Um hobby na vida de adulto
Por Cunha e Silva Filho Em: 15/01/2016, às 15H54
[Cunha e Silva Filho]
Mais de um vez já falei que tenho um hobby. Não o de cuidar de um cãozinho ou um gatinho travessos, nem de cuidar de jardim, de plantas, embora admire quem faça isso, nem de colecionar gibis da minha infância ou adolescência, nem de colecionar discos de vinil, nem nada disso.
O meu hobby tem outro objetivo, talvez até menos valioso do ponto de vista humano do que outros passatempos. O meu hobby é de outra natureza, o de recuperar livros meus da adolescência, já que da infância praticamente está tudo apagado da minha memória, o que corrobora a atualidade, em grande parte, dessa saudável e ainda oportuna obra, Idade, sexo e tempo (1938), do pensador católico Alceu Amoroso Lima( 1893-1983) o Tristão de Athayde, pseudônimo desse gigante da crítica do Modernismo brasileiro, escritor de uma obra imensa e inestimável em vários campos da inteligência: história literária, crítica literária, economia, sociologia, direito, psicologia, filosofia, religião, política, teoria literária. Diz Tristão de Athayde reportando-se à infância: [...] “A infância é a idade sem memória, em que as impressões são tanto mais violentas quanto mais efêmeras” (op, cit., p. 52-53).
Daí que dos livros meus da infância bem tenra, diria dos cinco aos oito anos, aproximadamente, já não consigo lembrar seus títulos. Daí também, por razões de aproximação da fase de vida seguinte, a adolescência, o motivo de tentar recuperá-los no presente.
Sou um pouco avesso aos exageros estatísticos. Por isso mesmo, não sei ao todo quantos livros foram, até agora, recuperados. Uma parte significativa consegui encontrar no sebo virtual, o melhor meio agora de conseguir alguns desses milagres graças à Internet, em edições diferentes ou até mais antigas. O importante foi que vieram compor o acervo da minha biblioteca –hobby, que fica à parte dos livros mais novos ou novíssimos.
Tem um desse livro ainda não encontrados que perdi numa confusão que houve num ônibus que tomei em frente do Palácio do Itamaraty.. Houve uma briga entre passageiros e, com receio que sobrasse alguma coisa para mim, desci do veículo com uma sacola de livros que virou no chão. Apanhei rapidamente alguns. Coloquei-os de volta na sacola. Dois ou três possivelmente, não vi. Era noite. Ao chegar em casa no Flamengo, onde morei por pouco tempo, verifiquei que um deles era um livrinho de título Expressões idiomáticas da língua inglesa, da Melhoramentos. Livrinho útil, de um excelente autor didático de inglês e francês, o Neif Antonio Alem. Há anos venho tentando achá-lo nos sebos do Rio e nos sebos virtuais. Debalde o encontrei até hoje. Quem souber de algum exemplar dele que me queira vender ou doar, aqui estou disposto a recebê-lo de braços abertos.
Outros livros estou procurando encontrar: a segundas e a terceira séries da La gammaire par la langue, de J. de Matos Ibiapina, autor didático famoso, entre outros, nos anos 1920, 1930 e 1940, para os estudos do francês e do inglês. Estou procurando três livros, um de francês para o antigo ginásio de um autor ou autora franceses; outro de um autor inglês para o curso colegial (científico, clássico) que oferece mais dificuldade de encontrar porque não sei me recordo do título e do autor ou autores.Só se por acaso vir o título,poderia identificá-lo; outro também de um autor francês para o curso colegial (científico ou clássico), nas mesmas condições de dificuldades do título e do autor ou autores.
Sei que o grosso que procurava já consegui graças à Internet. Contudo, não me dou por satisfeito. Quero localizar outros ou completar volumes
Agora, me lembro de um livro didático de inglês, que ainda tenho comigo do tempo da Rua Arlindo Nogueira, em Teresina. É um velho exemplar que me foi presenteado por um quitandeiro, moço bom e amigo que o tinha nos seus guardados. Não sei se ele tinha sido aluno de escola marista ou se o exemplar lhe fora dado por algum amigo. A sua quitanda era perto de minha casa, do lado da Rua São Pedro.
É uma obra da excelente antiga coleção de inglês da F.T.D. Já,em décadas passadas, livros dessa coleção continham a chave de exercícios propostos, mas só para uso dos mestres. Caso caíssem nas mãos de um estudante sério e aplicado, muito ajudariam um estudante independente como eu. Por muito tempo, o uso de livros com a chave dos exercícios era criticado por alguns professores e educadores. Felizmente, esse não é o pensamento atual da pedagogia.
Agora os livros com chaves das soluções dos exercícios voltaram a fazer parte do volume, conforme vemos em editoras de livros para o ensino de línguas, como a Disal e outras. Além desse instrumento pedagógico, obras dessa natureza são também acompanhadas do inestimável auxílio de CDs, reproduzindo, com a voz de falantes nativos, os diálogos ou textos desses livros.Até gramáticas e dicionários vêm acompanhadas de CDs. É uma revolução notável na expansão do ensino de línguas pelo mundo.
A Torre de Babel está, aos poucos, perdendo sua condição de sinônimo de confusão entre pessoas falando diferentes línguas. O meu velho exemplar daquele livro da F.T.D está com páginas faltando. É, pois, um livro mutilado. Vou envidar esforços a fim de encontrá-lo. É questão de tempo e de paciência.
Outras obras que estou no encalço de recuperar, delas algumas são de referência. São grandes dicionários de latim, francês e inglês. Que pena que as deixei em Teresina! Penso que foram extraviadas por negligência de minha família, conforme relato em detalhes na obra de memórias, que lançarei brevemente, Apenas Memórias. Não foi por culpa minha: eram de meu pai e eu não podia trazer para o Rio visto que eram volumosas, pesadas, mas o valor, imenso, é de dar inveja aos bookworms e bibliófílos. Obras de Valdez, por exemplo, em edições portuguesas.
Outras obras, enfim, que trouxe já estão tão velhas que urge tentar encontrá-las em edição mais recente ou mesmo antiga, não importa, contanto que estejam inteiraças. Sou persistente no que faço. Um dia, direi a mim mesmo: encontrei.tudo o que queria, O hobby cumpriu sua missão. Agora, é cuidar com amor de pai para que elas não se extraviem, não envelheçam tanto e não saiam da minha vida. Me lembro, agora, de um enunciado de Camilo Castelo Branco 1825-1890) que há pouco postei na página do Facebook: Só me vou utilizar de apenas uma frase do enunciado, a primeira, daquele notável romancista português: “Um livro aberto é um cérebro que fala.”