Um conto sufi
Por Flávio Bittencourt Em: 22/04/2010, às 16H52
"(...) Se você pensa compreender a Arte, você não a compreende. Mas se você pensa não compreender, você pode praticá-la sem entraves (...).
(http://www.sufiorder.toronto.on.ca/sufilogo.htm)
(http://soufisound.homestead.com/)
"O sufismo (árabe: تصوف, tasawwuf; persa:صوفیگری Sufi gari) é a corrente mística e contemplativa do Islão. Os praticantes do sufismo, conhecidos como sufis ou sufistas, procuram uma relação directa com Deus através de cânticos, música e danças.
O termo sufismo é utilizado para descrever um vasto grupo de correntes e práticas. As ordens sufis (Tariqas) podem estar associadas ao islão sunita, islão xiita ou uma combinação de várias correntes. O pensamento sufi nasceu no Médio Oriente no século VIII, mas encontra-se hoje por todo o mundo. Na Indonésia, actualmente a nação com maior número de muçulmanos, o islão foi introduzido através das ordens sufis. (...)"
(http://pensandoprafrente.blogspot.com/2008/12/sufismo.html)
ILUSTRAÇÃO DE NARRATIVA SUFI
Reverenciando o sufismo e os sufistas
23.4.2010 - Religião é sabedoria - Nesta Coluna "Recontando estórias do domínio público" aprecia-se a diversidade cultural, étnica, artística, religiosa, sempre torcendo pela mestiçagem, pelas interpenetrações e até... (com todo o respeito), pelas contaminações mútuas entre escolas filosóficas e crenças (milenares, algumas), SEM PERDA DE UNICIDADE ESSENCIAL DE PENSAMENTO, isso por respeito aos adeptos de cada uma delas. O conto sufi a seguir transcrito aqui é considerado como manifestação soberba, que ultrapassa o "meramente literário", se é que a instância literária é menor, como, aliás, NÃO parece ser.
Sobre a passagem "(...) Se você pensa compreender a Arte, você não a compreende. Mas se você pensa não compreender, você pode praticá-la sem entraves (...)", descendo-se ao pobre mundo inessencial e pragmático do consumo, do comércio e das leis (legislação comum, jurídica) ocidentais vale lembrar uma recomendação do Prof. Dr. José Carlos Tinoco Soares, em seu magistral TRATADO DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL. Afirma Tinoco Soares, aproximadamente - em outras palavras, já que faço aqui um exercício de síntese empobrecedora, simplesmente didática, cuja responsabilidade absolutamente não é de J. C. Tinoco Soares -, que O JUIZ QUE IRÁ JULGAR PROBLEMA DE MARCAS DE FABRICANTES COPIANDO PADRÕES DE DESENHO DE OUTRAS MARCAS, FAMOSAS, deve proceder da seguinte maneira, para ser justo. O juiz deve-se colocar, de acordo com o referido estudioso, no lugar DA DONA DE CASA, DA OPERÁRIA DO LAR, DA PESSOA QUE ENTRA CASUALMENTE POR EXEMPLO EM UM SUPERMERCADO - e não de um técnico especializado na matéria. Só com o OLHAR INGÊNUO será possível comparar um desenho com outro, para se tentar descobrir NÃO SE HÁ MUITA SEMELHANÇA GRÁFICA, mas se UM COMPRADOR CASUAL PODERIA SE ENGANAR, olhando rapidamente a marca possivelmente "plagiante": a meta é que o Estado Nacional impeça um fabricante de enganar o consumidor: NÃO SE DEVE PERMITIR QUE UM COMPRADOR COMUM "compre gato por lebre". Quem compra tem o direito de saber o que está comprando (ele possivelmente suou para adquirir o valor correspondente à compra).
