Cunha e Silva Filho


Creio que o leitor já o tenha percebido. Hoje, mais do que no passado, as águas nos invadem impiedosamente e com elas vão levando todo pela frente, sujeiras, objetos, carros, pedaços de árvores, numa fúria sem precedentes. Sua fúria, porém, não se contenta só com isso. Vai mais longe na sua devastação inconsciente e aí é que se vem se tornando a tragédia dos campos, da periferias pobres e das áreas nobres. A fúria das águas tem se mostrado um grave problema comum a todos os níveis de vida, pois até destrói palacetes e invade as principais avenidas, das cidades pequenas e das grandes urbes, dos barracos das encostas até os prédios de luxo.
A fúria derruba tudo que encontra como obstáculo: invade casas, desmorona paredes, muros, casas, inundando tudo e todos. Sua força não conhece limites, sobretudo quando vira tragédia ceifando vidas humanas sem dó nem piedade, trazendo prejuízos ao comércio, à indústria, à vida normal das cidades e da as população.
Com os meios avançados de comunicação, somos informados de que a violência das águas não se confina a um estado do país. Não, o fenômenos das enchentes violentas tomou conta de todos os continentes habitáveis. Globalizou-se, para usar essa palavra tão cara aos amigos do livre mercado. A devastação das águas aumenta substancialmente quando vem em forma de tsunamis, dessas assustadoras ondas gigantescas lembrando os tempos bíblicos de Noé e sua Arca.
O que temos visto no noticiário das diversas mídias causa calafrios, sobretudo em países asiáticos já de si assolados por frequentes terremotos em níveis máximos na escala Richter. Parte da Terra tem sido sistematicamente castigada por esses acts of God, por essas ações perversas da natureza, vitimando milhares de pessoas, destruindo povoados, cidades, ilhas, como se fossem formas de punição divina infligida aos terráqueos. A expressão inglesa atrás mencionada nem apropriada é porque deixa visível a acepção de perversidade associada ao nome do Criador. Contudo, convém assinalar, aquela associação apenas é aparentemente contraditória, porque os desastres que ocorrem no planeta Terra sempre existiram, mas em níveis não tão severos e freqüentes quanto em nossos tempos pós-modernos.Aí, então, é que cabe invocar as razões científicas de causa e efeito. As águas que despencam sem misericórdia das nuvens ou que, em forma de tsunamis, arrasam as cidades e os campos, de certa maneira podem ser explicadas pelas mudanças climáticas deflagradas pelo conhecido efeito estufa, ou seja, pelo aquecimento da temperatura do nosso planeta. E tal aquecimento não e gratuito, não vem sponte sua. Sua causa são as mãos do homem, ou melhor, das suas ações com efeitos destruidores. Portanto, sua causa é cultural e envolve outros componentes, em especial de ordem econômico-financeira. 

Vamos encontrar suas raízes na sociedade super-industrializada, exigente em sua voracidade de produtividade a todo custo, estimuladora do consumismo desenfreado com reverberações danosas atingindo todos os níveis sociais neste reino encantado do deus-consumo, do deus-luxo, do deus-individualismo, do deus-egoísmo, dos objetos e seres descartáveis, anulando quase por completo as relações humanas verdadeiras e sólidas. Mundo de países que não têm cumprido acordos internacionais de combate à poluição no planeta, que viram as costas para os perniciosos efeitos das emissões de gases, desse vilão do clima que é o CO2. O pior é que alguns desses países, entre os quais os Estados Unidos, têm reiteradamente, em particular durante a era Bush filho, se negado a assinar acordos internacionais de redução nas emissões de gases, mesmo a longo prazo.
Reuniões recentes das Nações Unidas têm sido improdutivas no sentido de chegarem a acordos com objetivos de diminuir a poluição no planeta. Alguns países são refratários à reduções mais drásticas das emissões de gases causadores do crescimento do efeito estufa.
Países que agem assim estão preparando fogo para a sua própria destruição. On ne badine pas avec la Nature, parafraseando uma antiga frase lida na minha juventude,. e principalmente com as águas provindas do derretimento das geleiras polares que, a pouco e pouco, vão aumentando o nível do volume das águas oceânicas.
Em dezembro próximo, vai haver encontro das Nações Unidas em Copenhague.Recorde-se que, após 2012, deverão vigorar novas metas de redução das emissões de gases poluidores, a serem obedecidas sobretudo, creio eu,  por parte dos países mais ricos, ocasião na qual vencerá o “primeiro período de compromisso” do Protocolo de Quioto.
Desnecessário afirmar que esses compromisso entre nações desenvolvidas e as em desenvolvimentos, como o Brasil, China e Índia, envolvem interesses cruciais (leia-se econômicos) a fim de chegarem a conclusões plausíveis. Nosso representante, embaixador Luis Alberto Figueiredo, teme até a possibilidade de alguns países desejarem acabar com aquele Protocolo, abrindo uma vazio lamentável e perigoso no enfrentamento da questão climática mundial. Isso seria um contrassenso e até mesmo uma pretensão criminosa de países que pensarem dessa forma.
O que está em jogo é o destino de nosso planeta. Os governos que jogarem contra a solução dessa questão vital para a saúde do planeta deveriam ser punidos por instâncias internacionais competentes. Até agora são muito tímidas as porcentagens, se confrontadas com as recomendações do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), de redução de gases poluidores. Dever-se-ia criar uma espécie de Corte de Justiça Internacional para defender com firmeza e isenção as condições climáticas já em níveis de alerta. Tal instância de defesa não poderia abrir mão de medidas permanentes que de fato proíbam nações infratoras de acordos internacionais sobre condições climáticas. Nações irresponsáveis põem em risco a segurança a Terra - planeta que pertence a todos nós e não apenas ditos aos países ricos.
O sinal das águas já se faz notar entre as nações. Não será por falta de avisos dos homens de boa vontade aos poderosos grupos dos ricos, mortais eles também. Fatores econômico-financeiros não devem, por conseguinte, sobrepor-se aos sinal das águas.