As soluções do artista
Por Bráulio Tavares Em: 02/03/2006, às 21H00
O grande artista (na política, no futebol, na arte, etc.) é o que encontra soluções satisfatórias com rapidez, e soluções brilhantes com freqüência. No futebol, não basta a um atacante marcar gols em grande número. A história do futebol está cheia de artilheiros que fizeram muitos gols mas hoje ninguém se lembra deles. Por que? Porque faziam gols comuns, não faziam gols decisivos, gols excepcionais que ficam para sempre na memória da torcida. Do mesmo modo, o atacante que fizer um gol-de-placa mas depois disso não “comparecer” com relativa freqüência, acaba caindo no esquecimento. Também não basta manter uma média aceitável: é preciso alcançar “picos de eficiência” de vez em quando.
Soluções satisfatórias, obtidas com presteza, nos ajudam a navegar nas turbulências do dia-a-dia, mas se só fossem elas a gente não iria muito longe. Para isto precisamos encontrar de vez em quando uma solução particularmente brilhante que nos projete a um patamar muito mais alto, a partir do qual passaremos a “tocar o barco” com novas soluções medianas, satisfatórias, à espera do próximo salto. Nas Ciências Sociais é a diferença que existe entre uma economia de subsistência, onde o grupo produz apenas o necessário para o próprio consumo, e a economia de mercado, onde se produz um excedente que, acumulado, gera uma riqueza capaz de ser aplicada em bem-estar, implementos técnicos, etc.
Penso sempre nisto quando comparo, por exemplo, a profissão do compositor com a do cineasta. E constato que ser cineasta é mil vezes mais difícil. Um compositor (e na MPB o compositor-intérprete, caso muito freqüente) faz algumas dezenas de músicas por ano. Dessas dezenas ele dá algumas para outras pessoas gravarem, e grava ele mesmo uma dúzia. É claro que ele não precisa (e nem poderia) gravar uma dúzia de obras-primas todo ano. Mas basta que dessas músicas haja umas três ou quatro realmente boas. São estas que irão fazer seu nome e sua fama. E que as demais não comprometam, tenham aquele piso-mínimo de qualidade que ajude a mantê-lo à tona, sem afundar na mediocridade.
Um cineasta, contudo, não faz doze filmes por ano. Ele não faz nem sequer um. Com muita sorte, um cineasta brasileiro dirige um filme de dois em dois anos, de três em três. E nesse caso ele fica numa situação de não poder errar. Fazer um filme medíocre, um filme frustrado, um filme problemático que não seja aceito nem pelo público nem pela crítica, é quase inviabilizar a possibilidade de fazer o próximo. E mesmo que o filme seja simplesmente um filme mediano, satisfatório, ele sabe que na próxima chance vai precisar de um grande sucesso, que puxe todo o resto de sua obra (e de suas ambições profissionais) para um patamar superior. Nessa arte de “matar um leão por dia” toda briga é briga de cachorro-grande. No cinema, não se tem a chance de ir acumulando pontos em jogos com times pequenos, porque toda vez que se pisa em campo é decisão de Campeonato.
Publicado Originalmente no Jornal da Paraíba