Parafraseando o impressionante pensamento sufi reproduzido, é o caso de se dizer: É PRECISO NÃO SE CONCENTRAR EM COMPARAÇÕES DE PADRÕES DE DESIGN, mas descobrir, EM ESTADO DE GRANDE PUREZA, se numa olhada rápida e um tanto dispersa a certo rótulo industrial, haveria a confusão: "(...) Se você pensa compreender a Arte, você não a compreende. Mas se você pensa não compreender, você pode praticá-la sem entraves (...)". TALVEZ POR ISSO, passando-se do pensamento sufi ao direito criminal ocidental, EXISTAM OS TRIBUNAIS DO JÚRI: é absolutamente necessário que UMA PESSOA COMUM julgue, ao lado do magistrado, que é o especialista do Direito. NÃO SOU JURISTA, MAS IMAGINO QUE ISSO DEVA ACONTECER PARA QUE O FUNDAMENTO PRIMEIRO DA LEI, o sentimento da Justiça (o clamor por ela) prevaleça. CONCLUSÃO: Justiça é sentimento. Em outras palavras: a apreensão possivelmente "exata" da Justiça é INEXATA. E que me perdoem os adeptos do sufismo por utilizar um trecho de um maravilhoso conto sufi - passagem textual de infinita sabedoria - para falar de OUTRA COISA, definitivamente menor. Explica-se: o trecho é surpreendente e NÃO SERVIRÁ UNICAMENTE À RELIGIÃO, mas À VIDA (admitindo-se que A RELIGIÃO, a propósito, EXISTE PARA SERVIR À VIDA, também). E eu, que sei muito pouco ou nada sobre o sufismo, já estudei algo sobre design de marcas registradas e logotipos de indústria, comércio e serviços. F. A. L. Bittencourt ([email protected])
"A ARTE QUE NINGUÉM POSSUI
Era uma vez, em tempos muito antigos, em um grande império, um jovem vivo e inteligente que por sua aptidão em aprender e sua dedicação impressionava a todos.
Ele vivia não distante de uma cidade com sua mãe, que era viúva.
Um dia, ela lhe disse:
- Anwar, meu filho, é preciso que penses seriamente a te estabelecer na vida. É verdade que ajudas os fazendeiros como todos os jovens da tua idade e, quando não há nada para fazer, ficas em casa trançando cestos. Você faria melhor em se casar ou de sair para buscar fortuna pelo mundo. Em todo caso é assim que vejo as coisas.
- Mãe - disse o rapaz - é exatamente isto que eu quero fazer! Eu poderia ficar aqui com você e me engajar numa fazenda, ou então sair em busca de aventura do outro lado do mundo. Ao invés disso, eu decidi de não me afastar muito de nossa casa e, ao mesmo tempo, tornar-me alguém importante: eu me casarei com a filha do imperador e viverei feliz para sempre!
- As pessoas de nossa posição não tem por hábito alimentar tais idéias - disse a velha senhora. - São raros, em nosso meio modesto e trabalhador, aqueles que viram o imperador, e ainda mais raros os que viram sua filha! Quem é você, eu te pergunto, para fazer um pedido tão extravagante ao nosso soberano?
- Eu, mãe, não sou nada para ousar fazer isto mas você é diferente! Eu quero que tu vás ver o imperador e que você peça que a princesa seja sua nora!
Imaginem os sentimentos da pobre velha. É certo que Anwar era a “menina de seus olhos” , mas de qualquer modo, ter tais ambições era ir longe demais em ousadia e insolência.
- É insensato! - disse ela; e ela lhe deu tantas tarefas que, por um tempo, esse projeto saiu de sua cabeça.
Mas alguma coisa logo o fez relembrar da princesa e ele instiga sua mãe tanto e tão bem que ela cede, faz uma trouxa com algumas coisas indispensáveis e se põe a caminho para a capital do império.
Cada dia, a pobre mulher rodeava os limites do palácio. Ela observava as manobras dos luzentes guardas a cavalo, as idas e vindas dos embaixadores de países distantes, e, atrás das grandes muralhas, imaginava a sala do trono onde se sentava o imperador. As ruas estavam muito animadas, como são sempre as ruas das capitais; em todos os lugares haviam cortejos e desfiles de personagens importantes, todas manifestações contribuindo à edificação do povo.
