temendo pelo seu fígado, o macaco lamentou-se dizendo que, não tendo sabido anteriormente, nada podia fazer para curar o mal da princesa. Questionado pela água-viva, respondeu que ela deveria ter-lhe contado sobre a princesa antes de deixar a ilha, pois não teria deixado o seu fígado no galho da árvore, onde ele descansava. Ele, então, propôs que voltassem para buscá-lo. A água-viva deu meia volta e nadou em direção às ilhas de Seto.

Quando o macaco alcançou a terra firme, correu para a árvore, subiu e deitou-se no galho. A água-viva, percebendo que o macaco demorava, o chamou para retomar a viagem. Ele se recusou e disse a ela que iria avisar todos os macacos para não lhe darem ouvidos, para não caírem na sua conversa. Ela voltou só ao fundo do mar.

Chegando lá, a água-viva contou aos seus companheiros o que havia acontecido. Disse que convencera um macaco a conhecer o castelo do dragão. Mas, no meio do caminho, como dera com a língua nos dentes, ele a fez voltar à ilha e a ludibriara. Como castigo, levou uma sova daquelas e teve os seus ossos quebrados. E é por isso que as águas-vivas são como são até hoje: molengas.

Com esta fábula, aprendi que devemos estar alerta contra certos seres que, mesmo que ingênuos na aparência, podem agir com segundas intenções, nos pegando pela nossa fraqueza. Mesmo um ser aparentemente simples pode tentar nos ludibriar e pôr em risco a nossa vida. Foi o que aconteceu com o macaco guloso: ele, que possui cérebro, por pouco não foi ludibriado por uma água-viva, um ser 'acéfalo' ". (Paulo HIjo, (http://www.gostodeler.com.br/materia/1158/o_macaco_e_a_agua-viva_fabula_japonesa.html)

 

DOIS)

Recontação de Claudio Seto (o desenho abaixo reproduzido também é dele).

"O Macaco e a Água-viva - Final

 No tempo do Japão mitológico, havia no fundo do mar um famoso palácio conhecido como Ryugyu, o Palácio do Dragão, cujo senhor era Shiyozushi no Kami, o deus das Águas e do Mar. Sua bela filha Toyotama Hime, a princesa Alma Luxuriante, ficou muito doente e os melhores remédios do fundo do mar não conseguiam curá-la. Em uma reunião com todos os habitantes do fundo do mar, ficou-se sabendo que o fígado de macaco eram um excelente remédio, que curava todos os males. A dona Água-viva foi a escolhida para a nobre missão de atrair um macaco para o palácio.

A idéia era pegar o macaco por uma das suas fraquezas: a gula. Ela teria de convidá-lo para um banquete no Palácio do Dragão, dizendo que estaria cheio de castanhas e caqui. Chegando na ilha de Seto ela logo conseguiu convencer um macaco a acompanhá-la.

-Suba e vamos embora, disse a água-viva toda feliz, certa de que tinha conseguido enganar o macaco.

Ela foi nadando durante algumas horas e o macaco começou a sentir cansaço e reclamar que estava demorando.

Para entreter o macaco a água -viva falava sem parar e deixou escapar uma pergunta indevida.

-É verdade que você possui um tal de fígado?

-Sim é claro todos os bichos têm fígado.

-Ah! Mas do macaco é muito importante.

-Como assim, por que importante?

-Ah, não leve em conta. Eu disse o que não devia.

O macaco muito esperto ficou desconfiado do repentino corte na conversa e disse:

-Minha amiga, gostaria muito de saber porque fígado de macaco é tão importante.

-Não sei se devo dizer. É um segredo.

-Veja aceitei seu convite de todo coração e acho que você está sendo descortês ao negar uma explicação para seu convidado.

-Está bem, se guardar segredo é falta de educação, vou dizer só para você. Na verdade a Princesa Toyotama está muito doente e o melhor remédio para curar a doença dela é fígado de macaco. Por isso vim para buscá-lo.

