Bráulio Tavares
Algum tempo atrás estive pesquisando sobre as micronações, aqueles países que são oficialmente reconhecidos como nações independentes mas têm apenas alguns hectares de território e algumas centenas de habitantes. (O Vaticano é o melhor exemplo – não passa de um bairro de Roma.) Um conceito parecido com este é o de cidades (ou vilas) pequenas. Descobri que a menor vila do mundo é a brava Monowi, que fica no Estado de Nebraska, nos Estados Unidos. De acordo com a Wikipedia, ela tem apenas uma habitante, que atende pelo nome de Elsie Eiler, tem 77 anos, e dirige uma lanchonete, o único estabelecimento comercial ali existente.
No censo de 2000, Monowi tinha uma população de dois habitantes; no censo de 2010, teve uma perda de 50% e agora tem apenas um. (A explicação: o marido de Elsie morreu.) Monowi tem uma área de pouco mais de 6 km2. Foi fundada em 1900, e por volta de 1930 tinha cinco mil habitantes, que aos poucos foram indo embora, em busca de melhores oportunidades de trabalho. Em 1971, o fechamento da estrada de ferro que passava por ali decretou a morte da vila, em termos práticos. Ela ainda pode ser considerada uma localidade, creio, porque dispõe de uma escola com duas salas, uma igreja, uma biblioteca. Tudo isto vive fechado, mas eventualmente é utilizado por moradores das localidades vizinhas, quando necessário. (Como Monowi é muito pequena, as localidades em volta ficam a poucos quilômetros, não é muito diferente da maioria das localidades em nosso interior. A pessoa entra no carro e dez minutos depois chega lá.)
Todas as estatísticas sobre Monowi podem ser encontradas neste saite: http://www.city-data.com/city/Monowi-Nebraska.html. Estatísticas em situações assim são sempre divertidas (não sei se há muitas cidades norte-americanas cujo índice educacional é de 100% para “secundário completo”). Mas a existência desta cidade me lembra um fato que citei aqui há pouco tempo, o de um idioma indígena mexicano que está a ponto de desaparecer porque tem apenas dois falantes. Os linguistas têm uma série de critérios bem precisos para qualificar um idioma como vivo ou morto: número de falantes, faixa etária dos falantes (ou seja, a probabilidade de continuar a ser falado nas próximas décadas), publicações escritas, uma porção de coisas. Qual o critério para que uma localidade possa ser considerada uma vila ou coisa semelhante?
Porque isso me lembra aquela famosa imagem de Jorge Luís Borges sobre o mundo de Tlon, onde os lugares só existem enquanto alguém se lembra deles. Diz ele que às vezes, naquele mundo, as ruínas de um anfiteatro se preservam porque são frequentadas por um cavalo ou por alguns pássaros. A existência de Monowi tem um pouco dessa afirmação teimosa de vida, dessa recusa em deixar alguma coisa morrer enquanto alguém ainda está vivo. Por exemplo, enquanto houver num pé de serra uma casinha com uma velhinha escutando um forró no iPod, o forró estará vivo?