Mas como fazer para ser admitida à presença do monarca?
Ela fez várias tentativas antes de se dizer: “Se o imperador não quer que eu vá até ele, devo esperar que ele venha a mim!”
E assim ela se colocou dia e noite ao exterior da grande mesquita onde, montando um cavalo branco, o imperador vinha rezar às sextas-feiras. Ali era grande o aglomerado de pessoas, mas ela acabou sendo notada porque ela se sentava sempre no mesmo lugar: esse lugar ela havia escolhido porque era onde o monarca fazia meia volta com seu cavalo para retornar ao palácio.
Uma sexta-feira, quando estava tranqüilamente sentada em seu lugar habitual, o imperador, colocando os pés no estribo, olhou em sua direção: ela rapidamente se levanta, as mãos em sinal de súplica.
- Conduzam essa mulher ao palácio! - ordena o imperador logo que viu seu gesto.
Alguns minutos mais tarde ela se encontrava sentada ao seu lado na sala do trono.
- Tu és pobre, ao que me parece - diz sua majestade. Se você espera de mim algum favor, fale!
Mas a mulher estava tão estupefata de se encontrar naquele lugar, em presença do ilustre personagem, que logo que abriu a boca para falar, nenhum som emitiu.
Vendo isto, o imperador mandou dar-lhe um saco de ouro e que a conduzissem à porta, dizendo aos que o rodeavam: - Dinheiro nunca é demais para essas pessoas.
Quando ela chega a sua casa, seu filho a enche de perguntas:
- Você viu o imperador?
- Claro, Anwar, que o vi!
- Pediu para falar-lhe?
- Sim.
- E que disse ele sobre a minha intenção de me casar com sua filha, a princesa Salma?
- Você está louco? Acredita que vestida de trapos como estava e ignorando tudo sobre as boas maneiras da corte, eu teria podido pedir uma coisa igual? A magnificência do lugar me paralisou e me tornou muda. Mas em sua grande bondade, Sua Majestade Imperial nos deu este saco cheio de ouro. Com isto, você poderá te estabelecer por sua própria conta, teu futuro está assegurado, você tem o bastante para o resto de teus dias. Esqueça então, te suplico, todas estas absurdas histórias de princesas!
- Mãe, o ouro não me interessa, é a princesa que eu quero - responde Anwar.
E ele recomeça a instigá-la tanto e tão bem que a contragosto ela se foi novamente para a capital.
Lá, uma vez mais, o imperador a vê, agachada em seu canto. Ele a faz vir ao palácio, pergunta de novo o que ela queria, novamente o medo a impede de falar e mais uma vez ele a faz voltar com um saco de ouro.
Assim que voltou à sua humilde cabana, ela troca com seu filho as mesmas idéias. O imperador era sem dúvida nenhuma generoso, mas Anwar não se contentou.
Ele diz à sua mãe:
- Tomei uma decisão: eu não vou ficar em casa. A existência confortável que este ouro me assegura, eu não aceito. Decidi ir em busca da filha do imperador; partirei amanhã pela manhã, e farei tudo para conseguir sua mão.
No dia seguinte, ao sol nascente, Anwar deixa a casa e toma um caminho através do bosque. No alto de uma colina, ele vê numa curva do caminho um sábio sentado de cócoras, com um chapéu pontudo sobre a cabeça, vestido com uma roupa feita de retalhos de pequenos quadrados cortados em pedaços e cuidadosamente costurados.
- Que a paz esteja convosco, Sua Presença o Dervixe - disse Anwar polidamente.
- Que buscas, pequeno irmão? - perguntou o dervixe.
- Eu busco um meio de chegar ao imperador para pedir-lhe a mão de sua filha, porque quero de qualquer maneira casar-me com ela.
- É difícil - diz o sábio. - A menos que você esteja pronto a primeiro aprender “A arte que ninguém possui”.
