Quase parafraseando Manuel Bandeira (1886-1968), o grande lírico brasileiro que se tornou modernista, diria que estou farto do academicismo conformado, que vai olhar nas obras alheias (nacionais ou estrangeiras) a base teórica para elucidar o que seja brasileiro, o que é direita, esquerda, liberal, neoliberal, fascista (que serve tanto para a direita quanto para a esquerda caviar-capitalista disfarçada).
Estou farto das teorizações inócuas, “em cima do muro,” que escreve para uns happy few supostos detentores soberbos do conhecimento global, novos espadachins às avessas defendendo uma causa ou outra, em sentidos sempre de emulação enviesada, dando ao leitor a impressão de que está afirmando a favor quando o que exprimir é o contrário, o chamado muito pelo contrário, ou imprecisão conclusiva.
Impera a anfibolgia, o duplo sentido, o decifratório, o enigma, a esfinge, o tabuleiro de xadrez, o labirinto do Minotauro sem a esperança de um Teseu que viesse derrotá-lo, livrando sua pátria, Atenas, do temível antropófago Minotauro, monstro metade homem, metade touro. Após ter derrotado os atenienses, o rei Minos, rei da ilha de Creta, os condenou a entregar-lhe anualmente sete jovens, moços e moças. Teseu, ajudado contraditoriamente por Ariadna, filha de Minos e apaixonada por ele,dela recebeu um novelo de fio com qaue conseguiu atravessar o labirinto que o levaria a encontrar o Minotauro. Teseu o matou, , libertando a sua pátria desse castigo.
Ante o quadro tétrico da política nacional, quem não há de se indignar por todos os meios de comunicação que, felizmente, ainda temos como fórum de debates, de comentários, de pontos de vista, de troca de ideias. O Facebook não é esse bicho-papão que andam apontando como uma arena sem sentido. Antes, é um canal no qual se pode dizer o mínimo sobre o que nos indigna como cidadãos diante dos erros cometidos pelo atual governo federal.
Reconheço os defeitos, o besteirol que ainda pulula no Face e noutras redes sociais. Contudo, ele está longe de ser uma forma “imbecil” de comunicação entre seus usuários como, a meu ver, erroneamente pensava o notável pensador e semiólogo recém-falecido, Umberto Eco. O Face tem muitas serventias. Pode até ser um brainwash, mas, neste caso, o usuário consciente e bem informado culturalmente pode se prevenir de ser contaminado pela lado ruim dessa rede social ou de outras.Um usuário do Face também lê jornais, bons livros, alarga assim, seu “horizonte de expectativa,” o seu repertório cultural. O nível cultural do usuário vai do mais simples ao mais intelectualizado. Não pode haver com isso nenhum preconceito contra as redes sociais. Nisso, da mesma forma, nelas vejo uma prática saudável e democrática, sem cerceamentos às liberdades de expressão e à multiplicidade de posições ideológicas.
Louvo o caráter democrático que o Face imprimiu ao universo virtual, dando chance a vozes mais modestas do tecido social e fazendo suas observações acerca dos problemas brasileiros, anda que na condição, na maioria da vezes, de leigo. Há temas e questões cruciais e polêmicas e modos de ver o mundo que só essas rede social e outras têm permitido serem levadas a cabo e em tempos real.
Todas essas especulações e ângulos que estou tentando trazer à baila têm como fulcro de meu interesse e de minha atenção os desatinos da vida brasileira no cenário político-institucional. Diviso, didaticamente, pelo menos três questões que me têm provocado indignação, as quais não são desconhecidas do público em geral: 1) a permanência de uma presidência da República esgotada e desmoralizada;2) os desacertos da nossa economia; 3) a impunidade diante da violência catastrófica e crônica. E por violência entendo todos os seus tipos e todos os seu correlatos.Quer dizer, esse quadro de desordens e de instabilidade crescente envolvendo as três questões mencionadas.
Comentemos, sem muitas minúcias, cada uma. O fato de termos uma presidente que perdeu a credibilidade e o voto de confiança de parte substancial do eleitorado é fator determinante de uma saída por renúncia ao cargo ou por razões legais. Os escândalos que cercam o seu governo com as investigações em série da Lava Jato já dispõem de suficientes evidências de conluio entre o seu governo e a propinas recebidas por empresários à custa do dinheiro público (Petrobrás, por exemplo).
A soma de notícias de desídias apontando a cumplicidade do governo federal colhidas pela Polícia Federal e veiculadas pelos meios de comunicação, dia após dia, criou um constrangimento no governo difícil de sustentar a continuidade de um mandato presidencial. As notícias recentes recrudescem ainda mais a posição incômoda da presidente Dilma, sobretudo as ligadas ao marqueteiro João Santana que cuidou da publicidade da campanha da presidente.
