Entre Prosa e Verso entrevista Cacau Novaes
Por Décio Torres Cruz Em: 20/08/2024, às 13H14
Entre Prosa e Verso entrevista Cacau Novaes
Décio Torres Cruz*
Cacau Novaes é o nome artístico do escritor José Carlos Assunção Novaes que acaba de lançar o livro Eu só queria ver o pôr do sol. (Mondrongo, 2024). Sua estreia na literatura se deu em 2002 com a novela Marádida, publicada pelo Selo Letras da Bahia (depois republicada pela Editora Buriti em 2017, e pela Mondrongo em 2022). A partir daí, Novaes vem publicando uma série de livros em diversos gêneros, com destaque para a poesia. Além de escritor, ele também é um produtor cultural que desde 2018 coordena o Nosso Sarau, um concorrido evento literomusical que acontece mensalmente no Instituto Goethe de Salvador onde músicos e poetas se apresentam livremente e onde um escritor é homenageado e entrevistado. Num desses encontros, tive a oportunidade de entrevistar o premiado escritor durante o lançamento de seu livro Eu só queria ver o pôr do sol e agora compartilho esta entrevista com vocês.
1. Cacau, vamos começar falando deste evento que você criou. Quando e como surgiu a ideia do Nosso Sarau e qual foi seu objetivo inicial?
O Nosso Sarau iniciou suas atividades em março de 2018, ainda com o nome de Sarau no Goethe, mas, antes disso, já havia uma ideia inicial de se encontrar um espaço para que poetas, contistas, romancistas, escritores de um modo geral, pudessem apresentar os seus textos, lançar e vender livros, serem apresentados ao público, acompanhados de apresentações musicais e outras manifestações artísticas. Enfim, que trouxesse a literatura e outras artes para um espaço que pudesse receber o público e permitir um intercâmbio e interação entre os presentes. Ao realizar um lançamento de um livro meu na biblioteca (hoje, KreativLab) do Goethe-Institut Salvador, houve, por parte de Ute Engelke, diretora daquele espaço, um convite para produzir um evento parecido, daí surgindo a ideia do sarau, o que permitiria esses encontros em um local de grande referência no cenário cultural soteropolitano.
2. Publicado em 2002, seu livro Marádida inicia pelo final (que, na verdade, não é o final) e contém narrativas paralelas, com trechos em itálico de uma história sendo escrita. O livro mescla crítica social com elementos de ficção científica de temas apocalípticos. De onde você retirou o título e o que o personagem escritor contém do autor Cacau Novaes?
O título traz uma palavra inventada por mim e se refere a um lugar fictício, que está no livro do escritor-personagem, cujos trechos aparecem em itálico. É um lugar idealizado, onde o entardecer se parece com o ouro derretendo-se no céu, uma busca pelo mundo perfeito, mas também uma distopia. Acho que a palavra Marádida tem relação com o mar mesmo, mas me surgiu durante o processo de escrita do livro. Mesmo que o escritor-personagem não seja o meu alter ego, traz algumas coincidências em relação à minha pessoa, mas são apenas coincidências, já que também sou escritor, mas é uma ficção. Acontece que, ao criar um personagem, acabam entrando características nossas, ainda que não tenhamos essa intenção.
3. Seu novo livro Eu só queria ver o pôr do sol apresenta uma temática diversificada. Do mesmo modo que no capítulo “Escombros” de Marádida, há uma predominância do tema do Apocalipse que atravessa vários poemas, como podemos perceber em alguns títulos: “Escombros” (que repete o título), “Cinzas”, “Terremotos”, “Vendavais”, “Bombardeios”, “Destroços da cidade”, “Muralhas”, “Cogumelos”, “Destruição”, “Mutações”, “Apocalipse”, “Explosões”, “Desertos”, “Raros animais”, “Desintegração”, “Campo de guerra”, “Os últimos minutos”, “Deserto de cactos”, “Fim do mundo”, “Os últimos minutos” etc. Na apresentação do livro, o jornalista Flávio Sarlo, relaciona o seu livro a The Wasteland, a Terra Devastada de T. S. Eliot, que falava da devastação provocada pela primeira Guerra Mundial na Europa. De onde surgiu esta sua preocupação com o tema da guerra, devastação e apocalipse que lembra um vaticínio de nosso futuro? Da pandemia? Dos noticiários das guerras atuais? De uma análise de nossa realidade?