- Como isto é possível, se é uma “Arte que ninguém possui”?
- Ninguém a possui: se faz. - disse o dervixe. - E os homens não podem fazê-la se não tiverem alguma coisa, certas outras coisas. Quando eles têm essa coisas, a arte opera sozinha; por isso eles não têm, realmente, necessidade de possuí-la.
- Tudo isto é extremamente complicado- diz Anwar. - Mas você poderia me dizer como eu devo fazer?
- Claro. Você segue sempre reto, sem se deixar desviar por nada, seguindo fielmente o caminho sem pensar que possa haver outra coisa mais importante que o caminho que você está seguindo.
Anwar agradece o dervixe e retoma a caminhada. O caminho se mostrava sem fim diante de seus passos. Ele se alimentava como podia de frutos, de raízes e de bagos selvagens, e daquilo que lhe davam ocasionalmente. As vezes certas pessoas lhe propunham trabalho ou tentavam interessá-lo à profissão que tinham ou à sua atividade ou mesmo ofereciam-lhe suas filhas em casamento. Mas Anwar continuava avançando, ainda que com o passar do tempo tivesse mais e mais a impressão de que este caminho não o conduzisse a nenhum lugar.
Um dia finalmente, à hora do crepúsculo, ele percebe que havia chegado ao fim do caminho: ao invés de levá-lo às muralhas de uma importante fortaleza, o caminho o levava diretamente a um alto portão aberto sobre um muro fortificado.
Anwar ultrapassa a entrada.
O porteiro o interroga:
- Que estás procurando?
- A princesa. Decidi esposá-la.
- Você não pode passar se não tiveres uma finalidade mais razoável! - grita o guardião ameaçando-o com sua afiada espada.
- Bem! - disse Anwar - vou aprender “A arte que ninguém possui”.
- Ah, é diferente! - disse o guardião baixando sua arma. Mas - continua ele amigavelmente - alguém deve ter te falado disto porque habitualmente as pessoas imaginam que podem se aproximar da princesa diretamente.
Anwar entra e se encontra dentro dos muros de um imenso castelo. Ele repara dentro de um pequeno quarto uma pessoa em contemplação silenciosa. Ele se aproxima e reconhece o dervixe que ele havia encontrado na estrada há muitas luas!
- Como você finalmente chegou até aqui sem prestar atenção às tentações que apareceram pelo caminho, você vai poder se submeter à segunda prova. - disse o dervixe.
Ele introduziu Anwar em uma sala de meditação comprida e baixa onde, em fila, dervixes silenciosos descansavam, com a cabeça nos joelhos.
Anwar se sentou. Os dervixes começaram então seus exercícios, e ele se sente como que incitado a imitá-los. Quando terminaram, ele é levado ao Mestre Jardineiro que o colocou em seguida ao trabalho: ele teve que cavar e afofar a terra, molhar e limpar, se ocupar das plantas e abrir caminhos até que suas mãos ficassem tão doloridas quanto suas costas estavam curvadas. Ele trabalha assim por meses e meses.
Em seguida ele é conduzido à sala onde se encontrava o Mestre do Monastério, e cada dia ele tinha que ficar lá várias horas enquanto o grande homem o olhava sem nada dizer. E isto dura ainda mais tempo que seu primeiro trabalho.
Depois disto, Anwar foi colocado na cozinha onde trabalha como se fosse um escravo, preparando a comida de centenas de dervixes que viviam no monastério, dos visitantes e de todos aqueles que vinham participar às numerosas festas que organizava a confraria.
Anwar tinha a impressão de estar sendo útil tanto quanto tinha o sentimento de estar perdendo seu tempo, porque ele não parava de pensar na princesa e à “Arte que ninguém possui”.
