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 1 - Lúcia, vejo você como uma intelectual séria, competente e que ama o que faz, e extraordinariamente sensível. Como você mesma se vê em sua atividade de escritora

-- Miguel, obrigada pelo convite. Como te disse por e-mail, aceitei seu convite também porque gosto muito de ler entrevistas. A gente sempre aprende com a experiência do outro. E pelo amigo querido que você é aqui no Recanto.

Não me considero intelectual. Acho que sou uma pessoa mais voltada para a espiritualidade. Talvez daí eu passe uma aparência de seriedade que você falou.  Até nem gosto muito de passar essa imagem ---  sou absolutamente comum e normal. Apenas cultivo mais o lado espiritual, e isso desde que me conheço por gente. Por isso o peso da palavras, a responsabilidade das palavras. Mas eu também canto as minhas dores, os meus desesperos. A palavra é realmente um grito da alma. Sem ela, eu morreria aos poucos.

2 - Fale sobre as obras que traduziu e o que pensa desta profissão.

-- Traduzi muita coisa.  Trabalhei 21 anos traduzindo de tudo um pouco: catálogos, folhetos, cartas, manuais.... é uma bela profissão.  Agora traduzo muito pouco, apenas um ou outro texto de amigos que fazem pós, mestrado e algumas coisas esparsas por aí .... mas sempre o faço com muita alegria. Quando parar de lecionar, quero dedicar-me a tradução com mais afinco. E isso já está bem próximo. Na minha escrivaninha tem um relato de um grande tradutor que conheci, talvez um dos maiores do Brasil, o professor Paulo Rónai. Quem quiser se aprofundar na profissão, não pode deixar de ler suas obras.

3 - Como professora, sente-se realizada?

-- Não. Só senti alegria pela profissão quando lecionei em Guaraqueçaba, uma pequena cidade no litoral norte do Paraná – tinha alunos pescadores, funcionários da Prefeitura, do hotel, das pousadas, barqueiros.... foi uma alegria imensa. A troca era maravilhosa, e muitos continuaram seus estudos, segundo me disseram, porque se sentiram motivados pelo que eu lhes transmitia de amor ao conhecimento. Essa, sim, foi uma grande realização. A que guardarei eternamente no coração.  No mais, a gente tenta, mas está quase impossível mesmo. É um estress diário --- não vejo mais como um discipulado. Hoje lecionar está praticamente uma violência, pois acabou-se o respeito e os limites. A gente tenta sempre dar o melhor de si, mas não há  retorno. Não há.  As causas de tudo isso são enormes e quase todo mundo já conhece.

4 - Em seu perfil você fala no seu amor pelos animais. Explique melhor este seu lado, com o qual eu muito me identifico.

--- Sempre amei os animais. Eu sou de equipe voluntária de proteção animal  porque os amo. A crueldade para com os animais tem sido muito grande. Já disse isso em vários textos meus aqui no Recanto. Não há uma conscientização sobre o respeito aos animais. Acredito firmemente que enquanto não houver essa conscientização, não faremos um mundo melhor. Eu trabalho em conjunto com outros protetores de todo o Brasil no Facebook pedindo ajuda, resgate, adoções, medicamentos, veterinários....também tenho um grupo meu no Face, de conseguir socorro aos abandonados na cidade onde vivo. – por aqui faço o que posso. Infelizmente não podemos resgatar todos, é uma luta diária. Se deixo comida na beira da estrada para algum animal que vi lá (e que não posso recolher, pois estou lotada como tantos outros protetores),  bom, se deixo comida lá, no dia seguinte já não tem um abandonado lá, tem mais  dois..... as pessoas não tem mesmo consciência. Os protetores lutam contra um oceano de crueldades imensas – e a falta de apoio das autoridades. Eu poderia falar horas sobre isso, mas acho que talvez um dia isso mude. Acredito que Deus tudo vê.  E que cada um, um dia, receberá na medida em que deu.

Quem planta crueldade, com certeza é ela que um dia receberá em troca.

5 - Quais os temas que você gosta de desenvolver na poesia?

--- Não há nenhum específico, Miguel. Sai do coração, no momento. Nada planejado, nunca.  Às vezes tento escrever sobre um tema, mas desisto. Eu escrevo sempre sob uma determinada emoção. Sem emoção, não tenho poesia. Não adianta.

6 - Na sua opinião, a literatura tem uma missão redentora?

- Não. Acho que ajuda a expandir a consciência, para se ter maior discernimento. É um farol, um archote. Mas não é redentora para mim. Redentora é a ação. Só falar nada resolve. É preciso sempre agir. Posso fazer textos belíssimos e ser um péssimo ser humano.  Temos vários exemplos assim na literatura universal.

7 - O que você gostaria que melhorasse no mundo?

-- Sem dúvida, o acreditar que o outro é teu irmão na Criação – homens, animais, vergetais.  Assim não haveria guerras, desavenças, mazelas.... Ninguem é melhor do que ninguém, como dizia Exupéry, apenas diferente. Faz parte da Divindade a diversidade. Ainda bem.

8 - Qual a sua posição em relação à religião?

--- Cresci em colégio católico rigoroso, fui espírita, hoje estudo o esoterismo. Hoje não, digo, há quase 30 anos. Nele me encontrei. Cada um tem o seu caminho. Respeito todos.  Creio que  Deus não nos perguntará qual a nossa religião quando chegarmos do lado de lá. Perguntará sobre o bem que praticamos enquanto vivemos.

 

9 - Que gêneros e autores você prefere e quais os livros que poderia mencionar entre os seus favoritos?

 

--- Sem dúvida, Saint-Exupéry é o que mais li e o que mais gosto. Depois tem vários poetas como Lorca, Neruda, Cecília, Mario Quintana, Octávio Paz,  Emily Dickinson, Plath,  Rilke, Gabriela Mistral. --- e no romance  gosto de Marguerite Duras,  García Marquez, Lya Luft.  Algumas obras que  eu poderia citar aqui e que sempre releio são : Cartas a um Jovem Poeta, de Rilke (essencial para quem escreve),  Terra dos Homens de Exupéry e o romance que considero uma obra-prima: Cem Anos de Solidão, de García Marquez. Também gosto muito,  muito,  de ler biografias   --  sempre que posso, compro ou empresto de alguém para ler. -- Poderia citar as biografias de Franco Zefirelli, Coco Chanel, Sarah Bernardt,  Winnie Mandela, entre outros. Acho que sempre, sempre aprendemos muito com a experiência de outras vidas. Talvez este até seja o meu gênero preferido depois da poesia.

 

 

10 - Deixo-a à vontade para as suas despedidas e sua mensagem aos leitores. Obrigado por conceder a entrevista e Deus a abençoe.

 

-- Eu é quem agradeço, Miguel. Quero ainda ler muitas outras entrevistas aqui na sua página.  Partilhamos o mesmo amor pela palavra e pelos animais.  E isso, as idéias e ideais unem ainda mais os seres e os tornam mais fortes para enfrentar os tempos atuais, que são de grande insensibilidade e insensatez. Oxalá o mundo melhore em  2015, consigamos todos expandir nossa consciência para o bem, sempre – não há outro caminho. A  você, a todos, um iluminado 2015.

 

(imagem: a autora com a cadela Branquinha)