Na verdade, Eu só queria ver o pôr do sol fala de um mundo que não queremos, mas que infelizmente está aí e nos remete a essa devastação que acontece e que leva a humanidade a esse fim, devido às mazelas do ser humano, às guerras, à destruição da natureza, à ganância, a desigualdade social etc. Então, é um mundo que está, cada vez mais, rodeado de concreto, que nos impede de ver o sol, que se põe entre prédios. Não gostaria de ver esse mundo, mas apreciar a beleza do pôr do sol e de tudo que nos rodeia. Infelizmente, não é isso que vemos, mas um mundo em decadência, em constante destruição, além da degradação da humanidade.
4. Além deste tema, surge um outro dele decorrente, o da ficção científica, como o apresentado nos poemas “Descobertas”, “OVNI”, “OVNI II”, “KXWY”, “Códigos”, “Luzes estranhas” etc. O que o levou a eleger esta temática? Uma descrença numa solução aqui na Terra e uma esperança de que algo venha de fora para nos redimir de um futuro trágico?
O que me levou a abordar esse tema foi acreditar que não estamos sós no universo. Não somos os únicos. Haverá uma intervenção no planeta, caso a situação chegue ao extremo, ou mesmo o que já está acontecendo, que é a busca por outros lugares no universo que possam ser habitáveis, em que haja possibilidade de vida. Também na época que esses textos foram escritos, eu estava muito ligado em questões relacionadas à ufologia e outras coisas do tipo. Então, uma coisa se juntou à outra.
5. Fale um pouco sobre seus livros anteriores de poesia: Os poetas estão vivos (2015); As Sandálias (2016); e Você não sabe do que é capaz (2017). De que modo eles diferem do atual?
Todos tratam de temas diferentes. Os poetas estão vivos é uma ode à poesia, uma exaltação aos poetas. Traz, em sua maioria, poemas já publicados em antologias e, premiados em festivais e concursos de poesia. Já As Sandálias traz o meu lado mais espiritual e a busca por um poder superior. Reflete um momento de minha vida, digamos assim. Em Você não sabe do que é capaz, encontramos textos lírico-amorosos e eróticos, fala do amor e da paixão, do sentimento e do contato corpo a corpo.
6. Vamos aos seus novos projetos. O que temos no momento?
Um novo livro, lançado também este ano, que é Fonte de Beber Água, um trabalho que remete às minhas origens e vivências no interior da Bahia, mais precisamente na cidade de Iguaí, onde nasci, e de quando morei por lá. Traz imagens bucólicas, típicas das pequenas cidades e do meio rural. São reminiscências recheadas de lirismo e muita poesia.
7. E, para finalizar, comente sobre algo que ache importante destacar e que não tenha sido contemplado nas perguntas anteriores.
Quero destacar também a minha pesquisa acadêmica, que está no livro O sujeito nulo no português popular da Bahia, que aborda uma das diferenças entre o português brasileiro e o português de Portugal, e traz uma abordagem sobre a formação do português do Brasil e sobre o português popular brasileiro.
Sobre o autor
Além de poeta, ensaista e ficcionista, Cacau Novaes é doutor em Língua e Cultura, mestre em Letras, especialista em Língua Portuguesa e Produção de Textos, licenciado em Letras Vernáculas e possui MBA em Jornalismo Empresarial e Assessoria de Imprensa. É membro correspondente da Academia de Letras de Goiás (ALG), da Academia de Artes Ciências e Letras de Vitória (ACLAV) e do Núcleo Acadêmico de Letras e Artes de Portugal (NALAP). Produtor e curador do “Nosso Sarau”, evento que acontece no KreativLab do Instituto Goethe de Salvador (ICBA). Publicou os livros de poesia: Os poetas estão vivos (Mondrongo, 2015); As Sandálias (Mondrongo, 2016); Você não sabe do que é capaz (Penalux, 2017). Neste ano, lançou os livros Eu só queria ver o pôr do sol (Mondrongo, 2024) e Fonte de Beber Água (Cogito, 2024). Em 2021, publicou o livro de ensaios resultante de sua pesquisa na área de linguística O sujeito nulo no português popular da Bahia (Paco Editorial, 2021) e também o livro infantil Xande e o Sapo Romualdo (Penalux, 2021). Recebeu premiações em vários concursos de poesia e participou de diversas antologias e eventos culturais e literários, com publicações em revistas no Brasil, Argentina, Colômbia, Chile e Portugal.
Quem se interessar em conhecer melhor o seu trabalho e desejar adquirir seus livros pode acompanhar as suas publicações no Instagram @cacau_novaes e no Facebook (https://www.facebook.com/cacaunovaes) e entrar em contato direto com o autor ou através dos sites das editoras aqui mencionadas.
* Escritor, membro da Academia de Letras da Bahia e da Academia Contemporânea de Letras (SP). Autor, dentre outros, de A poesia da matemática (2024), Histórias roubadas (2022), e Paisagens interiores (2021).