UM GRANDE ROMANCE

     Li, quase de um fôlego só, a narrativa Teodoro Bicanca, de Renato Castelo Branco. Comecei sua leitura numa clínica, enquanto esperava meu neto ser atendido por uma fonoaudióloga. Continuei-a em minha biblioteca, à tarde, e a concluí à noitinha.

     Gostei muito. Trata-se de um grande romance, retrato da terrível exploração do homem pelo homem, da frustração de sonhos que não se realizam. Na verdade, de sonhos bem pequenos como saldar dívidas injustas e cultivar um pequeno pedaço de terra. Ou ainda o singelo sonho do personagem que pretende voltar para o torrão natal para trabalhar em sua pequena fazenda da qual foi expulso pela seca. Ou ainda o sonho bem modesto de se criar um sindicato para melhorar a vida de trabalhadores braçais como vareiros e estivadores, o qual passa a ser visto pela classe média como uma ameaça social e por isso é exterminado. Nisso, está inserida a crítica à velha mania brasileira de achar que toda ação voltada para melhorar a vida dos mais pobres é coisa de comunista. É ridículo.

     Constitui-se também como uma narrativa em que se destaca o enorme preconceito da classe média da cidade de Parnaíba (um dos ambientes do romance) contra um rapaz, que é também da classe média, porque ele é amigo de pessoas pobres e procura ajudá-las.

     A ação do romance é situada nos anos 30 e 40 do século XX, época de grande polarização ideológica entre capitalismo e socialismo. É o período histórico em que a esquerda acreditava que o comunismo poderia acabar com a exploração do homem pelo homem, com a pobreza, igualando as pessoas economicamente. É o velho sonho socialista que nunca se realizou nem se realizará.

     É um texto de forte crítica social. Pode ser comparado a Vidas Secas e a romances de Jorge Amado, pois, ao lado desse aspecto de desigualdade humana, configura também o meio folclórico e místico em que as personagens atuam, com destaque para Siá Ana, uma grande figura humana.