Elmar Carvalho

 
Ontem, a médica Cristiane Napoleão, responsável pela administração da quimioterapia a que me submeti sete anos atrás, disse que eu já posso me considerar curado do tipo de câncer de que fui operado no dia 17 de fevereiro de 2004, pelo cirurgião e oncologista Gil Carlos. Este já me havia dito, algumas semanas antes, que já me posso considerar curado, uma vez que praticamente não há registro de recidiva desse tipo de neoplasia, após sete anos da cirurgia. Em Deus eu já me considerava liberto desse mal.
 
Creio que no começo de fevereiro de 2004, o cardiologista Francisco José Lima, hoje coronel da Polícia, irmão maçom, descobriu que eu estava acometido de forte anemia, e que, certamente, estava perdendo sangue. Recomendou-me que procurasse meu gastroenterologista para investigar o caso. Procurei o irmão maçom e conterrâneo Valdeci Ribeiro, que detectou o problema, e retirou material para fosse feita a biópsia. Esta descobriu que eu tinha lesões cancerígenas no cólon do intestino grosso. O doutor Valdeci foi direto em dizer-me, na presença de Fátima, minha mulher, de minha irmã Maria José, e de meu cunhado Zé Henrique, que não havia tratamento, e que a única solução era a cirurgia. Era um dia de sexta-feira. Pediu a seu colega Gil Carlos Modesto que desse um jeito de me receber nesse mesmo dia, o que aconteceu. Repetiu-me este médico que a cirurgia era inevitável. Deus me deu forças para não fraquejar nessa adversidade. Assim, diante do inelutável, pedi-lhe, então, que me operasse o mais rápido possível. Ele mandou que eu fizesse determinado exame no sábado, e me internasse no hospital São Marcos, na segunda-feira, que ele faria a cirurgia na terça. Assim aconteceu, e assim foi feita a colectomia parcial.
 
Nesses momentos difíceis, a pessoa percebe a importância dos familiares mais próximos e dos amigos mais chegados, o consolo das palavras fraternas e o poder das orações. Minha mulher concentrou quase todo o seu esforço e energia na recuperação de minha saúde, quase abdicando de si mesma. Quando meu pai me viu passar na maca, ainda sob o efeito da anestesia, derramou profusas lágrimas, quase desesperado, desamparado, no corredor do hospital. Meu pai, durante os seis meses em que fiz o tratamento quimioterápico, rezava fervorosamente durante longos minutos ou mesmo horas. Não preciso dizer que minha mãe também fazia o mesmo, embora de forma mais contida, como é do seu feitio. Minha irmã Maria José ficou muito abalada quando recebeu a notícia da lesão, no consultório médico. Soube que o seu marido, o saudoso Zé Henrique, aparentemente durão, mas de alma boníssima, também verteu lágrimas, quando foi contar o caso a um amigo comum.
 
Como reconhecimento e em sinal de minha profunda gratidão, quero citar alguns amigos, entre vários outros, que se excederam em bondade, nessa hora tão difícil. O saudoso deputado Humberto Reis da Silveira, meu amigo, na legítima e pura acepção da palavra, me visitava todo dia, tanto no hospital como em minha casa. Às vezes, para não me cansar, sequer falava comigo, mas perguntava à minha mulher, pessoalmente, e não por telefone, como é que eu estava. O Reginaldo Ferreira da Costa veio passar várias semanas conosco, para ajudar a minha mulher a cuidar de mim, tanto na administração de medicamentos e compressas, como na vigília durante os dez dias em que fiquei internado. Essa demora se deveu ao fato de que rejeitei a comida hospitalar, e o médico disse que só me daria alta quando eu passasse a aceitar a alimentação.
 
Passei o carnaval de 2004 no hospital, em companhia do Reginaldo, grande admirador da beleza feminina, sobretudo das morenas e das mulatas. Ficava ele a assistir aos desfiles carnavalescos pela televisão, embevecido com os requebros e rebundolâncias faceiras das morenas em flor. Quando, já em minha casa, ele me colocava a compressa, eu via e sentia que ele fechava os olhos e silenciosamente orava. Não quero, nesta oportunidade, usar adjetivos, para qualificar os favores desses amigos; não há dinheiro que os pague e nem palavras que lhes dê a exata dimensão espiritual e sentimental. Vários outros amigos me visitaram e me deram a sua solidariedade. Entre eles, cito a professora Clea Rezende Neves de Melo, que já se preparava para vir me visitar, vinda de Brasília, pois correra o boato de eu fora desenganado pelos médicos. Aliás, chegou mesmo a circular o boato de que eu havia morrido, pois nessa época faleceu o juiz Vilela, daí ocorrendo a confusão. Ó, quão bom é ter bons amigos... Meus amigos, Deus lhes pague!