O macaco ficou muito assustado, mas com seu jeito cínico de ser, fingiu tranqüilidade e disse:

-Ah! Eu não sabia que meu fígado era um santo remédio para a princesa. Se soubesse eu teria trazido comigo. Se você tivesse dito antes eu não teria deixado o fígado no galho da árvore.

-Mas você não trouxe o fígado?! Ora então não vai adiantar nada ir até o palácio.

-Ora vamos voltar para pegar o meu fígado.

Dona Água-viva já não agüentava o peso do macaco em suas costas, mas deu meia volta e rumou em direção da ilha. Quando chegou o macaco subiu na árvore com pretexto de apanhar o fígado e ficou deitado no galho folgadamente.

-Ei macaco parece que você vai tirar uma soneca. Desça logo daí com o fígado.

-Olha mudei de idéia, não vou mais para o Palácio do Dragão. Vou sair pulando de galho em galho, por todas as ilhas avisando os macacos para não cair na sua conversa. Dizendo isso o macaco fez caretas para a água-viva e saltou de galho em galho até desaparecer.

No palácio todos os habitantes do mar esperavam ansiosamente pela Água-viva. Ficaram decepcionados quando ela chegou sozinha e de mãos vazias.

-O que vamos dizer agora para Deus do Mar que nos encarregou dessa importante missão?! Preocuparam-se todos.

A água viva contou detalhadamente que vinha trazendo o macaco, mas no meio do caminho falou demais e o macaco conseguiu enganá-la.

Os habitantes do mar resolveram dar uma surra na água-viva para ela aprender a não ser tão burra e tão linguaruda. Bateram tanto que quebraram todos os ossos que ela tinha.

Reza a lenda que, desde então, a água-viva ficou com o corpo mole e sem ossos como é atualmente". (Claudio Seto, http://www.nippobrasil.com.br/2.semanal.lendas/236.shtml.)

 

===  

 

REPRODUÇÕES DE ALGUMAS PÁGINAS IMORTAIS DE CLAUDIO SETO 

 

Flores manchadas de sangue

 

Flores manchadas de sangue

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

Flores manchadas de sangue

 

   Flores manchadas de sangue

 

(http://www.universohq.com/quadrinhos/2009/n13052009_06.cfm)

=== 

UM JARDIM JAPONÊS EM CALDAS NOVAS, GOIÁS, BRASIL                                                         

                                                          "O Jardim Japonês de Caldas Novas foi construído pelo japonês Toshiyuki Murai, hoje residindo no Brasil. É um lugar de grande significado espiritualista e que deve ser visitado na companhia de um guia local treinado, que fará a interpretação dos vários componentes do Jardim.
0 Jardim Japonês tem sua origem no século XIV, quando os monges da seita Zen-Budista saíram da China para o Japão e começaram a se instalar junto aos imperadores e comandantes militares, os shoguns.
O Jardim Japonês é assimétrico, permitindo visões diferentes, dependendo do ângulo em que se estiver. Os monges precisavam de espaços especiais para fazer suas orações e meditações. Por isto, usaram elementos da natureza, como as pedras, as plantas e a água, fazendo arranjos os mais diversos.

Localização: Estrada para Goiânia ao lado do Hotel Império Romano com horários de
Aberto a publico das: 08:00 às 11:00s e das 13:00 às 17:00s todos os dias".
(http://www.cicerocampos.com/2008/pontosturisticos2.php)
 

===

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(Ilustração de Claudio Seto, http://entaolengalenga.blogspot.com/2008_11_01_archive.html

 

===

 

Sobre a Rua Claudio Seto, em Curitiba, informações na Web em http://domino.cmc.pr.gov.br/web/prop2005.nsf/2ef02ffad5899dbb03256e8a0060f322/762aba335b6b1ab90325750d0047520f?OpenDocument.