Mas o pior ainda estava por vir! Chegou o momento onde ele não teve mais nada a fazer: não o convidavam para os exercícios, ele não tinha trabalho para fazer na cozinha, não precisavam dele no jardim. Nesse monastério viviam muitos outros jovens de sua idade que iam e vinham, e que tinham, a maioria, um ar de felicidade; de suas conversas com eles, ele não aprendeu muita coisa sobre a natureza da comunidade e o sentido de suas atividades, se é que elas tinham um sentido.
Muitos anos se passaram dessa maneira. Um dia finalmente Anwar foi convocado à presença do Mestre do Monastério. Assim que entrou na hujra, a peça onde se desenvolviam os encontros com o Mestre, ele viu que o velho homem ia cair dentro de um poço que vinha de se abrir no centro do piso. Anwar o deteve e o salva.
- Meu filho - disse o sábio dando-lhe uma chave - tome esta chave e guarde-a como se tua vida disto dependesse.
Anwar continua a trabalhar no monastério. Um dia, o chefe dos jardineiros manda chamá-lo. Ao chegar no jardim, ele vê uma árvore vacilar: ela ia cair sobre o sábio. Anwar corre e salva a vida do sábio.
- Meu filho - disse o mestre jardineiro - tome esta pedra de cristal e guarde-o como se tua vida disto dependesse.
Ele volta a seu trabalho. Muito tempo depois deste acontecimento, Anwar foi chamado pelo chefe da cozinha. Quando ele se apresenta diante do chefe, o jovem vê que o cozinheiro ia retirar uma concha fervente de uma panela que estava no fogo. Com rapidez, ele toma a concha e se queima o polegar.
- Meu filho - disse o chefe da cozinha - você terá de agora em diante uma calosidade na base do polegar. Guarde-a como se tua vida disto dependesse.
Anwar viveu ainda numerosos meses dentro do monastério. Então um dia ele foi convocado na sala de reuniões onde os dervixes se reuniam para o jantar. No final da mesa estava sentado um príncipe altaneiro, o semblante confiante, vestido magnificamente. Todos, em silêncio, o escutaram contar uma história longa e complicada. Como vindo dentro dele mesmo, Anwar escutou a voz do príncipe lhe dizendo:
- Lembre-se dessa história e guarde-a como se tua vida disto dependesse.
Após se passarem muitos dias, Anwar recebeu a ordem de ir ao jardim ao local mesmo onde ele havia visto o dervixe no dia de sua chegada. Ele o encontra na mesma posição, sentado em contemplação. O dervixe levanta a cabeça:
- Anwar, você agora você está pronto para prosseguir sua busca. Você vai conseguir porque eu te dei “A arte que ninguém possui”.
- Eu não compreendo o que é.
- Se você pensa compreender a Arte, você não a compreende. Mas se você pensa não compreender, você pode praticá-la sem entraves.
- Continuo sem entender - disse Anwar.
- Se você tivesse nos deixado nunca teria aprendido. E se agora te faço sair, você aprenderá. Se você tentar voltar, não aprenderá. Se você tiver necessidade de ajuda, eu aparecerei.
- Por que isto? - perguntou Anwar um pouco desnorteado.
- Porque, fora algumas coisas que você tem, eu sou uma parte desta “Arte que ninguém possui”: ela não pode ficar em você, então ela deve ser guardada em mim!
Anwar se dirigiu ao portão da fortaleza. Assim que passa perto do guardião da entrada, ele o olha e reconhece o dervixe que acabara de lhe falar. Do lado de fora, ao pé da muralha, estavam o chefe dos jardins, o chefe da cozinha e o chefe do monastério como também todos aqueles com quem ele havia convivido após ter passado a entrada do monastério. Todos tinham, sem exceção o semblante do dervixe que ele havia encontrado pela primeira vez na beira do caminho, um pouco antes do topo da colina, depois de ter deixado a casa de sua mãe.
“Eu nunca vou compreender”, se disse Anwar. Apesar disso ele segue seu caminho.
Quando ele retorna o rosto, viu que o monastério não estava mais lá. Até a estrada que se abria diante dele tinha mudado.... Em lugar de levá-lo para casa, ela ia numa direção totalmente diferente. Anwar avança apesar de tudo.