Um bilhete escrito à mão pela esposa daquele marqueteiro revela o bas-fond em que se transformou a relação entre um marqueteiro e sua forma duvidosa de recebimento de dinheiro proveniente de fontes públicas e com pagamento em depósito no exterior em dólar ou euro. Tudo negociado ao arrepio da Lei. Isso é gravíssimo e só piora a situação já deteriorada do cargo presidencial.
A segunda questão, de natureza mais técnica, se refere à política econômica do governo, a qual, igualmente, anda com pernas trôpegas, em virtude do desaquecimento da economia, da recessão, do alarmante contingente de desempregados e do alto custo de vida que estamos enfrentando no país. Ora, aumentam-se os preços e se arrocham os salários. O mais pobre é o mais sacrificado. A classe média vai encolhendo suas possibilidades de consumo e os funcionários públicos têm seus salários reduzidos, encolhidos, pelo arrocho que lhes é imposto em decorrência do desgoverno, da roubalheira dessa era petista.
Diante dessas deformidades de governança, não há como não se indignar, protestar e desejar por mudanças radicais, como a saída, por meios legais, da atual ocupante do cargo mais alto da Nação. A indignação não é um defeito da alma humana, antes é uma virtude dos que não são subservientes, pusilânimes, acovardados, passivos, “politicamente correto” - detestável forma de aceitar tudo como se fora natural e compactuar com a permissividade perniciosa co-partícipe das iniquidades humanas, do imoralismo, do homem sem alma, sem parâmetros, sem frios, fatores degenerescentes de uma sociedade cada vez mais hedonista e insolidária.
A derradeira questão mencionada, a da impunidade se imbrica em todas as precedentes afloradas. A impunidade é fator decisivo do alto nível de violência por que o nosso país está passando para vergonha das nações mais bem organizadas socialmente. Mata-se hoje no país por qualquer coisa. A morte campeia no trânsito tresloucado, nas ruas infestadas por delinquentes juvenis que são apenas “apreendidos” e não presos por seus crimes abomináveis ceifando pessoas jovens e promissoras, crianças, adultos, idosos, nacionais, estrangeiros, fazendo do Brasil um país mal visto no mundo, um país assediado pela bandidagem à solta, assaltos, sequestros relâmpagos, “saidinhas” de bancos, balas perdidas afetando mais as crianças pobres nas favelas das metrópoles Rio de Janeiro e São Paulo e em outras capitais e até no interior do país. Somados a esses males sociais se encontram as drogas, os traficantes, a compra de armas pesadas que vai fortalecer o poder de fogo da bandidagem em larga escala para a qual a polícia é um inimigo enfraquecido.
Qual foi ou tem sido a punição exemplar para esses facínoras? Quase nula. A polícia prende e a Justiça liberta. A lei penal brasileira só vale no papel. O Código Penal é brando. As brechas da lei facilitam outros crimes dentro da própria legislação criminal (prisão domiciliar, comutação da pena, condicional, “bom comportamento,” (posto que fingindo) e outras aberrações prisionais que só beneficiam os criminosos e os estimulam a perpetrar novos crimes, permanência renitente da não redução da maioridade penal, fonte reprodutora dos crimes hediondos no país sem punição adequada à crueldade do delito. As mães, os pais , a família brasileira de todas os níveis sociais e culturais não param de chorar pelos seus filhos mortos por bandidos cruéis, mesmo que suas vítimas não esbocem nenhuma reação. Matam por “maldade,” segundo já se disse. Matam porque estão drogados ou não. Matam por matar – terrível realidade de nossos tempos contemporâneos e apocalípticos!
Violência de todas as formas – acentuamos – a violência de homens contra mulheres ou vice-versa, de novos contra idosos, de pais contra filhos ou vice-versa, a violência policial ( por que não?), a violência doméstica, estupros ocorridos no seio da família. A lista de tipos de violências é quase interminável e, para arrolar mais uma que eu chamaria de violência política, muito nefasta e arraigada em nosso país e raiz de muitos tipos de violência porquanto se reflete na vida da população, na saúde, na educação, na segurança, no lazer, na vida social, na vida cultural.
Diante desse conjunto de desarmonia social não tenho eu, leitor, o dever ético de me indignar e de me aliar a outras vozes que, pelo país afora, clamam por uma vida mais digna, mais fraterna, mais humana? Indignar-se é um apanágio dos que não se curvam à prepotência e às atrocidades do mundo em que vivemos.