Após dias e dias de caminhada, ele entra numa imensa cidade iluminada. Ele pergunta onde estava.
- Você está na Capital do Império - respondeu um transeunte. Anwar pergunta então quantos anos se haviam passado depois do ano em que ele tinha partido. O homem o olha com espanto e desconfiança: “...Ora...um ano apenas” disse o homem. E portanto por seus cálculos, Anwar tinha certeza de ter passado no monastério mais de trinta anos.
E foi assim que ele se deu conta que o tempo não era o mesmo em todos os lugares.
No centro da cidade, Anwar passa perto de um poço profundo de onde se ouvia gritos. Uma corda descia até o fundo. Ele começa a puxar, enquanto uma multidão se juntava a sua volta. Ele puxa e puxa com todas suas forças, e estava quase a ponto de largar a corda, mas graças ao calo na base do polegar, ele pode suportar a terrível fricção.
Por fim, um homem surge do poço. Ele agradece a Anwar, depois diz:
- Deve ser você o Homem-Vindo-de-longe sobre o qual estava previsto que seria o único que poderia me salvar. Sou o Primeiro Ministro de Sua Majestade Imperial, e fui aprisionado neste poço por um djin.... Você será recompensado!
E tendo dito isto, saiu dali.
Anwar ainda estava sob o efeito da surpresa quando uma estranha e terrível criatura salta sobre ele.
- Ha, ha! filho do homem - grita a criatura - tu és minha presa e vou te comer vivo, como eu como todos aqueles que tenho vontade de devorar nesta cidade. Nós, djins, somos os mestres das ruas da capital e ninguém pode nos opor resistência a menos que possua o cristal de Salomão, filho de David, que acorrenta todos os djins da terra!
Ao escutar isto, Anwar com um gesto rápido pega em seu bolso o cristal e o coloca em frente ao djin que no mesmo instante explode em chamas e desaparece na distância.
Anwar tinha ainda o cristal em suas mãos, quando viu um cavaleiro a galope vindo em sua direção:
- Sou mensageiro do Imperador! Estava previsto que aquele que libertasse o ministro seria capaz de dominar os djins. Este homem deve ter recebido a chave do quarto encantado onde a princesa vive prisioneira. Aquele que conseguir abrir a porta do quarto, será o esposo da princesa e governará o reino quando Sua Majestade Imperial se for.
Anwar sobe na garupa do cavalo, e rapidamente eles parte para o palácio. O mensageiro o conduz até a entrada de um quarto. Awar introduziu a chave na fechadura, o porta se abriu e ele vê a mulher mais bela que os olhos de um homem jamais contemplaram. Era a princesa, é claro. Ela caminha para ele. No mesmo instante em que seus olhares se encontraram, eles se apaixonaram um pelo outro.
E foi assim que Anwar o pobre, esse jovem que vivia num casebre no fundo da província, casou-se com a princesa Salma e, quando chegou o momento, torna-se imperador. Anwar e Salma ainda governam o império.
A história que o príncipe orgulhoso havia contado na mesa do monastério continha, como eles perceberam, todos os elementos necessários à instauração de um reino de justiça, de paz e de prosperidade. Cada vez que eles mesmos ou o país ou seu filhos se encontravam em face a alguma dificuldade, Anwar e Salma constatavam que eles eram capazes de utilizar suas experiências, de se servir de objetos mágicos que os havia sido dado e de colocar em prática os conselhos do misterioso dervixe, que nunca deixou de aparecer quando eles tinham necessidade dele".
(http://www.sertaodoperi.com.br/poesiasufi/estorias/ninguem_possui.htm,
portal cujos responsáveis assinalam que:
"Várias das estórias e histórias apresentadas são extraídas da
versão francesa de 'O Buscador da Verdade', e 'Sabedoria dos Idiotas' de Idries Shah ")
The Sufi Temple at Katwijk, Holland
(http://www.sufimovementincanada.ca/news.html)